Grande Arquiteto do Universo (GADU), é o Termo utilizado pelos maçons para
designar a Divindade Suprema. Este termo é um conceito criado pelos maçons
espiritualistas do século XVIII, que fizeram a transposição da Maçonaria
operativa para a especulativa [1].
Isto significa enxergar Deus como uma Entidade que “pensa” o universo e
entrega a sua construção para anjos e homens como seus delegados.
Desta forma, os anjos são os mestres (chamados demiurgos) e os homens são
os operários (obreiros). Esta é uma concepção derivada dos ensinamentos da
Cabala e da Gnose cristã, e foi introduzida na Maçonaria pelos chamados
“pensadores rosa-cruciamos”, que em fins do século XVII ingressaram na Ordem
como “maçons aceites” [2].
Este conceito integra a noção de Deus como autor do universo (Supremo
Arquiteto) e as tradições dos antigos construtores medievais, que viam nas
igrejas por eles construídas verdadeiras réplicas do cosmo [3]. Esta
concepção também está fundamentada na Bíblia, através da construção do Templo
de Salomão, que segundo os maçons medievais, teria sido construído com
instruções ditadas por Deus ao rei Salomão e o seu arquiteto Hiram Abiff. Esta
sabedoria secreta, conhecida somente por Salomão, Hiram e Adonhiram
(encarregado das obras), estaria contida na geometria, nos símbolos, nos
adereços e nas formas arquiteturais daquele Templo [4].
Além da sabedoria secreta contida na Arquitetura, haveria também um outro
segredo que o GADU segredou somente à Moisés. Este segredo destinar-se-ia à
construção de uma sociedade perfeita (O reino de Deus na terra, que seria a
nação de Israel) e ao aperfeiçoamento do carácter do homem, para que este
pudesse recuperar o estado de perfeição que possuía antes da queda.
Esta sabedoria estaria contida nos cinco livros da Torá, de forma
camuflada em nomes, acontecimentos, números e parábolas [5].
Moisés escreveu as leis e os mandamentos que o povo deveria seguir, mas o
verdadeiro significado daqueles mandamentos e dos rituais que ele prescreveu ao
povo de Israel, constitui uma sabedoria secreta que ele transmitiu de forma
oral aos mestres de Israel [6].
Mais tarde, os sábios de Israel a desenvolveram nos ensinamentos da Cabala
e nos comentários do Talmude. Os filósofos do cristianismo místico a
completaram com os ensinamentos de Jesus, e como resultado dessa interação nós
temos hoje a doutrina conhecida como Gnose [7].
Segundo a tradição esotérica, a Cabala teria sido instituída pelo GADU
como forma de comunicação entre os anjos. Era, portanto, uma espécie de
linguagem utilizada pela primeira criação divina, antes mesmo Dele pensar em
criar a humanidade.
Segundo os ensinamentos da Cabala, antes de Deus fazer o homem, os anjos
formavam uma espécie de Irmandade, ou escola teosófica, sediada no Éden,
chamada Fraternidade dos Elohins. Depois da queda, alguns desses anjos a
ensinaram aos homens para que estes pudessem interpretar a linguagem divina e
conhecer a verdadeira vontade de Deus, e assim poder voltar, um dia, ao estado
de beatitude e perfeição que possuíam antes da queda [8].
Somente alguns poucos homens, em cada geração, receberam este
conhecimento. Entre eles, Adão e seu filho Seth, que a passaram aos seus
descendentes Enoque, Noé e Abraão. Esta lenda é desenvolvida na Maçonaria dos
graus superiores como representação pictórica e simbólica da transmissão da
sabedoria aos homens. Na verdade, trata-se da explicação de como o processo de
aquisição da consciência por parte do ser humano aconteceu, e como ele se
desenvolveu ao longo do tempo. É uma alegoria de profundo conteúdo esotérico,
mas que também se apoia em trabalhos científicos de muito respeito [9].
João Anatalino Rodrigues
Do livro “Construtores do Universo”
Notas
[1] Maçonaria operativa é aquela formada pelos pedreiros medievais.
Eles formavam guildas, ou associações que mantinham em segredo os seus
conhecimentos e só os transmitiam de forma muito restrita, e mesmo assim,
através de uma linguagem só conhecida pelos iniciados.
Maçonaria especulativa são as associações que se formaram em fins do
século XVII, pela admissão, entre os pedreiros, dos chamados “maçons aceitos”,
ou seja, pessoas não ligadas ao ofício da construção.
[2] Os “maçons aceitos” eram principalmente filósofos e alquimistas,
perseguidos pela Igreja em razão da Reforma Protestante e a Inquisição.
[3] A este respeito veja-se Fulcanelli, O Mistério das Catedrais, Ed.
Esfinge, Lisboa, 1968
[4] Estas prescrições estão na Bíblia, nas instruções dadas a Moisés
para a construção do Tabernáculo, tenda usada pelos israelitas como santuário,
antes da construção do Templo de Jerusalém. Com respeito à doutrina secreta
contida na Bíblia, veja-se Northrop Frye – O Código dos Códigos – Ed Boitempo,
2004
[5] No alfabeto hebraico, cada palavra deve ser combinada com o seu
número para dar o seu significado exato. O nome Jesus (Yeshua), por exemplo,
equivale ao número 888, número considerado perfeito pela tradição cabalística.
[6] Os Dez Mandamentos e todas as prescrições e relatos contidos nos
cinco livros de Moisés, conhecido como Pentateuco. (Génesis, Êxodo, Números,
Levítico e Deuteronômio).
[7] Gnose quer dizer iluminação, ou seja, a conquista da salvação
pelo conhecimento das verdades divinas.
[8] A queda é descrita na Bíblia como expulsão do casal humano do
Éden. Segundo a doutrina da teosofia, antes da queda, homens e anjos viviam em
harmonia, e havia uma intensa interação entre as duas espécies. A razão da
queda foi a ambição humana de se apropriar do conhecimento secreto, e a
disposição de alguns anjos (Elohins) de transmiti-lo ao homem.
Este acontecimento é descrito na Bíblia, através da metáfora da serpente
que seduz Eva para que coma a maçã, e depois a ofereça à Adão. Esta metáfora,
na verdade, relaciona-se com o despertar da consciência humana (primeiro
ocorrida na mulher em razão da sua capacidade de gestação). A este respeito,
ver as obras de Helena P. Blavatsky, Isis Sem Véu e Doutrina Secreta- Ed.
Pensamento, 1987 e 1989.
[9] Estas teses são defendidas em vários estudos científicos, entre
os quais podemos destacar os trabalhos do antropólogo alemão Bachoffen (O
matriacarlismo e o patriarcalismo, Alemanha-1929) e o psicanalista austríaco
Carl Gustav Jung nos seus estudos sobre os arquétipos que influenciam o
inconsciente coletivo da humanidade. Sobre a relação deste tema com a
arquitetura veja-se o interessante estudo de Alex Horne, O Templo de Salomão na
Tradição Maçônica (Ed. Pensamento, 1988).