Nos Rituais, Manuais e
Catecismos Maçônicos pululam em todas as páginas, personalidades, símbolos,
tradições, mitos e lendas plenos de mistérios, mas que se completam de forma
autônoma, ao longo dos Graus, enriquecendo, não só a Literatura Maçônica, mas o
aprendizado e a Cultura da Arte Real. Alguns desses personagens, símbolos e
tradições, lendas e mitos estão por completos ou parcialmente esquecidos. A
ideia é caminhar em sua direção com o objetivo de promover resgates.
O Rito Escocês Antigo
e Aceito, formatado em 33 Graus, apresenta-se como um conjunto harmônico,
entrementes, cada Grau possui sua própria ritualística, personagens,
simbolismo, lendas, tradições e mistérios que se de desvelam aos iniciados em
cada um dos Graus respectivos, e no momento preciso, como num jogo de juntar
peças.
O mesmo se pode afirmar com relação aos demais Ritos que tiveram origens
no Velho Continente, notadamente Inglaterra, Escócia, França e Alemanha.
No nosso modesto e
humilde entender, as tradições, em especial, as lendas, os personagens, os
fatos e acontecimentos que serviram (e ainda servem) de repositório de
conhecimentos e/ou informações acumuladas pela Ordem na sua longa marcha
civilizatória, estão perdidas e/ou se perdendo em face das alterações
desfigurativas dos Rituais; da ausência de métodos instrucionais eficazes na
transmissão dos saberes; e da falta de interesse dos maçons em se aprofundarem
no conhecimento das tradições maçônicas.
A meu entender, não há
força capaz de sustentar uma instituição como a nosso sem o apoio do
conhecimento, sem a transmissão da tradição, dos usos e costumes, e do
simbolismo subjacente, que passam a representar, essencialmente, a pedra
angular, a argamassa, o elemento de coesão da Maçonaria e dos Maçons.
Neles se
exprimiram todos os sábios antigos e neles deixaram os seus rastros luminosos
de saberes que chegaram até nós. A manutenção da Tradição de nossa Ordem faz
com que a pratiquemos, no século XXI, a ritualista estabelecida nos séculos
XVII e XVIII. Se assim não fosse a nossa Ordem já teria se pulverizado.
Então, diante deste
cenário, parece-nos excessivamente oportuno escrever sobre este assunto – as
tradições esquecidas – na tardia esperança de reacender o fogo do interesse
pelas “coisas” da Ordem, ainda que, para isto, tenhamos que inscrever no preâmbulo
intelectual de cada maçom, marcas que expressem o sentimento de
que precisamos reencontrar nas tradições maçônicas, a chave que serve para
abrir e/ou fechar o cofre do tesouro do conhecimento dessas coisas que a
Maçonaria conserva.
Focando na questão da
tradição maçônica, vamos, inicialmente, perquirir os dicionários para averiguar
o que eles dizem. No meu velho e bom “Aurélio”, por exemplo, encontro: Tradição é
o ato de transmitir ou entregar (algo ou alguma coisa a outrem); transmissão
oral de lendas, fatos, etc., de idade em idade, geração em geração; transmissão
de valores espirituais através de gerações; conhecimento ou prática resultante
de transmissão oral ou de hábitos inveterados; e, por fim, recordação,
memória.
Poderia me contentar,
apenas, com as duas últimas palavras: recordação e memória. Mas, precisamos
evoluir, então, recorremos ao meio mais moderno de consulta da atualidade, o
Google, e lá encontramos: Tradição (do latim: traditio, tradere =
entregar; em grego, na acepção religiosa do termo, a expressão é paradosis
παραδοσις) é a transmissão de práticas ou de valores espirituais de geração em
geração, o conjunto das crenças de um povo, algo que é seguido
conservadoramente e com respeito através das gerações.
Procurando refúgio e
apoio nas obras maçônicas, recorro a Nicola Aslan e ao seu Grande Dicionário
Enciclopédico de Maçonaria Simbólica, que a partir do verbete especifico
transcrevo:
“Tradição –
Palavra de origem latina usada, em Direito, para indicar a ação de entrega e
particularmente de uma propriedade. Por extensão esta palavra aplica-se à
transmissão de fatos puramente histórico, de doutrinas religiosas, de
acontecimentos de qualquer ordem, de idade em idade, e que sem qualquer prova
autentica se tem conservado de boca em boca, constituindo, porém, uma das bases
da história e da religião”
E prossegue aquele
autor:
“É por meio da
tradição que os grupos humanos transmitem suas crenças, suas ideias, seus
costumes, além de todas as conquistas artísticas, técnicas e cientificas. Desta
forma, a tradição é um fator de progresso, pois transmite uma herança de
cultura, que se renova através das gerações (...)“.
