Era uma vez, um maçom muito austero consigo mesmo,
dedicado à causa da Arte Real, não perdia um momento do seu tempo que não fosse
para debruçar-se sobre os livros maçônicos e sugar-lhe a seiva do conhecimento
impresso em suas páginas, procurando compensar o tempo perdido, pois fora
iniciado já em idade provecta.
A presença dele em loja era um terror, abusava da
sua idade para exercer o poder de crítica em todos os trabalhos que comparecia
e assim ditar cátedra aos mais novos, afinal o seu acervo de conhecimentos,
“pensava ele”, dava-lhe esse direito.
Até que um dia, após ter comparecido a uma sessão
magna, onde foram iniciados três novos obreiros, no desenrolar da cerimônia,
ele não perdeu oportunidade, ficava atento para observar a mínima falha na
ritualística cometida pela equipe de trabalho para chamar à atenção do
Venerável Mestre, e exigia a correção de pronto, naturalmente o que em muito
atrapalhava a cerimônia iniciática, pois nesse momento, a sessão era
interrompida, dava-se a retirada dos iniciandos, para que ele desse a sua
interpretação e exigia que a correção fosse feita.
O Venerável Mestre, a contra gosto, em respeito aos
cabelos brancos do irmão, e não querendo ser agressivo, aceitava as investidas
do importunador. Ao término da sessão, nas manifestações dos irmãos, ele se fez
ouvir, e numa linguagem imprópria e ácida para um maçom, chamou a atenção do
irmão experto e dos auxiliares pelo deslizes por ele observado, ocorridos
durante o cerimonial iniciático.
Após a sua manifestação, que ao seu julgamento,
fora irrepreensível sob todas as formas, pois se considerava um alto conhecedor
da filosofia e dos mistérios da nobre arte dos edificadores do templo.
Satisfeito, deixou a companhia dos irmãos, recusou o convite para participar da
ágape, onde estariam reunidos todos os irmãos da Loja com seus familiares.
Assim, despediu-se dos demais, e dirigiu-se para a
sua residência. No caminho dizia para si mesmo: “... fui ótimo, dei mais uma
lição àqueles maçons que não estudam, além do que, não sabem trabalhar com a
ritualística; a ignorância com que tratam as coisas sagradas da maçonaria é um
despautério despropositado”...
O interessante é que não comentava a sessão como um
todo, em tudo aquilo que fora realizado com esmero e prontidão, embelezando a
sessão iniciática, sem uma observação sequer. Após ter percorrido alguns
quilômetros, viu-se diante da sua residência, estacionou o seu veiculo, e
dirigiu-se para a porta com a chave na mão, abriu-a e entrou, fechou a porta,
parou a um passo e sorridente olhou para o interior, viu a sua companheira que
se aproximava para cumprimentá-lo.
Entre eles estabeleceu-se o seguinte diálogo. -
Então, como foi a sessão? - Como todas as outras que tenho comparecido, sempre
sou obrigado a intervir de quando em quando, para corrigir as falhas gritantes
que aqueles maçons despreparados cometem.
- Naturalmente, sou alvo de admiração dos
presentes, pelo grande conhecimento ritualístico que possuo. - Interrompo a
todo instante, para exigir a pronta correção, afinal, eu sou colado no grau
trinta e três, o que me dá a condição de ser um Inspetor da Ordem, e me cobre
com a autoridade necessária.
- E...? Como os demais maçons recebem as
interrupções? Você não se torna inoportuno com essas atitudes?
- Não! Exasperado, grita: - Esse fato não lhe diz
respeito! Assim foi interrompido o dialogo entre marido e esposa. Ela
constrangida, afastou-se, deixando o marido a sós, com o seu azedume.
Assim que ela se afastou, já recomposto, disse pára
si próprio: enfim poderei desfrutar alguns minutos de satisfação, ou talvez
horas em completo silêncio e aproveitar para estudar mais e fazer uma reflexão
sobre s minha atuação de hoje e verificar se não deixei passar alguma
incongruência durante a cerimônia.
Dirigiu-se à sala de estudos sentou-se na sua cadeira
predileta tendo antes tomado na estante um livro maçônico, intitulado “A
TOLERÂNCIA E HUMILDADE DO MAÇOM”.
Abriu em suas páginas iniciais, e posse a ler. Já
de início, discordou do autor, quando no prefácio observou os elogios feitos
pelo apresentador da obra, classificando-o como “maçom erudito”, inteligente e
ícone da maçonaria.
