O processo de tomada
de decisão em Loja não tem necessariamente os mesmos trâmites e parâmetros da
vida de relação em sociedade.
Claro que, quando a
decisão a tomar se prende com uma eleição, as regras são as mesmas de uma
sociedade democrática: um homem, um voto, voto secreto e é eleito quem tem mais
votos. Mas, por exemplo, a admissão de um novo membro, também objeto de uma
votação por voto secreto, não está sujeita à regra da maioria, antes de uma
tendencial unanimidade. E digo tendencial, porque, em algumas Lojas, a
existência de um ou dois votos contrários deve ser justificada, para se
atribuir validade impeditiva da admissão do elemento sob escrutínio.
Mas a grande maioria
das decisões não se toma por voto secreto, antes na sequência de debates
abertos, em que cada um manifesta livremente a sua opinião. Procura-se, se
possível, atingir um consenso. Mas, se não for possível, não é propriamente uma
decisão por maioria que indica o caminho a tomar. Isto causará porventura
perplexidade, nos dias de hoje, habituados como estamos a que a maioria decida
e ponto final.
No entanto, o fato de
uma maioria se inclinar para uma determinada opção não quer dizer
necessariamente que essa posição é a correta. Nada nos assegura que não ocorre
simplesmente uma situação em que se formou uma maioria de errados! Uma coisa é
a maioria, a legitimidade conferida pela maioria, outra é o acerto.
Na sociedade,
confiamos, em regra, que a maioria erre menos vezes que a minoria.
Mas, ao
menos, quando o erro acontece, aceitamos as consequências desse erro,
procurando consolar-nos com o pensamento de que, se errou, ao menos foi a
maioria que errou. Esquecemo-nos, ou fazemos por esquecer, que a tomada de
decisão por maioria é vulnerável à demagogia, à ignorância, ao facilitismo.
Não querem estas
palavras dizer que a Maçonaria recusa ou não defende os princípios
democráticos. O passado da Maçonaria é bem demonstrativo de que esta preserva e
luta por eles. Simplesmente, como um dia disse Winston Churchill, “a Democracia
é o pior de todos os sistemas… exceto todos os outros!!!”. A Democracia não é
perfeita, mas, para uma sociedade ou grandes grupos, não há melhor sistema de
decisão.
A Maçonaria, porém,
funciona normalmente em grupos de dimensão reduzida ou média, em que todos os
elementos se conhecem uns aos outros. Consegue assim manter uma dimensão
personalizada de contatos entre os seus membros, que permite combinar as
regras democráticas com regras tradicionais, que eu me atrevo a classificar de
regras de bom-senso. É através desta amálgama que se procura chegar às melhores
decisões possíveis, sem deixar de ter consciência de que é completamente
impossível excluir de todo a possibilidade de erro.
Para melhor se
compreender como funciona o processo decisório em Maçonaria, deve ter-se
presente que a Maçonaria Especulativa tem as suas raízes na Maçonaria Operativa
dos construtores em pedra e respectivas Lojas de regulação do exercício da
profissão e que a Maçonaria procura preservar, tanto quanto possível, a
tradição que cada um recebeu dos seus antecessores.
Na Maçonaria
Operativa, a Loja não era um espaço democrático. A Loja era dirigida pelo
Mestre, que dirigia o trabalho, admitia e dirigia a aprendizagem dos Aprendizes
e supervisionava o trabalho dos oficiais construtores (Companheiros). Em Loja,
executava-se o que o Mestre dizia. Ponto final.
Este elemento de
autoridade benigna, obviamente temperado pelas regras da democracia, permanece
importante no processo de decisão em Loja.
Como se articulam
então estes dois elementos aparentemente contraditórios? Conferindo-se
legitimidade democrática a quem dirige a Loja!
Temos então que o
processo de decisão em Loja resulta de se conferir poder autocrático a quem se
elege democraticamente para tal, por um período determinado.
Traduzindo: o
Venerável Mestre é democraticamente eleito, por voto secreto, para cumprir um
mandato de duração determinada; durante esse período, a Loja e todos os seus
elementos delegam o direito de decidir sobre quaisquer assuntos que respeitem à
Loja no Venerável Mestre em funções.
Daqui resulta que o objetivo
de um debate em Loja não é vencer a discussão ou arregimentar maioria. O objetivo
que cada um prossegue num debate em Loja é contribuir com a sua informação, com
a sua análise, com a sua opinião, para fornecer o máximo de elementos
relevantes possível para permitir ao Venerável Mestre tomar a melhor decisão
possível, decisão esta que é assumida como a decisão da Loja.
Assim, cada debate
consiste em uma intervenção, no máximo duas, por cada Mestre que deseje
intervir sobre o assunto. Cada um deve procurar dar a sua opinião tão
fundamentadamente quanto possível. No final, um oficial da Loja, o Orador,
extrai as conclusões do debate, isto é, resumem as posições expostas, os
argumentos apresentados, podendo ou não opinar sobre se existiu consenso ou
sobre a decisão que aconselha seja tomada. Finalmente, o Venerável Mestre
decide e a sua decisão vincula a Loja.
Nenhum maçom é
obrigado a executar a decisão, mas nenhum maçom. a pode violar. Isto é, pode
omitir o seu cumprimento (primado da liberdade individual), mas não pode ir
CONTRA o decidido.
Com este método de
decisão, procura-se limitar o erro com apelo ao bom-senso, sem esquecer a
democracia.
Esta está presente na
escolha democrática daquele a quem é delegado o poder de decidir. Aquele
decorre de o Venerável Mestre ouvir antes de decidir, ser aconselhado sobre a
decisão a tomar antes de fazê-lo e, finalmente, saber que, se pode exigir que
ninguém a desrespeite, só a valia e o acerto desta lhe garantem a execução dela
(porque voluntária).
De tudo isto resulta,
obviamente, por um lado que a margem de decisão do Venerável Mestre é mais
reduzida do que aparenta. Não vale a pena o Venerável Mestre decidir branco se
a generalidade dos obreiros opinou preto: ninguém executará o que não concorda.
Havendo divisão de
opiniões, ou é possível retirar das posições expostas o denominador comum exequível
e então deverá ser esse o caminho por que se opta (pois é aquele que mais
elementos executarão, senão total, ao menos parcialmente), ou não é, e então o
Venerável Mestre optará segundo o seu prudente arbítrio. E considera-se que é a
melhor forma, porque não há vencedores nem vencidos.
Há a decisão tomada, o
melhor possível, por alguém a quem se confiou a missão de tomar decisões,
sempre que necessário. E, por essa legitimidade, será executada, porventura até
por aqueles que dela discordem…
Não será um método de
decisão perfeito. Mas seguramente procura evitar o erro e promover a harmonia e
não nos temos dado mal com ele…
In Blog “A Partir Pedra” – texto de Rui
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