Não Creiais em coisa alguma pelo fato de vos mostrarem o
testemunho de algum sábio antigo; Não Creiais em coisa alguma com base na
autoridade de mestres e sacerdotes; Aquilo, Porém, que se enquadrar na vossa
razão, e depois de minucioso estudo for confirmado pela vossa experiência,
conduzindo ao vosso próprio bem e ao de todas as outras coisa vivas: A Isso,
aceitai como verdade; Por Isso, pautai vossa conduta! Çakia Muni
(Bhuda)
Sou um maçom repleto de grandes dúvidas existenciais. Em relação
às religiões, filosofia, história e à própria doutrina maçônica, o meu
pensamento é livre de quaisquer dogmas ou tendências.
Mas mesmo assim procuro... Procuro e nem sempre acho as
explicações que necessito. Sempre me imponho inúmeras objeções, produzo muitas
perguntas tentando provar o contrário, até exaurir todas as possibilidades,
reviro uma teoria ao avesso, não aceitando o que não passar pelo meu cuidadoso
crivo intelectual, e pela experiência vivida.
Prefiro as várias verdades, misturando-se as doutrinas e
usufruir exaurindo tudo o que interessa já que a Ordem permite pelo ecletismo
que isto aconteça, me detendo especialmente nas incongruências, nos paradoxos,
nas contradições e na relatividade geral de tudo que me cerca. Sou muito mais
documental que místico.
Como vivo num mundo complexo e estranho, não aceito explicações
simples, a não ser que realmente sejam simples quando sabemos que na maioria
das vezes, as explicações são de fachada para se explicar algo que não se tenha
explicação transparente e coerente.
Não sou fanático por coisa alguma. Tenho mais perguntas a fazer
que respostas a dar.
Moro num país de contradições, no qual a República foi
proclamada por um marechal, maçom e monarquista, e que estava doente, onde até
hoje existem muitas mentiras e muitas meias verdades.
Sobram poucas verdades puras. E esta República até a presente
data não se assumiu como tal, pois ainda existe o privilégio de cor, raça,
sexo, latifúndio e o poder sempre está nas mãos de uns poucos onde grassa a
corrupção a violência e outros males que tanto intimidam os bons
cidadãos.
Isto não se enquadra na "republica" idealizada por
Cícero e tão sonhada pelo grupo de idealistas republicanos de 1870.
Adepto da democracia, da igualdade total dos cidadãos em deveres
e direitos. Assim também atuo na Ordem. Por isso, não aceito a acusasse que
como sabemos são decisões contaminadas por absolutismo intolerante, por sinal
muito usado pelos chefes das Potências em função da "síndrome do
poder" que, infelizmente costuma contaminar a maioria dos mandatários da
Maçonaria brasileira.
No passado do meu presente, tenho saudades de um tempo que não
vivi, aquele do "maçom livre em loja livre" onde era eleito venerável
o homem melhor, mais sábio, e o mais competente do grêmio. Que pena que acabou
esta linda fase da Maçonaria. Naquele tempo os maçons eram mais felizes.
Sou um teísta que crê na imortalidade da alma, e que às vezes
tem uma compulsão para ser um deísta, tendo repentes de pensamento num Deus
mais racionalista, porém, acabo sempre me socorrendo no meu Deus pessoal, mas,
paro por aí. Prefiro acertar minhas dúvidas e súplicas espirituais diretamente
com o Grande Arquiteto do Universo, sem necessariamente apelar a ele através
dos intermediários, criados pela mente humana através das religiões, já que
estas iludem o homem com promessas impossíveis, atendendo-os de forma enganosa
e manipulada, justamente usando o seu desamparo e medo da eternidade.
Aceito os chamados Livros Sagrados religiosos como códigos de
moral de um povo monoteísta ou politeísta e não como sendo atribuídos às
Divindades, ditados aos homens conforme as religiões fazem com que a maior
parte da humanidade acredite. E esta minha postura é tranqüila e está voltada
também com todo o respeito e consideração aos que pensam diferente de mim.
Afinal, porque se fala tanto no número dois, número dos opostos, o número da
Dialética?
Gosto de lutar contra falsos mitos. Sofro muito na Ordem por
causa desta tendência.
Muito embora acredite que este seja o meu perfil mental e
intelectual, ainda que suspeito por tentar fazer uma auto-análise, confesso que
sou um sonhador. Sonho com o futuro projeto-me no porvir, imaginando como será
a Maçonaria, quando cairão por terra, muitas bobagens que atualmente somos
todos obrigados a fingir que as estamos aceitando.
Acredito no Homem bom, acredito no futuro da Humanidade. Isto
significa que acredito nos maçons bons e eles sempre existirão para compensar
as nulidades que ora existem na Ordem.
Tenho um ideal superior, o qual foi forjado por mim como uma
busca incansável do meu aprimoramento e autoconhecimento.
Enquanto eu peregrino lentamente por esta vida em direção a esta
meta estão se apresentando inúmeras situações, todas elas importantes nas quais
eu posso fazer descobertas maravilhosas.
Entendi que não posso desprezar uma partícula por menor que
seja, um detalhe mínimo sequer para eu conseguir o que me proponho. Estou
escapando aos poucos do cartesianismo e me envolvendo placidamente na aplicação
humana, não subatômica, da Teoria dos quanta e da Relatividade.