- Que blasfêmia! Classificar esse autor como ícone
da maçonaria!!
- Se ele é um ícone, então como serei reconhecido
entre os meus pares? - Com a bagagem maçônica que possuo se até agora não
escrevi nada não é opor falta de conhecimento ou capacidade e sim por falta de
tempo.
- Gostaria que neste momento, estivesse algum irmão
aqui em casa para poder ensinar-lhe o verdadeiro sentido da maçonaria.
- Como eu poderia ser útil a quem quisesse
escutar-me, e deixar-me derramar a luz sobre esses inúmeros irmãos que só sabem
martelar sem entender o significado esotérico dessa respeitável atitude
maçônica.
Arrogantemente, especulava mentalmente, tendo
cerrado os olhos fazia seus vôos condoreiros deixando para trás a racionalidade
dos efeitos de um perfeito maçom, seguro de sua pequenez, não ele.
Julgava a si próprio, e valorava-se de tal forma,
que parecia somente ele o conhecedor dos mistérios da edificação do Templo de
Salomão, e que Hiram Abiff, nada representava dentro da filosofia desenvolvida
pelos obreiros da Arte Real. Ouviu um riso gaiato. - Hi!...hi! ...hi!... -
Ainda com os olhos semicerrados, pareceu-lhe ter escutado um riso zombeteiro,
de início não deu importância ao fato.
Continuou a dar guarida aos seus volteios
imaginativos, via-se como o maçom de maior conhecimento e merecedor de todo o
respeito pela sua postura, podia até ser tido como um censor dos trabalhos
realizados sem loja. - Hi!... hi! ...hi!...
Voltou a escutar com toda a clareza o mesmo riso
zombeteiro, o que lhe assustou, fazendo-o abrir os olhos, e perscrutar ao seu
redor. Espantado e já sentindo um arrepio a correr-lhe pelo corpo com atitude
nervosa, percebeu que ficara temeroso com o que estava acontecendo.
Encheu-se de coragem, procurando acalmar-se, disse
para si mesmo:
- “É produto da minha imaginação! Não devo temer,
pois nada me atemoriza neste mundo” Assim, uma vez mais, deixou-se levar pela
sua mente, novamente se fez ouvir o riso como se alguém presente, estivesse a
ouvir-lhe os pensamentos e os desdenhasse condenando a sua arrogância.
- Há!... Há!... Há!...; Abriu rapidamente os olhos,
olhou para todos os lados, e intrigado, asperamente, vociferou: - Quem está aí?
Não obteve resposta. Novamente, exclamou: - “Quem está aí, quem está tentando
brincar comigo?” Após uns segundos de silêncio mortificador, ouviu em resposta.
- Você não queria que alguém estivesse aqui para
aprender maçonaria? - Pois eu estou aqui. - Quem é você? Exclamou o maçom. Uma
voz soturna, respondeu.
- Eu sou o seu “PENSAMENTO”! Sou o seu julgador,
sou aquele que pode contestar as suas atitudes, aquele que levado pelo censo de
justiça poderá desafiá-lo em conhecimentos, aquele que poderá discutir com você
neste momento, no campo da filosofia maçônica e num desafio entre nós,
verificaremos se você aprendeu a fazer uso do maço e do cinzel, no desbastar de
suas próprias asperezas.
- Sou aquele que aparece antes que suas ações sejam
realizadas; primeiro eu me manifesto, depois você realiza, mesmo às vezes me
contrariando, pois antevejo que a ação resultante será nefasta.
- Aceita o desafio? Ora, pensou o maçom, eu ser
desafiado pelo meu próprio pensamento, afinal eu que o domino, não poderei
perder para ele.
Eu conheço tudo de maçonaria; no Rito Escocês, não
me é desconhecido, caminho com segurança dentro da estrada de Aprendiz ao Inspetor
Geral, pois já fui colado ao grau trinta e três e percorri todo esse grande
trajeto. Os demais ritos, como York, Adoniramita, Schroeder, Francês ou moderno,
Egípcio (de adoção), Iluminado de Avinhão, Kilwining, Swemborg, Misrain, etc.
outros tantos, não me são desconhecidos. Presunçosamente, exclamou:
- Pois bem, aceito o desafio! E continuou: -
Façamos um pequeno debate, um pergunta e o outro responde, está certo? Disse o
presunçoso. - Sim, respondeu o seu PENSAMENTO.
Dou-lhe a prioridade para fazer-me a primeira
pergunta. - Não, respondeu o maçom, faça-me você a primeira que me disponho a
respondê-la.
