OS DIFERENTES NÍVEIS DA REALIDADE MAÇÔNICA



INTRODUÇÃO
Irmãos! Eu não me incomodarei em ser taxado de visionário, assim como nunca me incomodei com o rótulo de maçom-esotérico. Acredito que a Maçonaria precisa dos diferentes tipos de Maçons.

Na franco-maçonaria, reis, nobres, clérigos, plebeus, farsantes, revolucionários, esotéricos, ocultistas, simbolistas, historiadores, astrólogos, escritores, cientistas, espiritualistas, filósofos, hermetista, místicos, visionários e idealizadores conviveram de forma harmônica e pacifica,emprestando valiosa contribuição para que a Ordem pudesse sobre-existir na atualidade.

Passaram-se trinta e cinco anos desde que fui iniciado. A minha escalada na senda maçônicas não foi estéril. Neste meio espaço-tempo ascendi do grau um ao grau trinta e três. Colaborei na fundação e na funcionalidade de sete Lojas. Escrevi cinco livros sobre assuntos/temas estritamente maçônicos (e um sexto livro encontra-se em fase de acabamento).

Escrevi dezenas de artigos. Auxiliei intelectualmente centenas de maçons em sua escalada individualizada, e me relacionei com milhares de maçons brasileiros e de outras nacionalidades.Como diz São Paulo em sua Carta: “Combati o bom combate, cumpri a jornada, mantive a fé”.

Pode parecer estranho os parágrafos antecedentes – eu não tenho por hábito me colocar em meus escritos – mas tenho agora uma razão especial: presto contas da minha trajetória maçônica, identifico e discorro sobre diferentes níveis da realidade maçônica, apresento críticas e sugestões tendo como foco a atuação das Lojas e dos Maçons no desiderato de tornar feliz a Humanidade pelo aperfeiçoamento dos costumes, e para tal preciso demonstrar credibilidade sobre o que penso e escrevo.

A MAÇONARIA
A Maçonaria, desde suas lendárias e difusas origens, sempre se apresentou como sendo uma sociedade iniciática, de caráter esotérico, fechada, e voltada para a promoção do aperfeiçoamento moral e intelectual dos seus membros, e o melhoramento da qualidade de vida da Humanidade, chamando para si a responsabilidade pela propagação dos ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade entre os homens; motivando, a todos os que lhe são próximos, para a prática de elevadas virtudes, filantropia desinteressada, mútuo socorro, e cultura ilustrada; reunindo em suas Colunas homens de diferentes raças, religiões, línguas e culturas, com o objetivo de fazê-los alcançar a perfeição ético-moral por meio do simbolismo e alegorias de natureza mística e/ou racional, da filantropia e da educação.

Na visão do Maçom, a Maçonaria é uma Universidade, uma escola de vida, proposta formativa, educação permanente, onde um conjunto de homens bons, livres e inteligentes trabalham voluntariamente para o progresso da Humanidade, se batendo pelo aperfeiçoamento dos costumes e pela ética nas relações sociais, sob a égide da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, rumo à conquista da felicidade geral e da paz universal.

Na visão do homem socialmente engajando, a Maçonaria impõe respeito e coleta admiração, reconhecendo nas ações dos Maçons o esforço para a construção de uma sociedade melhor, mais justa e mais fraterna. Na visão do homem comum – do povo – muitos imaginam ser a Maçonaria uma espécie de máfia, outros um clube, outros a imaginam um Estado dentro do Estado, enquanto muitos outros nem se dão conta da existência dos Maçons e muito menos da existência da Maçonaria.

Por si mesma, a Maçonaria é um modelo de sociabilidade ilustrada do que sempre foi pelo menos a contar de 1717, e a sua vocação é ser uma Entidade sem fronteiras. Funciona como uma âncora moral e espiritual para os Maçons e para a Sociedade seja pelos ensinamentos e conhecimentos de que é guardiã; seja por possuir os instrumentos teóricos, filosóficos, históricos, sociológicos, éticos e morais necessários para motivar seus membros ao burilamento intelectual; seja por fornecer os elementos necessários à ação, podendo desvelar a todos, no momento certo e oportuno, um dos seus maiores segredos: a unidade do amor incondicional ao próximo.

