Acredito que em nenhum ritual maçônico eu tenha lido que um silêncio é
imposto na Loja além das pausas entre as cerimônias ou depois da leitura de
pranchas, e a menos que um certo tipo de silêncio seja imposto ao Aprendiz Maçônico,
exceto, é claro, a entrada e a permanência no Gabinete de Reflexão que é o
momento do paradigma do silêncio como escola.
A verdade é que não sei onde está esta teoria do silêncio em Loja, e menos
ainda a questão do silêncio que diz respeito aos Aprendizes maçons, deixando-os
mudos, embora fiquei muito surpreso que esta modalidade venha das modas
esotéricas que povoaram transversalmente a Maçonaria, que frequentemente devem
trabalhar a acesse transcendente através da mística do silêncio, e um dos seus
bons propagadores foi o Irmão do GOdF, Oswald Wirth.
É claro que quando se chega a um lugar deve, pois, mostrar-se retraído e
observar mais do que falar, embora às vezes aconteça o contrário, como acontece
na Loja e noutras ordens de vida, e, portanto, se pede observância. mas de lá
até colocar a mordaça de silêncio em Loja é outra questão para à qual
eu já dediquei considerações noutro artigo.
Tanto é que, proveniente tanto do âmbito religioso quanto do esotérico, do
tipo Guenon ou da Nova Era, O. Wirth etc., foi instalada na Maçonaria uma certa
mística do silêncio, e há toda uma campanha para promover os seus benefícios e
ensinamentos, e milhares de aporemas filosóficos místicos que estão longe de
serem considerados como parte do corpus maçônico, por mais que os maçons e a
estrutura insistam na sua disseminação.
Embora eu não desista ou argumente sobre a veracidade da busca ou a sua
realidade transcendente baseada no silêncio, embora eu deva indicar que a Maçonaria
não é mística monástica que se construía com base no silêncio, nem interno
nem externo, as Lojas não estão localizadas nos desertos carmelitas, nem
os maçons são os habitantes dos eremitérios, nem os Aprendizes são irmãos
menores, aprendizes da mística do silêncio como veículo de meditação
transcendental.
As Lojas nasceram nos ambientes urbanos e tabernários, e beberam dos
ambientes das pedreiras, e se alguém conhece medianamente do mundo da cantaria,
ou as irmandades de artesanato de um tipo ou outro: canteiros, carpinteiros,
serradores, pedreiros, etc., sabe muito bem que estes ambientes não são muito
propensos à mística do silêncio, porque a comunhão nasce da palavra que
transmite conhecimento, e naquelas antigas corporações que tanto admiramos,
viviam os alegres e cantadores confrades da corporação e os monges que tinham
outra língua, outras sinergias e outras místicas, cada um tinha o seu tempo, o
seu espaço e ocupação.
Embora haja uma certa tendência para misturar tudo e fazer dos pedreiros
uma espécie de monges seculares, esquecendo-nos de que nós, maçons, somos um
produto tangencial daquelas guildas corporativas, que através do cadinho das
Luzes somos qualificados como filhos da luz, da razão, do debate e da reflexão
aberta e exposta.
Por isso entendo muito pouco o silêncio em Loja e menos transformado numa
mordaça no estilo de uma mística beatífica do tipo Paulo Coelho, digamos que
sou mais a favor da simbiose relacional e da aprendizagem do tipo William de
Baskervile e Adso de Melk (O Nome da Rosa).
De qualquer forma, parece que esquecemos que as Lojas modernas, se os
irmãos fundadores tivessem desejado, teriam sido fundadas nos espaços
religiosos protegidos e cobertos, e no modo e maneira daqueles “outros” que tão
apegados estavam à arte da cantaria … até mesmo alguma ou outra igreja teria de
bom grado acolhido este trabalho de reflexão e a escola do silêncio.
Mas as Lojas nasceram em ambientes festivos, celebrados ao mínimo com
banquetes e brindes e cantos fraternos, concelebrados por maçons que falavam
pelos cotovelos, e isto tem sido assim há muitas décadas …
Em todo caso, se se quisesse que os Aprendizes guardassem silêncio na Loja
além de exigir-lhes prudência e observância, teria sido exposto sem mais, como
foi feito com outros tópicos ou questões de organização da Loja, que a mudez
fosse o seu estado natural.
Deve-se notar que o silêncio na Loja é algo tardio, e não parece que
leiamos muito frequentemente os rituais antigos porque nos esquecemos de que
eles são compostos na sua maior parte de uma questão que é óbvia, e devem ser
lembrado uma vez por ano; eu me refiro aos catecismos maçónicos.
Não há um único ritual maçônico que se aprecie, que não incorpore no seu
corpus argumental e teratológico o mui conveniente catecismo
maçónico, ou seja, um diálogo ativo entre o Mestre, ou Venerável Mestre e
o Aprendiz, onde uma pergunta e o outro responde ativamente, numa troca de
reflexões que demonstra uma grande interação lógica entre os membros de uma
oficina, não importando o grau que tenham.
Por trás destes catecismos e de toda a nossa fundação há um trabalho de
reflexão, uma arte da memória e o layout da intervenção e da palavra no estilo
de “palavra do Maçom” que não deveríamos esquecer, uma coisa é citar a palavra
e outra é silenciar os “outros” para transformá-los numa espécie de
observadores místicos adoradores do silêncio como uma introspecção em Loja,
que, como eu digo, tem os seus momentos, mas não pode ser uma escola como se
vê, se expõe e se proclama e menos ainda numa Maçonaria livre.
É o que tinha a dizer.
Victor Guerra, M∴ M∴
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