“O
ótimo é inimigo do bom” (Voltaire)
Era uma vez, em um Oriente distante, uma Loja gostosa.
Parafraseando o consultor americano Jim Collins, em
seu livro “Empresas feitas para vencer”, ousamos especular: não temos ótimas
Lojas, principalmente porque temos boas Lojas.
Não faltam críticas ao funcionamento de nossas
Oficinas, em especial no que se refere à gestão e qualificação dos obreiros. Um
questionamento recorrente é: vale a pena o desgaste pela exigência em relação
ao atingimento do “ótimo” e criar um clima onde nem o “bom” seja alcançado?
Alguns irmãos comentam que, conforme o contexto, a paz
é mais preciosa do que a perfeição. Outra corrente afirma que é melhor colocar
o sarrafo ou a régua bem no alto mirando algo desafiador do que se contentar
com a mediocridade. O tema é controverso, pois o que é bom para alguns não o é
para outros. Porém, o que fazemos de melhor pode sempre ser incrementado.
Sem sofisma, equívoco ou reserva mental que possam
criar obstáculos, combater o discurso pela busca da perfectibilidade não pode
ter como fim a acomodação e implantação da mediocridade. O foco deve sempre
ser: ainda podemos fazer muito mais! Desdenhar o planejamento e projeção
do futuro compromete a sobrevivência de qualquer forma de organização. O que
nos espera lá adiante não pode ser uma confirmação do atraso.
“Não
devemos ter medo das novas ideias! Elas podem significar a diferença entre o
triunfo e o fracasso.” (Napoleon Hill).
Em algumas Lojas, gestores com deficiência na
habilidade de liderança não permitem que obreiros se destaquem, principalmente
os mais jovens. Ainda que em menor número, alguns veteranos contaminados pela
síndrome do “esse cara sou eu”, ensejando uma pompa sabichona, têm dificuldades
em continuar a aprender e sair da zona de conforto, pois fazem o que fazem da
mesma maneira há anos e ainda gozam de relativo sucesso entre os pares.
Precisam de uma Loja para chamar de sua. E são felizes
nesse autoengano, em especial quando ouvem que são repositórios de grande saber
maçônico e festejados exemplos a serem seguidos. Possuindo um fraco por
elogios, e por vezes protagonizando momentos de fofura e disfarçada carência,
adoram afagos e sempre esboçam um sorriso brejeiro e uma falsa expressão de
encabulamento. Com descarada falsa modéstia, respondem aos elogios: menos,
menos!
Na realidade dinâmica, temos a concorrência de Lojas
que atraem bons candidatos por estarem acima da média e não se contentam com
pouco. Nelas, Aprendizes e Companheiros não são meros espectadores e têm suas
potencialidades exploradas. São Oficinas bem geridas, disciplinadas na
ritualística, ricas nas atividades e observam o cumprimento das regras. Em
geral têm belos projetos sociais e são respeitadas pela comunidade.
Como as notícias correm, e impedidos de chegar ao
ótimo individual, muitos iniciados recentes, talentosos e com vontade de se
desenvolverem, munidos de coragem e em busca de desafios, procuram outras
Oficinas com ambiente de aprendizado e de coisas boas para fazer, como acontece
frequentemente no mercado de trabalho. O pior é quando, desiludidos, abandonam
a Ordem, pois uma eventual propaganda negativa desmotiva a captação de
candidatos potenciais.
Temos conhecimento de situações em que novos irmãos
sugerem mudanças e são criticados por sonharem com melhorias, e sofrem do
descrédito daqueles que apenas desejam uma Loja gostosa de frequentar, com
sessões rápidas, tranquilas, sem muitos desafios e que, de preferência, não
abra espaço para debates, silenciando aqueles que tentam abespinhar os velhos
Mestres demandando reflexões mais profundas. Gestores dessas Lojas atuam no
sentido de que a dinâmica do poder não sofra ameaças e tudo permaneça sob o mais
absoluto controle e apatia.
