Pode-se dizer que a Maçonaria
nasceu na Igreja Católica. Como construtores que eram, os maçons
passavam longo tempo a construir catedrais e mosteiros. Estes pedreiros, homens
simples, ignorantes e rudes, recebiam principalmente dos dominicanos, com quem
viviam em estreito relacionamento, instrução e evangelização. Além de ler e
escrever aprendiam dar graças à caridade e aos princípios morais do
cristianismo. Podemos crer que, em alguns ritos, a prece na abertura dos
trabalhos e o tronco da viúva, seja resultado desta convivência.
Vejamos, então, como começaram os
conflitos
A Maçonaria como instituição
associativa deu os seus primeiros passos em 1356, quando um grupo de pedreiros
se dirigiu ao prefeito de Londres, e solicitou o registo da Associação de
Pedreiros Livres. Oficialmente registrada e devidamente autorizada, os seus
membros passaram a ter certos direitos e vantagens, tais como: Trânsito Livre,
naquela época não se tinha a liberdade de viajar; Liberdade de reunião, naquele
tempo era proibida, devido ao receio de conspirações e tramas contra os poderes
constituídos; e a Isenção de impostos que obviamente agrada a qualquer um.
Pouco tempo depois, em 1455,
Jonhann Gutemberg inventa a impressora com símbolos móveis, e é publicada a
primeira Bíblia em latim. Assim, o evangelho passa a chegar mais facilmente a
todas as camadas da população.
Quem lê, pensa mais e sabe mais.
A história começava a mudar.
Em 1509 subiu ao trono da
Inglaterra o rei Henrique VIII que, logo em seguida, se casa com Catarina de
Aragão. Porém, mais tarde, apaixonado por Ana Bolena, contraria-se ao não obter
do Papa o divórcio para casar-se com a sua amante. Após insistentes tentativas,
revolta-se e simplesmente não reconhece a autoridade do Papa, fundando uma nova
religião, a Anglicana. Constitui-se como único protetor e chefe supremo da
Igreja e do clero de Inglaterra, acaba com o celibato dos padres e confisca os
bens da Igreja.
Henrique VIII é excomungado, mas
não se preocupa minimamente
Com a morte de Henrique VIII em
1547, o trono foi ocupado por vários reis e rainhas até à chegada, em 1558, de
Elizabete I que, como Rainha da Inglaterra, solidifica a Igreja Anglicana, como
está, até aos dias de hoje. Durante o seu governo, a Inglaterra torna-se uma
potência mundial e, embora não fosse um súbdito católico, por tudo que ela fez
contra o catolicismo em geral, o Papa Pio V excomungou-a em 25 de fevereiro de
1570.
Até aqui, a Maçonaria continuava
operativa. Não incomodava e nem era incomodada
Em 1600, um facto aparentemente
sem importância iria mudar os rumos da Maçonaria. É aceito o primeiro Maçom
especulativo, de que se tem notícia Lord Jonh Boswel, um agricultor (plantava
batatas). Foi o primeiro a ver vantagens em pertencer à Associação dos
Pedreiros Livres. Em 1646 é aceito outro especulativo, Elias Ashmole. A
importância deste fato é que Ashmole era um intelectual, alquimista e
rosa-cruz. Alguns autores atribuem-lhe a confecção dos Rituais do 1°, 2° e
3°grau, graças aos seus conhecimentos de Rosa-cruz.
As lojas proliferavam. Eram
mistas ou só de especulativos
Em 24 de Junho de 1717 é fundada
a Grande Loja de Londres e a partir daí a Maçonaria começou a expandir-se e a
ser exportada para países vizinhos: Holanda em 1731; França e Florença em 1732;
Milão e Genebra em 1736 e Alemanha em 1737.
Esta estranha sociedade secreta,
que guarda segredo absoluto de tudo o que faz, constituída de nobres e
aristocratas, começou a inquietar os poderes dominantes de cada país. O medo
das tramas e subversões para derrubar o poder foi mais forte, e começaram as
proibições.
Sem saber o que acontecia nas
reuniões, sempre secretas, criou-se um alvoroço, e muitos governantes pediam
providências ou soluções ao Papa. As alegações eram de que a sociedade admitia
pessoas de todas as religiões; que era exigido aos seus membros segredo
absoluto, sob severas penas, e que prestava obediência a um poder central de
Londres. O que fazer?
Com o Papa Clemente XII doente,
constantemente acamado, totalmente cego há 6 anos, rodeado de pessoas que lhe
filtravam as informações e ainda sob a pressão dos governantes que exigiam
providências e, também, dos inquisidores que exerciam a sua influência, o Papa
assinou em 28 de abril de 1738 a Bula In Eminenti, selando assim o destino
dos maçons católicos em especial, e da maçonaria em geral.
