Ao Segundo Vigilante de uma Loja maçônica compete, além do exercício das
funções rituais, a coadjuvação do Venerável Mestre na administração da Loja, em
conjunto com o Primeiro Vigilante, e, sobretudo, a superintendência no trabalho
e na formação dos Aprendizes.
Quanto ao seu papel na administração da Loja, se nele falhar ou executar
deficientemente, tal implicará uma sobrecarga do Venerável Mestre (que terá de
suprir a falta ou a deficiência no auxílio) e, sobretudo uma quebra ou uma
deficiência na planificação e execução de longo prazo da atividade da Loja.
Não é por acaso que, pese embora a Loja delegue a responsabilidade e o
poder de decisão no Venerável Mestre, se refira que a administração do grupo
recai sobre as "Luzes da Loja", ou seja, no conjunto composto pelo
Venerável Mestre e os dois Vigilantes. Porque tendencial - e desejavelmente -
estes três Oficiais da Loja cumprem uma linha de sucessão na direção da mesma,
a boa cooperação entre esta tríade, independentemente das alterações concretas
dos elementos que nela se integram, permite um desenvolvimento harmonioso, a
longo prazo, do trabalho da Loja.
O Segundo Vigilante tem dois anos para se preparar para o exercício do
ofício de Venerável Mestre. O Venerável Mestre pode iniciar ou prosseguir
projetos de longo prazo, com o conhecimento e a participação dos seus
Vigilantes, sabendo que eles estarão aptos a dar continuidade aos projetos e a
inserir neles, se necessário, as modificações que se mostrem aconselháveis.
Mas o principal objetivo, a principal tarefa, do Segundo Vigilante é
assegurar o acolhimento, a integração e a preparação dos Aprendizes. E essa
tarefa, para ser bem executada, não pode ser deixada apenas para os dias de
sessão. O Segundo Vigilante tem de ter disponibilidade, interesse e organização
para acompanhar individualmente cada Aprendiz.
Quando é iniciado numa Loja maçônica, o novel Aprendiz, por regra, entra
num grupo em que conhece muito poucos elementos (por vezes só um ou dois), com
regras estabelecidas que inicialmente desconheça e cujo conhecimento tem de
adquirir em simultâneo com o seu cumprimento, e com uma ligação forte entre os
seus elementos.
Sente-se um estranho, um peixe recém-entrado num aquário já bem
povoado... Para que a sua integração no grupo ocorra rápida, fácil e
harmoniosamente, é importante o apoio do Segundo Vigilante. É este quem deve
dar as primeiras indicações, os primeiros esclarecimentos, ao novo elemento,
quem deve zelar pela rápida e tranquilizadora integração do novo
"peixe" na segurança do "cardume" dos Aprendizes, com ele e
nele tomando conhecimento dos "meandros do aquário".
Paralelamente à integração dos novos elementos, compete ao Segundo
Vigilante coordenar a sua formação. Afinal de contas, Aprendiz é para
aprender... Esta tarefa é complexa a vários títulos. Desde logo, porque
naturalmente haverá Aprendizes em vários estádios de integração e formação,
havendo que corresponder às necessidades de cada um de forma individualizada.
As necessidades de integração e de auxílio na formação de um Aprendiz
recém-iniciado são, naturalmente, diversas de outro que já leva alguns meses de
integração ou de um terceiro que tem já a sua primeira fase de preparação quase
terminada e que ultima a elaboração e apresentação da sua prancha de
proficiência ou que, apresentada esta, aguarda a oportunidade para o seu
aumento de salário.
Mas também há que ter noção que coordenar a formação de um grupo de
Aprendizes maçons não tem rigorosamente nada a ver com lecionar uma turma de
jovens estudantes. Os Aprendizes maçons serão Aprendizes, mas são homens
ativos, alguns homens maduros, em pleno auge das suas carreiras profissionais
ou já na fase mais avançada dela, com famílias constituídas, responsabilidades
que asseguram filhos que educam e guiam. São Aprendizes, mas não são - longe
disso! - meninos! O tempo em que aprendiam ouvindo as preleções do
"sôtor" já é para eles passado, para alguns já longínquo.
O Segundo Vigilante tem de coordenar a formação do conjunto de
Aprendizes, normalmente heterogêneo, em termos de idade, de experiências de
vida, de formações acadêmicas, profissionais e culturais e em diferentes
estádios de desenvolvimento na aprendizagem da Arte Real. Mas, com todas estas
diferenças, são, Aprendizes e Vigilante, essencialmente IGUAIS.
Não há qualquer relação de superioridade, nem intelectual, nem
acadêmica, nem de responsabilidade. A única coisa que diferencia o Vigilante
dos seus Aprendizes é tão só a experiência em Maçonaria que aquele adquiriu e
que tem a obrigação de ajudar a que estes adquiram.
A tarefa de coordenar a formação dos Aprendizes não é, pois, fácil. Cada
Vigilante terá de desempenhá-la por si, em função das suas circunstâncias, das
suas disponibilidades, das suas capacidades, das características do grupo e dos
indivíduos que lhe cabe coordenar.
Não há, assim, um modelo único de formação que se possa aconselhar. Nem
sequer um único método a seguir. No entanto, pode-se sugerir um plano e um
método de formação que - sempre sujeito e aberto às adaptações e alterações que
cada Vigilante entender necessárias e justificadas - se entende adequado para
atender às diferenças do grupo de Aprendizes e apto a captar e manter o
interesse de gente por vezes já altamente formada e especializada nos
respectivos campos profissionais e que, assim, não está propriamente na
disposição de regredir aos seus tempos de polidores dos bancos da escola.