Observa-se, contudo,
nas consultas efetivadas, que a ideia central perpassada é a mesma, a tradição
é uma forma de perenizar conceitos, experiências e práticas entre as gerações, é
a transmissão do conhecimento; é a conservação dos costumes, dos hábitos, de
tudo o que no passado era observado. Os aspectos específicos da tradição devem
ser vistos em seus contextos próprios, enquanto forma de perenizar conceitos,
experiências e práticas entre as gerações. A tradição toma feições peculiares
em cada crença e grupamentos humanos.
Fica registrado,
então, que é por meio da Tradição que os grupos humanos mantêm seus costumes seus
hábitos, suas conquistas morais e sociais. A cultura maçônica adquirida é assim
mantida. A manutenção dos parâmetros estabelecidos em nossos “Rituais”, “Landmarks”
e “Antigos Deveres” é o que permite que a Maçonaria seja secular. Em resumo, o
termo Tradição significa Transmissão.
As crenças, as lendas
e os mitos, gostem ou não gostem alguns historiadores da Ordem, são formas de
transmissões orais, cujas personagens podem mudar segundo a geografia, padrão
social e a cultura de época, mas a componente moral permanecem e transmite-se
na consciência das gerações. Permito-me, nesse parágrafo complementar, sem
pretender me contradizer ou confundir o leitor, asseverar que a tradição não é
só regras, constituições, estatutos, rituais, e normas da Ordem, mas os usos e
costumes e simbolismo que neles se inserem e que regulam a vida dos maçons e
suas condutas atuais e futuras.
Trazendo esses
conceitos e argumentos para o interior da Ordem, podemos entender que a
tradição maçônica, não só diz respeito como se imagina, aos Landmarks,
Constituições de Anderson e aos antigos usos e costumes da Maçonaria Universal,
mas as Constituições em geral, regulamentos, regimentos, rituais, leis,
decretos e normas que se relacionam, principalmente, com matérias
ritualísticas. Também, se afigura como tradição, o farto simbolismo que permeia
em nossas Lojas, seus adornos e objetos de uso interno, e jóias e paramentos
que ilustram os maçons.
Neste particular, o símbolo, a lenda e o mito
permanecem como uma necessidade viva, por cujo instrumento se poderiam tornar
acessíveis as representações intelectuais do enunciado deste parágrafo e texto.
Daqui partindo,
professa Manoel Arão, que a maçonaria quis manter na sua simbologia, o
essencial da sua tradição e as regras gerais que são a base de seu ensino
filosófico e moral. Porque Ela sabe bem que, ao lado das coisas que evoluem que
mudam constantemente de direção, qual ampliam e se modificam, obedecendo a
critérios dos intérpretes e às correntes mentais que criam as doutrinas e as
escolas, há o princípio fixo e imutável que pode ser conhecido amanhã em outros
detalhes, ora ignorados, mas cuja base constituem a própria essência
inalterável e eterna que o homem consegue apreender e fixar. Estas razões
justificam o símbolo que resume e fixa e que já é inseparável da transmissão
dos conhecimentos e princípios maçônicos (Arão, História da Maçonaria no
Brasil: desde os tempos coloniais até nossos dias, Recife, 1926, p. 35).
As diversas Escolas do
Pensamento Maçônico (Autêntica, Antropológica, Mística e Ocultista) não se
omitiram no estudo das antigas tradições, lendas e mitos da Maçonaria, pelo
contrário, as tradições maçônicas foram dissecadas, reviradas, examinadas
minuciosamente analisados em face de registros documentais, e do muito, pouco
foi afastado pelos historiadores, estudiosos e defensores e propagandistas de
cada Escola. Em resumo, não puderam refutar documentos conhecidos como as “Old
Charges”, ou “Antigos Deveres” ou “Antigas Constituições” e nem outros
documentos e relatos, na defesa da busca de autenticidade.
