Quando os homens pré-históricos
procuravam respostas para os eventos calamitosos, que aconteciam no mundo
caótico em que viviam, cheio de erupções vulcânicas, tornados, secas,
enchentes, quedas de meteoros, frequentemente buscavam explicações
sobrenaturais.
Assim, por exemplo, algumas tribos
acreditavam em espíritos travessos ou mesmo maus. E que os humanos teriam que
fazer sacrifícios e adorar esses maus espíritos, na esperança de que eles não
fizessem coisas negativas, coisas ruins para eles, por exemplo, arruinar seus
alimentos e caças ou atacá-los com uma doença horrível.
As primeiras sociedades começaram como
famílias individuais e depois como grupos étnicos. Então, os nossos ancestrais
usaram a crença em uma divindade ou divindades para construir um dos alicerces
das sociedades humanas complexas.
Na busca por uma teoria para explicar as
características da evolução humana, muitos antropólogos estabeleceram a
“hipótese do deus moralizador”, argumentando que a crença em uma figura divina
que tudo vê e sabe, que julga e castiga, foi criada com o desenvolvimento das
sociedades complexas.
Ao longo da história humana, as práticas
e os rituais de crenças religiosas surgiram de forma independente e espontânea
em todo o mundo, e sua ascensão, na maioria das vezes, coincidiu com a
transição de grupos desorganizados de caçadores-coletores para as sociedades
complexas com regras, governos e costumes.
Então, quando os grupos e os reinos
começaram a interagir, se fundir e crescer, os chefes e governantes precisavam
de um único padrão moral para manter todos na linha, assim, a religião se
tornou o elemento do controle do povo.
A religião era uma maneira poderosa e
útil de forçar que as pessoas se comportassem de acordo com um padrão moral,
elas tinham que cumprir esses preceitos morais porque, se não o fizessem,
seriam punidas por deus. Um deus irado, censurador, um verdadeiro magistrado
intrometido.
As religiões dependem da ideia de que os
humanos podem ser punidos se não seguirem um código moral estabelecido por
deus. Essa regra de cumprir um código moral, se aplica até mesmo a credos sem
uma divindade, como o karma no budismo e no espiritismo.
Algumas pessoas acreditam que precisamos
da religião para sermos morais, para nos dar um senso de certo e errado e nos
ajudar a sermos 'bons'. Elas afirmam que a religião estabelece um padrão de
moralidade, e que deus premia o bom comportamento e pune o mau. Outros dizem
que é perfeitamente possível ser moral e feliz sem acreditar em deus ou deuses.
Dezenas de estudos ofereceram suporte para essa hipótese.
Além disso, o resultado de estudos
concluiu que, a desobediência as regras morais divinas, são um dos motivos dos
humanos passarem de pensar “os deuses estão com raiva!” para os “deuses estão
com raiva por minha culpa”, passando a responsabilidade da punição do grupo ser
individual.
Foram identificados deuses moralizadores
em 20 das 30 regiões que foram examinadas por um grupo formado por um
antropólogo, um historiador e um biólogo evolutivo, que criaram o Seshat. Um
banco de dados internacional da evolução cultural humana, com o nome da antiga
deusa egípcia da sabedoria, conhecimento e escrita, Seshat.
O estudo abrangeu dos deuses celtas na
França, aos hititas na Turquia e os espíritos ancestrais no Havaí. Com base nas
análises os pesquisadores, concluíram que os deuses morais foram criados com o
aumento da complexidade das sociedades, nasceram com o crescimento da maioria
das construções sociais. Porém, os pesquisadores descobriram que no império
inca do Peru, o povo acreditava em deuses moralistas vingativos, antes que
hábitos sociais complexos, como a escrita, florescessem.
O filósofo alemão Immanuel Kant, um dos
principais pensadores do Iluminismo, afirmou que não há nenhuma conexão entre
religião e moralidade. A moralidade é muito mais antiga que a religião. Nós
fomos seres morais por muitos anos antes de sermos religiosos. E, sem dúvida,
algumas religiões não são morais de forma alguma.
Estamos acostumados com a ideia de
deuses poderosos no céu cuidando de nós e nos dizendo como sermos bons. Essa é
a base do cristianismo, islamismo e judaísmo. Mas essas são religiões
relativamente recentes em termos da história do desenvolvimento humano.
E mesmo hoje nem todas as religiões
seguem o modelo padrão de um deus bondoso cuidando de nós. O budismo, por
exemplo, não segue esse modelo. Os humanos podem ter tido algumas crenças
sobrenaturais, mas nem sempre foram, e não precisam ser, morais.
É uma suposição comum a muitas pessoas,
que um país muito religioso é mais cumpridor da lei, moral e menos violento do
que um que não é religioso. Mas este não é o caso. De acordo com a organização
sem fins lucrativos Vision of Humanity, que publica anualmente o Índice “Paz
Global”, as dez nações mais seguras e pacíficas do mundo são as que menos
acreditam em deus, enquanto as nações menos seguras e pacíficas são as mais
religiosas.
Isso significa que uma fraca crença
religiosa pode causar mais bem-estar a sociedade, enquanto, uma crença
religiosa muito forte, pode trazer mais problemas sociais. Isso pode significar
que problemas sociais, falta de atendimento a necessidades básicas e ausência
de instituições que garantam estado de direito, podem levar as pessoas a
recorrerem à religião por desespero. Quando a situação social e econômica é
boa, as pessoas não precisam colocar sua fé e esperança na religião.
Então, de acordo com índice “Paz
Global”, está claro que países seculares e não religiosos, como o Reino Unido,
não são afetados negativamente pela ausência da fé e da moral religiosa.
No início do século XXI, uma olhada
casual nos conflitos mundiais mostra que a religião está no centro de grande
parte dos conflitos ao redor do globo. Muitas vezes, a religião é a causa de
conflitos por questões controversas.
Todas as religiões têm seus dogmas,
tradições e crenças, que os seguidores devem aceitar sem questionar, isso pode
levar à inflexibilidade e a intolerância diante da moralidade religiosa, contra
outras crenças e ateus. Afinal, se é a palavra de Deus, como alguém pode
transigir? Ao mesmo tempo, as escrituras sagradas e os dogmas religiosos
costumam ser vagos e abertos à interpretação.
Portanto, podem surgir conflitos sobre
qual interpretação é a correta, um conflito que, em última análise, não pode
ser resolvido, porque não existem árbitros.
O que acho mais questionável sobre tudo
isso, não é só um país querer construir valores e padrões morais fundamentados
numa religião, mas, querer ignorar as consequências negativas, práticas e
emocionais que acompanham essa imposição.
A visão contemporânea de mundo, tornou a
moral intelectualmente isolada da fé religiosa, pois, a religião de certa forma
contribuiu e contribui com os horrores do mundo.
Eduardo G. Souza
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