Esta Bula excomungava todos os
maçons e afirmava que era bom exterminar estas reuniões clandestinas, pois,
poderiam atuar contra o governo. Bem, com a divulgação e publicação da Bula nos
países católicos, foram-se desencadeando as proibições. Em França, o parlamento
não a aprovou e por isso não foi promulgada. Sendo assim, em França,
oficialmente, a Bula não entrou em vigor. Nos Estados Pontifícios (Itália
desunificada), cuja constituição administrativa era católica, todo o delito
eclesiástico era castigado como delito político, e vice-versa. Infringir a
religião era infringir a lei.
Deu-se então uma verdadeira
caçada à maçonaria e aos seus membros. A inquisição, encarregada de executar as
ordens papais torturou, matou e queimou inúmeros maçons e, logicamente, pessoas
inocentes que eram confundidas com maçons. Em 1800 foi eleito Pio VII, e
durante o seu papado, surge Napoleão Bonaparte.
Entre outros feitos, provocou a
fuga da coroa portuguesa para o Brasil em 1808 e conquistou Roma, proclamando o
fim do poder temporal do Papa mantendo-o preso no castelo de Fontainebleau. Pio
VII só recuperou parte das suas possessões, com a queda de Napoleão em 1815.
Nesta época, porém, o mundo já não era mais o mesmo.
Os ideais de libertação afloravam
e iniciaram-se diversos movimentos pelo mundo, praticamente todos liderados por
maçons, que conseguem a independência dos seus países. Estados Unidos, 1783;
França, 1789; Chile, 1812; Colômbia, 1821; Peru, Argentina e Brasil, 1822.
A maçonaria deixou então de ser
simplesmente inconveniente e passou a ter mais ação, concreta e objetiva, e com
isto recebia condenações mais veementes da Igreja. Neste momento façamos uma
pequena paragem. A maçonaria até aqui tinha sido sempre condenada e perseguida
por terceiros motivos. Até este momento a Igreja Católica nunca tinha sido
atingida diretamente pela influência maçônica.
O facto que realmente condenou a
maçonaria pela Igreja Católica aconteceu no processo da reunificação da Itália.
O trauma desse episódio não é esquecido até hoje por alguns sectores da Igreja.
A Itália, nesta época, era uma
“Manta de Retalhos”, constituída por vários estados entre os quais os Estados
Pontifícios, que correspondiam a aproximadamente 13,6% do total da Itália, ou
seja, eram 41.000 km², que pertenciam ao clero e localizavam-se na região
central. A população dos Estados Pontifícios não tinha acesso a nenhum cargo
público, que era explorado pelo clero. Todos os funcionários públicos usavam o
hábito. O inconformismo e os movimentos de libertação começam em 1767, sendo os
jesuítas expulsos de Nápoles.
Em 1797 é fundada a Carbonária,
seita de caráter político independente da maçonaria, que tinha como objetivo
principal a Unificação da Itália. Pio VII em 1821, lança a Bula Ecclesiam
a Jesus Cristo condenando a atividade dos carbonários. A Carbonária
tornou-se perigosa e prejudicial à maçonaria, pois era confundida com esta. Os
Carbonários tinham os seus aprendizes, mestres, grão-mestres, oradores,
secretários, sinais, toques, palavras, juramentos e é claro, segredos.
Os principais líderes
Carbonários: Cavour, Mazzini e Garibaldi eram maçons, por isso, a Carbonária
era muito confundida com a maçonaria, porém, diferenciavam-se pela origem,
finalidade e atividades. Os carbonários matavam se fosse preciso. Nos Estados
Pontifícios explodiram grandes desordens. A insatisfação contra o clero, que
não permitiam que os leigos ocupassem cargos administrativos, era grande.
Em 1848 o Papa Pio IX é obrigado
a refugiar-se em Nápoles, devido à revolução, e lança após alguns meses a
encíclica Quibus Quantisque, responsabilizando a Maçonaria pela usurpação
dos Estados Pontifícios. Em 1849 é proclamada por uma Assembleia a República em
Roma. Nesse momento, Pio IX lançou cerca de 230 condenações contra a maçonaria.
Ele e o seu sucessor, Leão XIII, lançaram cerca de 600 documentos de
condenações. Em 14 de Maio de 1861, Vítor Manoel é proclamado Rei da Itália
Unificada.