Sugiro que, no início das suas funções, no dealbar do ano maçônico, o
Segundo Vigilante selecione até sete temas, não mais, que constituirão a base
da formação de Aprendizes nesse ano. Uma hipótese (entre muitas e variadas)
pode ser, por exemplo:
1) HISTÓRIA DA MAÇONARIA
2) SÍMBOLOS DO GRAU
3) VALORES MAÇÔNICOS
4) RITUAL DE INICIAÇÃO
5) O MAÇOM PERANTE O CRIADOR
6) O MAÇOM PERANTE SI PRÓPRIO
7) O MAÇOM PERANTE A SOCIEDADE
Repare-se que cada um destes temas é suficientemente amplo e aberto para
ser abordado, tratado, desenvolvido, de uma miríade de diferentes maneiras. É
esse o objetivo! Não se vai ensinar nada a ninguém, muito menos um pensamento
único ou uma visão "correta". Como homens livres e de bons costumes
que são com a maturidade que lhes foi reconhecida como apta a integrar a Loja,
os Aprendizes não precisam ser ensinados, de receber lições. Apreciarão, pelo
contrário, enquadramento e meios para que cada um aprenda o que quiser, pelo
ângulo que entender, com a perspectiva que achar melhor.
A cada tema corresponderá um ciclo de trabalho de duas sessões e um
desenvolvimento.
Para a primeira sessão de cada ciclo, o SEGUNDO VIGILANTE deve ter
identificada e preparada (desejavelmente em ficheiros informáticos para serem
disponibilizados aos Aprendizes) bibliografia sobre o tema, nos vários aspetos
e abrangências dele, tão variada quanto possível - cinco a dez obras ou
trabalhos.
Na primeira sessão do ciclo, o Segundo Vigilante deve introduzir o tema,
designadamente chamando a atenção para os aspetos mais importantes nele, os sub-temas
ou questões que acha que serão importantes que os Aprendizes sobre eles
debrucem a sua atenção. Deve indicar a bibliografia, de preferência chamando a
atenção para diferentes formas de tratar o tema ou os diferentes aspetos
abrangidos pelos trabalhos disponibilizados. Deve designar um LÍDER DE
DISCUSSÃO para a sessão seguinte sobre o tema. De preferência, os líderes de
discussão devem ser designados por ordem de antiguidade dos Aprendizes.
O LÍDER DE DISCUSSÃO fica com o encargo de preparar e dirigir a
discussão sobre o tema na sessão de trabalho subsequente, escolhendo vários
aspetos do tema a tratar para colocar em debate, competindo-lhe garantir que,
na sessão seguinte, haja mesmo discussão, debate sobre o tema, sem tempos
mortos.
Finalmente, o Segundo Vigilante designa a data da sessão de trabalho
subsequente, exorta os Aprendizes a prepará-la lendo a bibliografia fornecida e
o mais que entenderem e acentua que a sessão subsequente consistirá num debate
de todos sobre o tema, dirigido pelo LÍDER DE DISCUSSÃO, que só será proveitoso
se todos e cada um, entre as duas sessões, lerem a bibliografia, aprenderem
sobre o tema e se prepararem para, expondo o que cada um aprendeu ajudar à
aprendizagem dos demais.
Na segunda sessão, processa-se a discussão do tema, sob a direção do
LÍDER DE DISCUSSÃO. Esta será tanto mais proveitosa quanto melhor o LÍDER DE
DISCUSSÃO e os demais Aprendizes se tiverem preparado entre as duas sessões. Se
porventura ninguém se tiver preparado convenientemente, provavelmente a sessão
será muito aborrecida, constrangedora e muito pouco proveitosa... Mas, pelo
menos ensinará a todos que, em Maçonaria, não se ensina, aprende-se - e que a
aprendizagem é um esforço individual de cada um, posto em comum com o grupo.
Na discussão da segunda sessão, o Segundo Vigilante deve intervir o
menos possível - apenas quando necessário para repor a conversa no tema, quando
o grupo dele se afastar (as conversas são como as cerejas...).
Finalmente, após a segunda sessão, o LÍDER DE DISCUSSÃO fica encarregado
de preparar e apresentar uma prancha sobre o tema - que poderá vir a ser a sua
prancha de proficiência para aumento de salário.
Repete-se, ao longo do ano, este esquema, com os vários temas. Ao fim do
ano, tem-se Aprendizes preparados, não por terem ouvido umas preleções, mas por
se terem debruçado sobre vários temas, por si e para si e para todos. Tem-se
trabalhos elaborados - e tendencialmente de boa qualidade, porque resultantes
de discussão em grupo e elaborados por quem se preparou para dirigir essa
discussão. Tem-se um conjunto de obreiros que criou naturalmente espírito de
grupo. O Segundo Vigilante ainda tem o bônus de, no ano seguinte, ir ter, como
Primeiro Vigilante, Companheiros que foram Aprendizes bem preparados e bem
habituados a preparar-se.
Finalmente, este método permite que, com toda a naturalidade e sem
custo, sem demasiado esforço nem dificuldade, os novos Aprendizes que
sejam iniciados ao longo do ano se integrem no trabalho da Coluna de
Aprendizes, No ano seguinte, o trabalho recomeça, com os mesmos ou outros
temas, ou alguns destes e temas novos, consoante o entender o Segundo Vigilante
de então.
Não tenho dúvidas que uma Loja que siga consistentemente este método de
formação de Aprendizes terá, mais cedo do que mais tarde, uma escola de
obreiros da melhor qualidade, prosperará e cumprirá devidamente o seu papel de
fazer, cada vez mais, de homens bons homens melhores!
Rui Bandeira
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