Por poucos que sejam, há, de fato, segredos na Maçonaria. Num
tempo e numa sociedade em que a vida de cada um se encontra cada vez mais
exposta, não é senão natural que a simples existência de segredos cause
curiosidade e mesmo perplexidade. Contudo, a existência dos segredos tem mais
do que uma justificação.
Em primeiro lugar, há as razões culturais, morais e éticas.
Diz-se da Maçonaria ser “um sistema peculiar de moralidade, velado por alegorias
e ilustrado por símbolos”.
Ora, se os sistemas de moralidade variam de sociedade para
sociedade, as raízes anglo-saxônicas da Maçonaria são bem visíveis através
daquilo que esta valoriza como a delicadeza de trato associada aos gentlemen,
ou essa mistura de contenção e refreamento que constitui a tão conhecida fleuma
britânica.
Pode, nesta perspectiva, dizer-se que o segredo, o silêncio e o
“saber calar “são manifestação de três virtudes que a Maçonaria muito preza: a
circunspeção, a discrição e o auto-controlo.
Terá sido esta atitude, a par de um contexto histórico de
guerras religiosas e de luta política de que a Maçonaria queria (e quer)
manter-se afastada, que ditou o 6º Landmark, “A Maçonaria impõe a todos os seus
membros o respeito das opiniões e crenças de cada um. Ela proíbe-lhes no seu
seio toda a discussão ou controvérsia, política ou religiosa. Ela é ainda um
centro permanente de união fraterna, onde reinam a tolerante e frutuosa
harmonia entre os homens, que sem ela seriam estranhos uns aos outros.”
Quantas vezes uma frágil
harmonia se consegue, sabe-se lá com que custo, pela exaltação dos pontos de
concórdia, e pela minimização da exposição dos pontos de dissensão… É por isso
que, em Maçonaria, se respeita em absoluto a liberdade de expressão de cada um
– ao mesmo tempo em que se espera que cada um tenha aprendido a, no seu
exercício, não ameaçar a harmonia, o equilíbrio e a fraternidade.
Em segundo lugar há razões simbólicas e metodológicas. Diz-se
que, nos tempos da Maçonaria Operativa, seria através de sinais secretos,
próprios de cada uma das classes de operários, que os seus membros se
identificariam perante os tesoureiros para assim receberem os seus salários
diferenciados.
Do mesmo modo, cada grau – Aprendiz, Companheiro e Mestre – tem
os seus próprios sinais de reconhecimento, os seus próprios segredos que não
podem ser revelados aos de grau inferior.
A natureza do que se cala é menos importante do que a
aprendizagem do guardar silêncio, do calar-se e do refrear-se. Sem calar não se
pode ouvir; é por isso que nas sessões é imposto absoluto silêncio aos
Aprendizes e aos Companheiros.
Como exercício, fora destas, são-lhes confiados os “segredos de
grau”, que não passam, neste sentido, de um mero exercício de contenção. Por
outro lado, a separação entre os graus evidencia e promove o progresso de cada maçom,
e permite que, expostos aos mesmos conceitos na mesma ordem cronológica, todos
percorram caminhos relativamente semelhantes.
Os símbolos marcam o caminho, e a sua interpretação ou o
aprofundamento do seu estudo constituem segredos na medida em que antecipação
do conhecimento dos mesmos poria em risco a sua frutuosa interiorização.
O silêncio não termina, porém, com a elevação a Mestre, antes se
transfigura de silêncio imposto em silêncio voluntário. De fato, um Mestre
deverá ter já interiorizado o que a sabedoria do povo nos repete: que, se a
palavra é de prata, o silêncio é de ouro.
Por fim, e em terceiro lugar, encontra-se a reserva da
identidade dos irmãos, o que não deixará de fazer sentido face à incompreensão,
rejeição e mesmo perseguição de que os maçons foram – e, infelizmente, são
ainda em muitos lugares – alvo, pelas mais diversas razões, das políticas às
religiosas.
Não obstante ser cada um livre de assumir publicamente a sua
condição de maçom está-lhe absolutamente vedado revelar a de quem o não fez.
Por poder causar danos reais na vida daqueles cuja identidade
fosse indevidamente revelada considero ser este, de entre os vários que os
maçons juram guardar, o único segredo verdadeiramente digno desse nome.
Blog “A Partir Pedra” – Texto de Paulo M.