Mesmo quando gestores mais modernos tentam alterar
o status quo, a reação da velha guarda é automática, alegando que sempre
foi assim e que administrações anteriores teriam sido mais exitosas,
constrangendo, vez por outra, o Venerável Mestre que se vê tolhido em suas
iniciativas, mesmo ao fazer das tripas coração.
Quase sempre, alguns rabugentos ao decantar feitos do
passado e o quanto fizeram pela Loja, ameaçam deixá-la, sair da maçonaria caso
alguma mudança seja implantada. Com falso pudor, reafirmam que é assim que
pensam etc. e tal. Posam de sábios e terminam a fala dizendo: “era o que
continha Venerável Mestre, desculpe a sinceridade!”.
Em seguida, sentam-se triunfantes. Impávido,
visivelmente controlando as emoções, o VM prossegue, e a Loja silenciada
caminha ligeira para encerrar a sessão e continua gostosa, como sói acontecer.
A dinâmica das sessões não sofre ameaças e tudo permanece sob o mais absoluto
controle.
Supimpa! Porém, caso fechem as portas, a comunidade a
que pertencem não sentirá a menor falta, cabendo aos obreiros procurar outras
Oficinas.
Mas, a história não termina aqui. Como toda moeda tem
dois lados, não poderíamos deixar de registrar a situação daqueles irmãos que
não conseguem acompanhar o ritmo das Lojas de alto desempenho e logo “vazam na
braquiara” (sic).
Segundo comentários na Sala dos Passos Perdidos,
partem à procura de uma Loja gostosa, preferencialmente aquela em que o
intervalo entre a Iniciação e a Exaltação seja o mais curto possível, que não
exija trabalhos e estudos, para se acomodarem à sombra das colunas e apenas
curtir o lado social da Maçonaria, o imprescindível companheirismo, sempre
regado com farta comilança.
Não raras vezes irmãos com esse perfil costumam levar
junto outros que já deram o que tinham que dar e que vivem a decantar feitos do
passado e exaltar suas próprias qualidades, e não se sentem à vontade junto às
novas gerações que entram com toda força e vigor. Parodiando Millôr Fernandes,
aqueles que veem a Maçonaria com um grande passado pela frente. Que sejam ambos
felizes, pois continuamos irmãos! Cabe ainda um lembrete muito importante:
sempre há vagas em Lojas gostosas.
Refletindo sobre a afirmação do físico dinamarquês
Niels Borh de que “fazer previsões é difícil, especialmente sobre o futuro”,
não podemos arregar e permitir que nossas Lojas sejam eternas devedoras de um
rol de seres especiais que resistem a mudanças, irreverentes, aferrados a uma
forma de pensar, de olhos fechados à evidência dos fatos e que sonham apenas em
desfrutar da companhia dos irmãos, reclamando por comendas, homenagens,
aplausos e mais aplausos, comprometendo seriamente a dinâmica das Lojas, que
seguem o destino traçado por Lewis Carroll no qual quanto mais Alice caminha,
mais longe fica do seu destino. No caso vertente, as Lojas andam para trás
mesmo. Não podemos descurar das tradições, do legado recebido e a entregar às
próximas gerações.
A
verdadeira dificuldade não está em aceitar ideias novas, mas escapar das
antigas (John Maynard Keynes).
Autor: Márcio dos Santos Gomes
*Márcio é Mestre Instalado da Loja Maçônica Águia
das Alterosas Nº 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte; Membro da
Academia Mineira Maçônica de Letras e da Academia Maçônica Virtual Brasileira
de Letras; Membro da Loja Maçônica de Pesquisas “Quatuor Coronati” Pedro Campos
de Miranda (BH); Membro Correspondente Fundador da ARLS Virtual Luz e
Conhecimento Nº 103 – GLEPA; Membro Correspondente da ARLS Virtual Lux in
Tenebris Nº 47 – GLOMARON; Membro Correspondente da Academia Maçônica de Letras
de Piracicaba (SP); Membro Correspondente da Academia Internacional de Maçons
Imortais; e, colaborador do Blog “O Ponto Dentro do Círculo”.
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