Alguns leitores têm manifestado alguma curiosidade sobre o que é
a Maçonaria. O que é? Quem a ela pertence? O que visa?
Achei interessante o desafio. Assim, não pretendendo maçar-vos
com textos extensos e pouco perceptíveis, vou “iniciar-vos” com algumas ideias
gerais. Dependendo do vosso interesse, “juro” que se seguirão outras crônicas.
Dado que é a primeira vez que me “revelo” Maçom para a minha
família de sangue, dedico-lhes estas palavras. Aqui vai, Vale de Cavalos. Ao
meu avô que vive no lado de lá, ao “Oriente Eterno”.
Começo por dizer que falo de Maçonaria, na visão que tenho dela.
Nenhum Maçom, a não ser que devidamente mandatado para tal, se assume como
porta-voz dos seus irmãos. É uma postura pessoal, como o são todas as posturas
dos maçons: livres, pessoais e intransmissíveis. Daí o “segredo” de que tanto
se fala.
Que mais não é do que a forma interiorizada, espiritualizada como
cada Maçom vive, a cada dia, a sua “iniciação” e o seu “aprendizado”. Da “pedra
bruta” que é quando, neófito, se entrega ao trabalhá-la, para o resto da sua
vida, numa linha contínua de aperfeiçoamento e melhoramento, até a “pedra
polida”.
Posso, como apaixonada por História, mencionar-vos o papel que
desempenhou na História do Mundo na implantação de uma comunidade que se rege
pelas máximas da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade (o lema adotado
pelos insurgentes durante a Revolução Francesa).
Posso como cidadã, esclarecer-vos que não se trata de uma
sociedade secreta, mas sigilosa ou discreta, dependendo da forma mais ou menos
livre com que cada Maçom assume (ou não) que o é. Tudo depende dos tempos. Em
liberdade ou em ditadura, assumir que se é Maço é já, de per si, um ato de
liberdade.
Digo-vos que nenhuma ditadura (muito menos o Estado Novo, já que
se comemora também Abril) foi complacente com os maçons, porque estes antagonizam
como livres-pensadores que são os poderes instituídos. O secretismo, esse está
e esteve sempre diretamente relacionado com a maior ou menor Liberdade em que o
país vive em cada momento da sua História.
A Maçonaria foi secreta quando perseguida pela Inquisição, por
Pina Manique ou durante o período que se opôs liberais a miguelistas. Voltou a
ser secreta quase cem anos depois com a ditadura do Estado Novo.
Foi “secreta” sempre que a Liberdade perigou. Posso como jurista,
dizer-vos que é uma ordem com regras próprias, a que apenas adere quem é
convidado por maçons que detém a qualidade de mestres e que apenas quem possui
tal “grau” se pode assumir como tal.
Posso como Maçom, confirmar-vos que não é uma religião, mas uma
ordem iniciática pautada por valores e princípios que transcendem a mera crença
num Deus, que, consoante a religião de cada Maçom ou até para os agnósticos e
ateus, acredita na existência de uma entidade superior, a que chamam o “Grande Arquiteto
do Universo”.
Posso, por fim, como co-fundadora da Academia de Estudos Laicos e
Republicanos (fundada por “sete” “Irmãos”), trocar impressões sobre o modo como
influenciou os destinos do nosso País, sobretudo num ano em que se comemora a
República: um sonho (também) de maçons. Nas vésperas de 1910, ser-se
republicano significava ser civicamente ativo e ser-se pela democracia de
opinião por oposição ao Estado centralizado na figura do rei.
Por isso, muitos republicanos eram maçons e outros tantos
carbonários (o “braço armado” do movimento republicano). A estrutura funcional
da Maçonaria de antanho era idêntica à de hoje, na forma de trabalhar. Em 1910,
a Maçonaria estruturava-se em “Lojas” e “Triângulos”, dispondo o Grande Oriente
Lusitano Unido de órgãos específicos com caráter legislativo, executivo,
judicial e ritual. Eram locais privilegiados de debate, contribuindo para que a
República fosse encarada como uma alternativa ao regime monárquico.
Discutiam temas de interesse nacional, focando-se no sistema de
ensino, na organização política e econômica do país, com enfoque nas matérias
de caráter social: a pobreza, o divórcio, os horários de trabalho, a
assistência médica pública, o movimento operário ou o analfabetismo.
Os maçons, tratando-se por “Irmãos”, possuíam uma estrutura
piramidal, tendo na base as “Lojas” azuis, incluindo os “graus” de “aprendizes”,
“companheiros” e “mestres”. Era na faixa litoral que se concentrava o maior
número de Lojas, onde o Porto, Coimbra e Leiria, possuíam uma atividade maçônica
significativa, mas era, sobretudo, Lisboa que projetava a politização nacional,
com reflexos diretos naquele que viria a ser um marco (outro) de LIBERDADE: o 5
de Outubro.
Anabela Melão
Fonte
https://noticiasdoribatejo.blogs.sapo.pt/
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