Neste diapasão, resta
indicar, na conformidade do título, quais tradições maçônicas estão ou foram
esquecidas, ou para ser menos dramático, quais tradições estão ido para o
esquecimento pela própria descura maçônica. Impossível relacionar todas as
tradições maçônicas a que podemos nos referir neste espaço de leitura, mas uma
análise atenta dos documentos antigos e atuais da Ordem permitem que iniciemos
apresentando um elenco dos principais princípios (sem comentários) tradicionais
da Maçonaria Universal:
- Reconhecer o Grande
Arquiteto do Universo, como Força Superior, Princípio Criador, Causa Primeira
de Todas as Coisas;
- Admitir a Moral
Universal e a Lei Natural, ditadas pela razão e definidas pela Ciência que
obriga o Maçom a ser bom, sincero, modesto, honrado, generoso e caridoso;
- Admitir a
prevalência do Espírito sobre a Matéria;
- Ser Tolerante, não
combater ninguém por sua crença religiosa, reconhecer direito e liberdade
iguais a todas as religiões e cultos;
- Não discutir sobre
questões religiosas no recinto das Lojas;
- Não impor limites à
livre e constante investigação da verdade;
- Proclamar o sagrado
e inviolável direito de todo o indivíduo de pensar livremente e Ser livre
pensador;
- Reconhecer que os
homens – maçons e não-maçons – deve dirigir seus atos e sua vida exclusivamente
de acordo com a sua própria razão;
- Reconhecer que todos
os homens são livres, iguais entre si e irmãos;
- Combater e aniquilar
o obscurantismo, a hipocrisia, o fanatismo, a superstição e os preconceitos;
- Praticar as virtudes
domesticas e cívicas, na família, na sociedade;
- Respeitar as leis do
País;
- Ser absolutamente
fiel aos juramentos, deveres e princípios maçônicos;
- Reconhecer o
trabalho manual e intelectual como um deve essencial do homem;
- Proscrever
sistemática e terminantemente o recurso à força e à violência;
- Tornar feliz a
humanidade pelo aperfeiçoamento dos costumes.
Esses princípios podem
ser interpretados e escritos de várias formas, gerando controvérsias de
reconhecimento, mas são clausulas tidas como pétreas, portanto, não passiveis
de discussão. Alterá-los significaria romper a sintonia maçônica mundial. Neste
diapasão, a Tolerância, a Crença no Grande Arquiteto do Universo, a ideia maçônica
da perfectibilidade individual e social, e o trabalho pelo aperfeiçoamento dos
costumes são algumas das principais regras da maçonaria que estão sendo
relegadas a segundo ou terceiro planos.
No simbolismo, por seu
turno, há muitos termos, relatos, lendas e costumes, que muitos maçons
desconhecem, embora finja conhecer, e no caso, para não me alongar, destaco e
listo apenas doze (sem comentários), a saber: Arca da Aliança; Mar de Bronze;
Sanctum Sanctorum; o Silêncio Maçônico; os Banquetes Solsticiais e
Ritualísticos; a Taça Sagrada; a Cadeia de União; o Simbolismo das Velas; a
palavra Xibolete e os fundamentos históricos do grau de Companheiro; a
simbologia do pavimento de mosaico; do Delta Luminoso; e da corda de 81 nós.
Mas bem que poderia dizer da Abelha, artes liberais, crânio, cruz, hexagrama,
menorah, quadrado dentro de um círculo, quatro coroados, e etc e tal.
É aos maçons mais
antigos, aos maçons mais sábios, através de processos que assegurem a
continuidade de uma cadeia ininterrupta, a quem compete transmitir o
conhecimento, a sabedoria, a cultura, as lendas, os mistérios e impedir que as
tradições maçônicas se percam ou caiam no esquecimento, e para que a memória
das novas levas de maçons retenha o essencial a fim de que possa ser transmitido,
como uma herança.
A Maçonaria refere-se aos “Antigos Deveres” e aos “Landmarks“
da Fraternidade, especialmente quanto ao absoluto respeito das tradições
específicas da Ordem, essenciais à regularidade das Lojas e Maçons de cada
Jurisdição.
Na abertura dos
trabalhos do Rito Brasileiro desenvolve-se o seguinte diálogo entre o Venerável
Mestre é o Primeiro Diácono (Derly Halfeld Alves, Revelações maçônicas, Trolha,
2011, p. 79):
- Por que usa a
Maçonaria de Símbolos, 1º Diácono?
- Porque se origina
dos antigos mistérios, onde os Símbolos e as Alegorias eram a chave da ciência.
Conserva-os por tradição e para auxiliar a memória a reter os seus ensinamentos
pela impressão que causam ao espírito e aos sentidos.
A guisa de conclusão,
a nota triste e final é que leio em Wellington B. de Oliveira (Um conceito de
Maçonaria, Trolha, 1994, p. 24), a afirmativa de “que os Mestres... já não
merecem assim ser chamados, perderam o amor pela escola, já não ensinam, não
sabem o que ensinar. Não transmite confiança ou motivação, pois, a apatia tomou
conta de seus ânimos”.
Para os Mestres,
Companheiros e Aprendizes, este é um desafio que precisa ser superado, vencido,
derrotado, afastado das mentes dos maçons, para ceder lugar ao entendimento de
que, efetivamente, “Os Mestres merecem assim ser chamados e reverenciados,
por seu amor e dedicação pela escola e pelo conhecimento, pelo ensino e por
tudo que ensinam, por transmitirem confiança e motivação, pois, a alegria da
expansão do saber tomou conta de seus ânimos”.
Fica lançado o desafio:
aprender para ensinar e ensinar para aprender.
Postagem: www.unidosporbrasília.com.br –
23/06/2014 - LGR