Depois de muitos anos na Maçonaria, vendo carreiras meteóricas e
ascensões fulminantes de homens medíocres, sem cultura geral e maçônica, sem
vivência dentro da Instituição e sem trabalhos de vulto, em benefício dela,
creio que posso dar, aos novos maçons, que queiram enquadrar-se nessa situação,
a receita de como possuir altos graus e cargos elevados, sem o tempo necessário
e legal e sem fazer força.
É claro que esta receita é apenas para as mediocridades, que não
possuem capacidade suficiente para subir pelos seus próprios méritos. Eis as
regras, bem simples:
Faça muitos exercícios de contorcionismo, para que a sua coluna
vertebral se torne bastante flexível, permitindo desta maneira, grandes
curvaturas aos que lhe são hierarquicamente superiores dentro da Ordem.
Exercite também os seus joelhos, para que eles aguentem as
genuflexões aos detentores do poder.
Acostume a sua cabeça a balançar, apenas no sentido vertical e
nunca no horizontal, para que possa concordar com tudo o que os seus superiores
hierárquicos, na Loja, ou na Obediência, desejarem.
Bater palmas aos que estão acima, ajuda sempre: exercite as
mãos.
Seja sempre o primeiro no cortejo da bajulação, no cordão dos
“engraxadores” dos detentores dos poderes simbólicos e dos altos graus, desde
que, é óbvio, eles gostem de bajulações.
Nunca diga “não”. Seja como a boa prostituta e concorde com
tudo, pois negócio é negócio.
Seja sempre bonzinho com todos, fale mansa e suavemente, sem
nunca alterar a voz: não dê palpites, não emita opiniões, não queira dar
demonstrações de cultura e todos acharão que você é o máximo.
Procure conseguir alguns titulozinhos “profanos”; mesmo sabendo
que a mediocridade não merece títulos, rastejando e implorando é possível
consegui-los. O trabalho compensa, pois os títulos, mesmo imerecidos,
impressionam os basbaques.
Acima de tudo, e esta é a regra principal, esteja sempre com
quem está por cima. Se, todavia, aquele que estiver por cima vier a cair, não
hesite em ser volúvel; mude de amo, pois a sua vaidade terá que ser maior que a
sua dignidade.
Não seja independente, pois Maçom independente só sobe pelos
seus próprios méritos e com esforço; além de tudo, independência é apanágio de
quem tem dignidade, brio e não é medíocre, não precisando, portanto, de todas
estas regras.
Seguindo estas dez simples regras, é possível, em pouco tempo,
chegar aos mais altos graus (neste caso, uma boa conta bancária também ajuda),
em detrimento de Irmãos mais antigos e mais capazes, e subir aos altos cargos
simbólicos, com exceção do Grão-Mestrado, pois os títeres só servem para
sustentar os Grão-Mestres e nunca para lhes tomar o lugar.
Quem fizer tudo isto, será logo um figurão dentro da Instituição
e mesmo que não possua suficiente cultura, será um bom enganador, pois todos
acharão que a possui.
A existência destes figurões fabricados é, todavia, motivo de
grande desgaste, para a Maçonaria, pois ela repete, no caso, um dos grandes
erros da sociedade “profana”, que é a inversão de valores; além
disso, ocupando altos cargos na Ordem e sendo reconhecidos como medíocres lá
fora, eles depõem contra a própria Instituição.
Há alguns anos, um amigo e Irmão “adormecido”, portador de vasta
cultura e reconhecidamente capaz, perguntou-me, a respeito de um conhecido
comum nosso: – “Qual é o cargo que Fulano ocupa no Grande Oriente?” Quando eu
lhe respondi, ele, atônito, exclamou: – “Puxa! Esse indivíduo, multiplicado por
dois, não forma meio burro! Como vai mal a nossa Maçonaria!” – Era tolice eu
tentar explicar como o “indivíduo” conquistou o cargo. Ficaram apenas a
vergonha e o desencanto, próprios de quem é Maçom de brio e não gosta de ver
deturpada a imagem da Maçonaria Nacional.
Em 1974, como responsável pelo Boletim da Loja “Lealdade à
Ordem”, da qual fui idealizador e fundador, fiz uma crítica, abordando a
mediocridade da assessoria do Grande Oriente de São Paulo ligado ao GOB, já que
é notório que os cargos de confiança nem sempre levam em conta a capacidade,
mas servem, mais, para premiar “os amigos do rei”.
A crítica tinha destinatário certo: era dirigida a dois
“Grandes” Secretários; todavia, todos enterraram a carapuça até os joelhos. O
Grão-Mestre estadual da época disse-me, então, que eu tinha ofendido a toda a
cúpula. Ora, se toda a tal cúpula se sentiu “ofendida” é porque eu, realmente,
me enganara: a mediocridade era total e não de apenas dois Secretários, pois
quem não era realmente medíocre, não poderia se sentir atingido. Certamente
todos seguiam o conselho da sabedoria antiga “Nosce te ipsum” (tradução latina
da inscrição grega encontrada no frontispício do templo de Apolo, em Delfos),
que significa: “Conhece-te a ti mesmo”.
Com o conhecimento deste fato, muitos poderão perguntar-me se a atual
crítica também tem endereço certo. E eu responderei, imitando um antigo
político brasileiro: “Nem sim, nem não, muito pelo contrário; deixemos aos
pavões o benefício da dúvida”. Os homens brilhantes, que estão nos altos
escalões da Maçonaria Nacional e que representam a maioria, não se sentirão
atingidos. O resto? Bem, o resto… é o “resto”!
Cabe, aqui, entretanto, uma advertência final: não confundir
subserviência com fidelidade, pois qualquer Maçom pode ser fiel a um dirigente maçônico,
sem ser servil, sem se desfazer da vontade própria, sem prostituir a sua
consciência e sem ter a docilidade de um fantoche.
A fidelidade consiste em dar apoio, mas não aplaudir e avalizar
os erros, pois o verdadeiro amigo, o amigo fiel, chama a atenção para os erros
e suas consequências, impedindo que eles sejam cometidos.
Um Grão-Mestre democrático ouve os que o cercam e toma as suas
resoluções de acordo com a maioria, formando uma liderança coletiva, base e
sustentação da moderna democracia.
Uma assessoria que, por mera adulação, se comporta como um
rebanho de carneiros, é altamente perniciosa, é a negação da liberdade de
consciência, é o primeiro passo para uma nefasta ditadura, incompatível com o
espírito maçônico de LIBERDADE.
José Castellani