De fato, o objetivo mais característico da Ordem Maçônica a ser perpassado é o amor fraternal que orienta para fazer o bem na execução da sua sublime missão de unificação da humanidade, e as vozes que ecoam da cripta dos grandes filósofos – os mestres da terra – conduzem ao entendimento de que o Mundo é nossa família.

Todos somos filhos e filhas do Grande Arquiteto do Universo. Somos, pois, irmãos e irmãs, vez que criados pelo mesmos Pai. Na unidade divina não há diferenças radical entre os filhos de Deus além da língua, íris e datiloscopia. Cada um de nós somos no Universo de Deus uma particular visão espiritual da Humanidade.

A Maçonaria caracteriza-se, ainda, por ser uma instituição humanística que exalta tudo o que une e repudia tudo aquilo que divide, aspirando tornar a Humanidade mais feliz, mais fraterna, mais humana, enfim, aspirando constituir uma grande família de irmãos, vez que considera Irmão a todos os maçons, quaisquer que sejam suas raças, nacionalidade, convicções e crença, recomendando a divulgação de sua doutrina pelo exemplo e pela palavra, e pelo combate, terminantemente, ao recurso da força e da violência para a consecução de quaisquer objetivos.

Os ensinamentos maçônicos condensados na máxima “Ama Teu Próximo”, induzem à observância das leis; a vivencia segundo os ditames da honra; à pratica da justiça e da equidade e do amor ao próximo; e induzem ao trabalho incessante pela felicidade do gênero humano.

Em suma: ensina os maçons a dedicarem-se à felicidade de seu semelhante, não porque a razão e a justiça lhes imponham esse dever/obrigação, mas porque esse sentimento de fraternidade é a qualidade inata que nos faz Filhos do Universo, amigos de todos os homens, e fieis observadores da Lei do Amor que Deus estabeleceu no Planeta.

Nas palavras do Irmão Osvaldo Ortega, “o reflexo das ações maçônicas que por certo causariam um bem-estar à Ordem e as nossas vidas, não seriam somente as praticadas ritualisticamente no Templo. Seriam reflexivas sim, principalmente aquelas que aplicássemos no campo social e profissional onde atuássemos lá fora, por aquilo que aprendemos lá dentro.

A essas ações os nossos pensamentos e palavras a elas deveriam estar síncronos” (Ortega, p. 60). Maçons devem ser gentis e afetuosos uns com os outros, irmãos, verdadeiramente. A Maçonaria Universal é a Grande Sociedade da Paz do Mundo.

OS MAÇONS
Independentemente do que se possa supor a seu respeito e individualidade, o Maçom é o que é,e será o que é, confiante e indecifrável. Em particular, é desconhecido do grande público, e quando conhecido, é considerado como participante de um grupo fechado de pessoas que se reúnem em segredo, que participam de rituais secretos e que tem em comum o propósito de ajudarem-se mutuamente.

O Maçom, por seu turno, pouco ou nada faz para se revelar. São por compromisso e por vontade própria, programados à discrição e ao isolamento voluntário da sua condição de Maçom. Me parecem fiéis seguidores de Albert Pike, o pregador da recomendação de que “o sigilo é indispensável em um maçom, não importando o Grau”(Pike, p. 5).

Há Maçons, contudo, que são por demais conhecidos do público por conta da sua área de atuação antes de ingressarem na Maçonaria, alguns destes, depois do ingresso guardam sigilo da condição de membro associado e assim mantém o anonimato e o distanciamento.

Outros ficam distinguidos/conhecidos depois de se tornarem membros de uma Loja Maçônica, mas, em ambos os casos, o conhecimento da condição de Maçom fica adstrita ao círculo de amizade do próprio Maçom. Acreditam que o fato de não se revelar é algo que sempre esteve, está e sempre estará a seu favor e a favor da Ordem. Evitam aparecer e de se dar a conhecer na sua condição de Maçom, embora a vocação do Maçom seja a de ser um Ser sem fronteiras.

Por outro lado, se a sociedade (o povo) pouco conhece da Maçonaria – sua história, tradições e realizações – é porque os Maçons não a divulgam adequadamente. A Maçonaria, contudo, não pede e ao que me parece, nunca pediu para ser divulgada, mas não comete crime quem se identificar como Maçom. Entrementes, devo antecipar que os Maçons vivenciam efervescentes atividades social, política e cultural dentro e fora da Ordem.