Como se vê, a Maçonaria estava
condenada. Motivo? A Unificação da Itália… Ideal Carbonário
Em 27 de Maio de 1917 é
promulgado por Bento XV, o primeiro Código de Direito Canônico, também chamado
de Pio Beneditino onde se refere a Maçonaria da seguinte forma, no seu Cânon
2335:
“Os que dão o seu próprio nome à
seita maçônica ou a outras associações do mesmo gênero, que maquinam contra a
Igreja ou contra os legítimos poderes civis, incorrem Ipso Facto, na excomunhão
simplificter reservada à Sé Apostólica”.
E mais, recomendava noutros
Cânones o seguinte: Que as católicas não se casassem com maçons; que seriam
privados de sepultura eclesiástica; privados da missa de exéquias; não seriam
admitidos em associações de fiéis; não poderiam ser padrinhos de casamento; não
fariam a confirmação do batismo (crisma); não teriam direito ao patronato, etc.
Os Sacramentos proibidos são: Batismo,
Eucaristia, Crisma, Penitência (confissão), Matrimônio, Ordenação Sacerdotal e
a Unção dos Enfermos. Para atender os anseios dos irmãos católicos, a Maçonaria
criou o Ritual de adoção de Loutons, de apadrinhamento, Ritual de Pompas
Fúnebres e o Ritual de confirmação de casamento. Em 11 de Fevereiro de 1929 foi
criado o Estado do Vaticano pela assinatura do Tratado de Latrão, onde o poder
Papal ficava restrito ao Vaticano com 44.000 m2 (anteriormente tinha 41.000
km2) e Pio XI reconhecia a posse política de Roma e dos Estados Pontifícios e
afirmava a sua permanente neutralidade política e diplomática, etc.
Com o Tratado de Latrão assinado,
encerra-se o processo da Unificação da Itália. O ideal Carbonário fora
conseguido e a Carbonária desaparece logo após a Unificação da Itália. Enfim,
ficou o estigma da condenação. Em 27 de Novembro de 1983, já sob a autoridade
do Papa João Paulo II, foi publicado um novo Código de Direito Canônico, que
entrou imediatamente em vigor, reduzindo para 1752 os 2414 Cânones do antigo
código.
O Código mais importante,
referente à Franco-Maçonaria, é o 1374: “Aquele que se filia numa Associação
que conspira contra a Igreja, deve ser punido com justa penalidade; e aqueles
que promovem e dirigem estes tipos de Associações, entretanto, devem ser
punidos com interdição”. Com isto, a maçonaria está legalmente e literalmente
livre do estigma.
Entretanto, no mesmo dia, foi
publicada uma Nota no jornal oficial do Vaticano, a Declaração da Congregação
para a Doutrina da Fé, que dizia: “Permanece imutável o juízo negativo da
Igreja perante as Associações Maçônicas, porque os seus princípios sempre foram
considerados inconciliáveis com a Doutrina da Igreja, e por isso, a inscrição
continua proibida.
Os fiéis que pertencem às
Associações Maçônicas estão em estado de PECADO GRAVE e não podem receber a
SANTA COMUNHÃO. “Não compete às autoridades eclesiásticas locais,
pronunciarem-se sobre a natureza das Associações Maçônicas com um juízo que
implica na revogação do que é estabelecida”. A publicação da Declaração foi
mais uma acomodação política aos minoritários insatisfeitos, e pode-se dizer a
contragosto do Papa. Afinal, ela afrontava uma decisão já tomada e aprovada,
logicamente pela maioria de toda a Congregação reunida com a finalidade
específica de renovação do Código.
Enfim, com a publicação no novo
Código do Direito Canónico, e da declaração da Congregação para a Doutrina da
Fé, o que mudou na relação entre a Maçonaria e a Igreja Católica? Mudou muito
pouco em relação ao que se esperava, mas esse “muito pouco” é alguma coisa para
quem não tinha nada. É uma esperança.
Paciência e esperança, estas são
as palavras
A pacificação total virá com
certeza, mas não se pode ter pressa. Já foi um enorme passo a publicação do
novo Código de Direito Canônico. Na medida em que, paulatinamente, as luzes se
forem acendendo no entendimento de cada autoridade eclesiástica, certamente
novos horizontes surgirão. Vimos, pela própria aprovação do Código do Direito
Canônico, que a maioria do clero quer a pacificação, senão ele jamais seria
aprovado, e é isto que deve acalentar as esperanças dos católicos, e até lhes
dar confiança diante das vicissitudes. Se o progresso é lento para a
pacificação total, por outro lado, não há nada que justifique um retrocesso no
futuro.
Roberto Rocha Verdini