Se eu tomar a Maçonaria como um todo, ela é complexa demais.
Existem todas as matizes de idéias, de pensamento, de situações, enfim, uma
parafernália total. É fácil um maçom se confundir neste marasmo intelectual, e
se perder na sua busca interior.
Entendi que a Ordem não passa de uma escola, uma imensa sala de
aula de vida, onde eu terei que extrair para mim mesmo, a essência de todos
estes ensinamentos. Tenho que separar com muito cuidado o que há de bom. O
longo caminho que estou percorrendo tem nuanças interessantes.
Algumas vezes os passos que terei que dar serão fáceis e
rápidos, outras vezes serão difíceis e espinhosos. As experiências vividas, ou
a lições recebidas serão os degraus da minha Escada de Jacó. É uma escada de uma
subida infinita. São milhões, o número de degraus a serem escalados.
Aprendemos mais nos nossos erros que nos acertos.
Não posso me deixar trair por sofismas, por falsas verdades por
falsos ídolos. É um caminho de humildade interior a ser seguido.
Não sei exprimi-lo com palavras. Tudo tem que ser enquadrado
meticulosamente. Há uma necessidade frontal de auto superação.
Sempre terei que estabelecer um desafio, mesmo quando tenha
conseguido superar o último de maneira vitoriosa.
Não posso ser presunçoso, porque serei um fracassado. O caminho
do auto-conhecimento não tem fim.
Uma das características do cérebro humano é que ele funciona
através de padrões de comportamento. Como na Maçonaria eu poderei estabelecer
relação com um paradigma? Se cada adepto tem uma concepção, uma verdade, uma
interpretação. Poucos falam a mesma linguagem. Será que existem tais padrões?
Acho que a Ordem quer, é isso mesmo. Que cada um descubra o seu
próprio modelo e dentro do respeito à forma de pensar e agir de seu Irmão, e
estabeleça o seu jeito próprio de ser maçom, ou seja, terei que ser o protótipo
de mim mesmo. É uma luta muito árida e árdua. Eu não devo basear-me em ninguém.
Somente eu e o mundo. Eu e o infinito.
Poderão ocorrer identidades ou coincidências de idéias e
pensamentos ou forma de raciocinar com alguns poucos Irmãos. Serão meras
semelhanças paralelas, mas de qualquer forma serão os nossos quase iguais. Por
esta razão a Maçonaria, quando sentida, quando vivificada, ela fala muito perto
por dentro de cada um. Cada qual fará a sua própria Maçonaria.
Entretanto não posso esquecer que o homem é um ser vulnerável e
vicissitudinário. Ele é fraco e muda muito porque sempre está em crise, mas se
mudar que o faça sempre para melhor, nunca para pior. Esta é a grande dúvida,
saber, sentir e conhecer a diferença, eis a superação. Esta é a grande
diferença.
Sei que sou imperfeito, grito no escuro querendo me conhecer
mais, mas o eco não responde. Onde está o meu duplo Eu? Onde está a minha dupla
consciência? Quem sou realmente?
Sei que não sei. Porém o que aprendo é o meu legado o qual eu
posso dividir sempre com o meu Irmão, se ele assim o quiser.
A Maçonaria é individualista? Claro que é. Os maçons não são
iguais. Não existe ninguém igual a alguém. Todos são completamente diferentes.
Então qual seria o ponto de aproximação?
A Iniciação? Nem ela mesma torna os Irmãos iguais. Ela terá a
ritualística igual para todos, mas a psique, de cada um terá uma maneira
diferente de receber as mensagens iniciáticas, de acordo com o seu universo
simbólico e sua sensibilidade. Então porque ainda subsiste a Ordem? Não sei.
Seria porque ela é mágica? Até hoje não sei o que é Magia. Aos que acreditarem
em destino, poderia se argumentar que o Grande Arquiteto assim o determinou e
estaria explicado. Mas, não para mim. É uma explicação muito simplista, não
convence.
Será que os símbolos, cujos poderes imensos os maçons nem sabem avaliá-los,
os responsáveis pela perpetuação da Ordem?
Seria a falsa ilusão dos graus superiores? Seria o status de ser
maçom?
Há um mistério e um segredo, que não sei revelá-los não sei decifrá-los,
porem a Ordem continua de pé. Talvez, o desafio desta busca incessante, seja a
chama que me mantém perguntando, pesquisando e estudando. Mas quem me responderá?
Algum Mestre Superior? Não, ninguém responderá. A resposta está dentro de mim
mesmo. Eu terei que procurá-la. Sei que o esforço será muito grande, mas as
respostas sempre estarão dentro de cada um.
E sempre repleto de dúvidas continuarei gritando no espaço,
mesmo que ninguém ouça: Quero Ser um Livre pensador.
Ir∴ Hercule Spoladore
Hercule Spoladore, escritor, historiador e maçom brasileiro.
Loja de Pesquisas Maçônicas Brasil e Membro Correspondente da Loja Francisco
Xavier Ferreira de Pesquisas Maçônicas, de São Paulo (fonte: Samaúma).
Fonte: JBNews - Informativo Nr. 0167 - 10/02/2011