Os Maçons e as Lojas desenvolvem intensa programação ritualística e social não-ritualísticas, são festas, jantares, confraternizações, palestras abertas ao público e inúmeras outras atividades promocionais, proporcionando ao Maçom e aos seus familiares um relacionamento efetivo, no Universo particular da Maçonaria, dos Maçons e de seus familiares e amigos.

NADA MUDAR PARA SE MANTER
Aos Maçons, no Brasil e em todos os lugares, em todas as Lojas, em todos os ritos, são ensinados a prática da caridade e o interesse da ajuda à comunidade. Os Maçons são encorajados à prática da caridade e ao trabalho para o bem-comum. Estes dois aspectos são princípios maçônicos da benemerência que envolve os Maçons desde o início da franco-maçonaria na sua inatingível linha do tempo.

Aos Maçons, ainda, são ensinados a serem francos, honestos e verdadeiros, exigindo-se de cada um deles o mais elevado padrão de moralidade e eticidade. Isto não se muda. É causa pétrea.

Focado nas tradições e no conservadorismo dos Landmarks e das Antigas Obrigações, os Maçons se escudam para justificar algumas das suas ações e leniências na condução da própria atividade maçônica.

Nesta postura entre o novo e antigo, mudar ou não mudar, agir ou não-agir, fazer ou deixar-de-fazer, reside o grande desafio do livre-arbítrio, e muitos Maçons, assim,encontram justificativas e/ou saem do nível e do prumo e se afastam da retidão do esquadro e do compasso e da Maçonaria para a vida em comum da sociedade profana, orientando seu comportamento e entendimento à luz da realidade que lhe é permitido enxergar, em razão do seus próprios conhecimentos e avaliações.

E aqui fica o alerta: o fato de alguns Maçons não seguirem 100% às regras estabelecidas e acordada internamente, depõem não somente contra o próprio Maçom, mas contra toda a Irmandade.

É sabido que os diferentes níveis da realidade mundana moldam os homens e moldam os maçons (o termo nível aqui aplicado diz do valor intelectual e moral, dos diferentes estágios de padrão e qualidade dos homens e do maçom). A Maçonaria é um espelho da realidade mundana, sem que se possa atuar para inverter esse estado de coisas. As discussões em torno desse tema são inúmeras e improfícuas.

Ao ingressar na Maçonaria, o Maçom não desincorpora sua cultura (100%) mundana, mas ao iniciar uma nova caminhada precisa evoluir, crescer, precisa receber novos conhecimentos, novo desenvolvimento intelectual e cultural. A vida e a atividade maçônica, em sua essência, exigem duas ou três horas semanais do Maçom, e este só se eleva, rebaixa ou estaciona em realidade, na concepção do conhecimento cada um e na conformidade do grau de instrução efetivamente incorporado. Daí decorre os (des)nivelamentos.

Em verdade, a vida e a atividade maçônica no Brasil, nos graus iniciais, consume pouco tempo, imagino seja algo inferior a 2% do tempo semanal, mensal ou anual do Maçom (não disponho de números, mas avalio que são poucos os Maçons que dedicam parte significativa do seu tempo ou do seu trabalho à causa da Maçonaria e dos afazeres recomendados à prática, doutrina e cultura maçônica), o que quer dizer que depois de iniciado o maçom continuar a viver cerca de 98% para a realidade mundana e apenas 2% para a Maçonaria.

Esse quadro só se altera um pouco com a permanência na Ordem, com ascese aos cargos de direção e/ou aos graus superiores da Maçonaria. Daqui também decorre os (des)nivelamentos.

Assim, muitíssimos maçons pouco sabem sobre a História, Filosofia, Doutrina, Lendas, Tradições, Rituais, e dos Usos e Costumes da Ordem, embora sejam bons e frequentes em Loja. Outros comparecem muito pouco às Sessões de Loja e sabem menos do que deveriam saber.

Alguns outros são verdadeiras esfinges, entram e saem silenciosos das sessões de Lojas, são como livros preciosos contendo sábios ensinamentos, mas que permanecem fechados nas estantes apanhando o pó do tempo. Outros, infelizmente, falam, falam e nada produzem.

Alguns outros são só festivos, são dados às festas e confraternizações maçônicas. Em resumo: os maçons são de tantos níveis quanto sejam as suas qualidades maçônicas e os trabalhos de suas Oficinas.

