A perfeição impõe ao
homem o controle total sobre a vida, não abrindo espaço à experiência, à
pesquisa e à livre criação. Ao negar-lhe qualquer possibilidade de erro,
este homem está se impedindo de aceitar a si mesmo e de buscar o
seu conhecimento interior.
O conceito de perfeição,
que a cultura ocidental considera como sinônimo de valor máximo em todas
as ordens foi exaltado por certa expressão histórica do cristianismo como
o mais sagrado dos imperativos para o gênero humano: ser perfeito como
Deus é perfeito.
Os que vivem tomados por
esta dinâmica acusam uma sensação constante de inadequação, sentindo-se
malfeitas e incapazes de aceitar os próprios erros.
Vivem na presença de
um juiz implacável. Descobrem-se desprovidos de
espontaneidade, necessitando funcionar com a precisão de um relógio
suíço, vivendo em função de normas, programas e certezas, como
se tudo fosse um laboratório.
A perfeição exige seres
frios emocionalmente, que se nutrem de desestima, de sentimentos de culpa
e de remorso todas as vezes que cometem um erro ou insucesso. Seus atos
têm a necessidade de ser aprovados pelo juiz interior e pelos outros.
O ideal de perfeição
exerce um controle sobre a nossa realidade, não havendo espaço para a
espontaneidade, impedindo a pesquisa, sondagens ou experiências e
aventuras.
Aceitar as próprias
limitações é aceitar a si mesmo, daquilo que se é realmente, sem
alienar-se de nada nem do passado nem do presente. Quem é dominado pela
ideia de ser perfeito funciona com uma espécie de “repelente”, mas ao
repelir-se quando erra, está errando porque se rejeita. A perfeição
predispõe a pessoa a tratar com antipatia tudo o que é imperfeito, sendo
muita baixa a sua tolerância com o que se afasta do perfeito.
Para ser feliz, o homem
deve aceitar-se tal como é. Nenhum outro animal, exceto o homem, dá-se ao
desprezo devido às próprias imperfeições. O conceito que temos de
perfeição nos faz elaborar conceitos, emoções e comportamento de tal modo
que poderemos ser vítima de uma psicologia da perfeição, exigindo que
o nosso sistema mental trabalhe de forma indefectível e infalível,
admitindo que o erro e o insucesso sejam inimigos da vida.
Mas é sabido que o erro é
a matéria-prima da vida, podendo surgir numerosos recursos, e oferece a
oportunidade de limar as asperezas de nossa conduta em relação a nós
mesmos e aos outros.
O verdadeiro sucesso está
em tirar proveito de nossas fraquezas, fazer um uso construtivo de nossos
erros. A perfeição caracteriza-se pelo excesso, na ansiedade de ir cada
vez mais para cima, sobressair-se, de estar por cima.
Se mudarmos o modo de
pensar poderemos alterar a nossa relação com este fardo de imperfeições
que carregamos.
Conhecer nosso limite
poderá consequentemente orientar o sistema mental de tal modo que as
reações emocionais e comportamentais em relação a nós mesmos, aos outros e
à vida em geral, se torne um exercício constante de adaptação à realidade,
proporcionando mudanças com qualidade.
Não temos como não
cometer erros, não ter defeitos, podemos, porém aprender a servir-nos
deles. O sistema mental coloca-se na condição de aceitar os próprios
defeitos. A perspectiva produz representações internas aptas à aceitação
de si.
A perspectiva do limite
reorienta a pessoa para aquilo que ela realmente é. Nessa reorientação não
sofremos uma limitação, ao contrário, aceitamos nossa própria realidade
limite. Nesse caso, aceitamos algo essencial: o próprio eu.
Autor: Jurandy
Cordeiro de Souza Júnior
*Baseado no primeiro
capítulo do livro Respeita os teus Limites – Fundamentos Filosóficos da
Terapia da Imperfeição, de Ricardo Peter (São Paulo, Paulus, 1999).