Para compreendermos a Maçonaria precisamos
contemplar suas raízes históricas e princípios fundadores. Talvez, o primeiro
passo seja diferenciarmos as abordagens fantasiosas e acríticas das fontes
históricas verídicas. Nesta nobre revista eu dissertei sobre duas origens
lendárias da Maçonaria: Os Segredos do Templo de Salomão – Primórdios da
Maçonaria Lendária e Os Segredos da Capela Rosslyn – Os Cavaleiros Templários e
Maçonaria. Trata-se de duas versões lendárias, ou seja, sem qualquer prova
documental que as sustente enquanto verdade.
Talvez o melhor conhecimento histórico possa
ser adquirido quando nos voltarmos para os primeiros membros da Ordem. Como
sabemos a maçonaria tem origem em corporações de ofício medievais, compostas
por trabalhadores especializados na arte da construção. Devido à natureza
itinerante de sua atividade, eles não se prendiam a nenhum feudo, tendo o
privilégio da livre circulação. Com isso, surge a expressão “pedreiros-livres”.
Só a partir do século XVI, a Maçonaria passa a
admitir membros de outras classes de trabalhadores. E é nesta fronteira entre a
Maçonaria operativa e especulativa que temos as primeiras provas documentais da
Ordem. A primeira atividade da Maçonaria especulativa de que temos notícia
aconteceu na Inglaterra em meados do século XVII. Encontramos registros da
iniciação de dois maçons especulativos: Sir Robert Moray e Elias Ashmole em
1641 e 1646 respectivamente.
A aproximação intelectual Ashmole e Moray com o
Iluminismo nos proporciona informações interessantes sobre a natureza
primordial da Maçonaria. Ambos foram fundadores da Royal Society de Londres,
instituição fundada em 28 de novembro de 1660 por um grupo de doze estudiosos
que incluía, além dos maçons aqui citados, o arquiteto Christopher Wren, o
cientista Robert Boyle e John Wilkins, inventor do sistema métrico. Também
estão ali os estudos do também maçom Benjamin Franklin sobre tempestades
elétricas que datam de 1752 além das notas de Edward Stone, de 1763, sobre o
uso da casca de salgueiro para tratar febre, que documentam o começo do
descobrimento do ácido acetil salicílico e a produção da aspirina, hoje um dos
medicamentos mais usados em todo o mundo.
Como podemos perceber a Maçonaria
operativa sofria um processo de transformação lento e gradual atraindo para seu
seio não só mestres do ofício da construção, mas também nobres, cientistas e
profissionais liberais. A relação íntima da mais antiga academia científica do
mundo e a Maçonaria enobrece nossa origem.
Se neste período os documentos ainda não nos
permitem traçar muitas considerações o ano de 1717 abre o campo das
certezas.
Foi neste ano durante as festas de São João
Batista que quatro lojas maçônicas encontram-se na Taverna Goose and Gridiron
(O Ganso e a Grelha), na praça da Igreja de São Paulo, em Londres, e formam a
primeira Grande Loja. Infelizmente, o edifício que abrigava a taverna foi
demolido no final do século XIX, embora seu emblema tenha sobrevivido .
Foi neste ano que surgiu a primeira organização
maçônica pública e formalmente reconhecida: A Grande Loja de Londres. Em 1723,
seis anos depois, o ministro presbiteriano escocês Dr. James Anderson, publicou
as Constituições da Maçonaria. É neste documento que estão dois baluartes da
Maçonaria: a proibição de temas políticos e sectário-religiosos no interior das
lojas e a exigência dos membros possuírem a crença num Ser Supremo.
Em pouco mais de trinta anos a Ordem Maçônica
estava presente em quase todos os países da Europa Ocidental e nas principais
colônias americanas e asiáticas. Podemos afirmar sem sombra de dúvidas que já
no princípio do século XIX a Maçonaria tornou-se uma instituição global
participando ativamente de acontecimentos políticos, intelectuais e sociais.
Com este artigo espero ter evidenciado que
nossa origem histórica é tão fascinante quanto nossa suposta e improvável
origem lendária. Apesar de não existir qualquer documento que ligue nossa
gênese ao Templo de Salomão ou aos Templários temos nas corporações de ofício
medievais e sua incorporação de intelectuais ligados a Royal Society um nobre
nascimento.