Embora a sociedade não se interrogue sobre onde, como, quando, por que e para que serve a Maçonaria, a formação do homem iniciado-maçom e a missão maçônica são nobilíssimas, e a discrição da Vontade Divina em conceder à Maçonaria a missão histórica de salvaguarda de uma sabedoria milenar, uma filosofia muito elevada e profunda e também milenar, o que faz com que a Maçonaria por via do Maçom, seja a fonte e o artífice da onda de progresso que vai unificar as fronteiras geográficas e os homens na universalidade da fraternidade, do amor e do perdão. Digo: A Maçonaria e o Maçom são fonte e artífice da onda de fraternidade que vai unificar a Humanidade. A vocação da Maçonaria é ser uma Entidade sem fronteiras.

CONCLUSÃO
Mais do que uma Instituição, a Maçonaria é uma universidade de acesso ao conhecimento ilimitado e tem uma proposta peculiar de ensino/aprendizagem no sentido iniciático da conscientização de morrer para nascer de novo e reconstruir-se de dentro para fora, o que significa dizer: praticar a ressurreição em vida. 

Comportaria, ainda, afirmar que a única realidade que atrela o Maçom à Maçonaria é a vontade de permanecer, de crescer, de se desenvolver, de ser diferente. Neste sentido, a Maçonaria tem por objetivo, tem por fim, e tem como meios (e em certa medida, os fins), os seus membros: os Maçons e a sociedade humana.

A Maçonaria ministra muitos saberes, ensina e ensina, mas também aprende e aprende, e em sua longa trajetória histórica, “aprendeu que somente vale a pena ficar com o Maçom convicto, que continua querendo aprender e elabora seu próprio projeto de vida conforme a doutrina maçônica” (DEMO, p. 70). E tanto isto é verdadeiro, que a Maçonaria não obriga ninguém a permanecer associado as suas Lojas ou em Graus e Ritos.

O Maçom é livre e tem a liberdade de escolha entre permanecer ou sair, evoluir ou estacionar na ascese maçônica. “Quem quer, permanece na Instituição, que não quer, se vai” (DEMO, p. 69).

Na etimologia latina, a palavra “educar” significa “puxar de dentro” (DEMO, p. 71) e através do tempo e mundo afora as realizações maçônicas não foram e não serão medidas pela ação dos seus membros e sim pela capacidade que eles tiveram ou venham a ter no futuro, no domínio do conhecimento e do aprendizado maçônico (nem sempre visível ou sensível), de se resolver, de se auto-construir, de lapidar-se a si mesmo antes de tentar lapidar aos outros.

É por conta deste tipo de ideal que a Maçonaria está disposta a orquestrar vozes de todos os timbres, independentemente de religião, raça, classe social, formatando contexto de generosidade infinita no qual todos, sem exceção, pode progredir e se aperfeiçoar, ou seja, nivelar-se.

Irmãos! Eu os considero a todos como meus Irmãos, e mais, eu também considero a todos os seres humanos como nossos Irmãos. Penso que devo convidá-los a enxergarem nas pessoas à nossa volta um Irmão.

Penso que o tempo é de agir e conclamo à que os maçons estendam e liberalizem os laços fraternais que os unem entre si a todos os homens esparsos pela superfície da Terra.

E encerro com duas frases lapidares: “Oh! Quão bom e quão suave é que os Irmãos habitem em união” (Salmo 133) e “Eis aqui quão bom e jucundo é quando os irmãos habitam a união” (Dante Alighieri, De Monarchia – XVIII, citando o salmo 133). Continuar seria algo próximo do “Mais-Que-Perfeito”.

Por Luiz Gonzaga Rocha

Obras de Apoio:
DEMO. Pedro, Maçom: Jeito de Ser, Brasília: ed. do autor, 2006.
ORTEGA. Oswaldo, Uma Luz nos Mistérios Maçônicos, São Paulo: Edições GLESP, 2003.
PIKE. Albert, Moral e Dogma do Rito Escocês antigo e Aceito, Tomo II, s/local impressão. s/ed, s/d.
ROCHA. Luiz Gonzaga da, Apontamentos para a História da Maçonaria: Pernambuco 1842/1852, Brasília: Impressus, 2014.
SARAIVA. Alexandre José de Barros Leal, Maçonaria: percepções, dúvidas, fé e razão de um obreiro feliz, Fortaleza: Relevo, 2009.
SOBRINHO. José Wilson Ferreira, Centelhas Maçônicas, Londrina: A Trolha, 2003.



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