- Está bem, se assim você quer, então vejamos,
far-lhe-ei uma pergunta bastante fácil para iniciarmos. - Diga-me, “o que é
maçonaria?” O pretensioso sorriu, e pensou consigo mesmo, “ora essa é pergunta
que me faça logo eu que de maçonaria tudo sei, nada me é desconhecido”.
‘Há alguns anos, venho escutando os Veneráveis, na
abertura dos trabalhos perguntarem aos irmãos que desempenham o cargo de
chanceler: “Que é maçonaria, irmão chanceler?
E a resposta, incontinente do chanceler se faz
ouvir em alto e bom tom “... é uma instituição que tem por objetivo tornar feliz
humanidade pelo amor, pelo aperfeiçoamento dos costumes, pela tolerância, pela
igualdade, pelo respeito à autoridade e a crença de cada um”.
E complementou o raciocínio. - “É uma instituição
Universal e suas oficinas espalham-se por todos os recantos da terra sem
preconceito de fronteira ou de raça”.
O maçom, num tom jocoso, verbalizou a sua resposta
como vinha escutando há anos, todavia, sem analisar o conteúdo. Enquanto
desfrutava o sabor dos seus conhecimentos, verificou que o seu interlocutor
pesaroso sacudia negativamente a cabeça.
Essa atitude pegou de surpresa o maçom,
ruborizou-se, quase entrando em estado apoplético levado pela irritação que o
acometera, pois jamais esperava ter chamada a sua atenção pelas suas
afirmações, por considerá-las corretas, sem contestação alguma, e, agora estava
sendo chamada atenção pelo próprio pensamento!
- Ora bolas, isso jamais tinha ocorrido em sua vida
de maçom!
- Sempre fora tido como um maçom estudioso,
inteligente, culto, e ninguém jamais se encorajaram em chamar-lhe atenção ou
dizer-lhe que “ele” estava errado em suas afirmações. Pois sempre merecera o
respeito dos maçons, em todas as oficinas que teve o prazer de visitar.
O seu interlocutor, pesaroso, disse-lhe:
- Se você não sabe o que é maçonaria como deseja
discuti-la, em sua história, em seus ensinamentos, em sua filosofia, em seus
princípios?
- Você não acha muita pretensão?
- Se não sei o que seja maçonaria, como você ousa
afirmar, diga-me, então o que é a maçonaria, meu pobre pensamento! Que vou contestá-lo
e mostrarei que estou com a razão, ou melhor, sempre estive de braços dados com
ela, essa é a fórmula inserta em nossos rituais e os seguimos à risca os seus
pensamentos.
- Vá lá, o que é maçonaria?
O pensamento refletiu por um momento e disse:
- O que você acaba de mencionar, nada mais
representa que os objetivos da maçonaria e não a definição desta ciência para
uns, e arte para outros. Várias são as definições de maçonaria, mais a que mais
me agrada e esta: “Ordem maçônica é uma associação de homens sábios e virtuosos
que se consideram Irmãos por laços de recíproca estima, confiança entre si e
cujo fim é viver em perfeita igualdade, intimamente ligados pela amizade,
estimulando-se uns aos outros na prática das virtudes”.
“Em fim é um sistema de moral, velado por alegoria
e ilustrado por símbolos.” Embora imperfeitas essas definições sejam
suficientes para nos convencer de que a Ordem Maçônica foi sempre, e deve
continuar a ser, a UNIÃO CONSCIENTE de homens inteligentes, virtuosos,
desinteressados, generosos devotados, irmãos livres e iguais, ligados por
deveres de fraternidade, para se prestarem mútua assistência e concorrerem,
pelo exemplo e pela prática das virtudes, para esclarecer os homens e
prepará-los para a emancipação progressiva e pacífica da humanidade.
É, pois um sistema e uma escola, não só de moral
como também de filosofia social e espiritual, revelada por alegorias e ensinada
através de símbolos, guiando seus adeptos à prática e ao aperfeiçoamento dos
mais elevados deveres de homem cidadão, patriota e soldado de bem.
Praticando o bem sobre o plano físico e moral, a
maçonaria reúne todos os homens com irmãos, sem deles indagar a crença ou a fé.
Por isso e para evitar o desvirtuamento seus nobres e sublimes fins, a
MAÇONARIA exige que sejam iniciados em seus mistérios somente aqueles que,
reconhecendo a existência do G.’. A.’.D.’.U.’., bem compreendem os deveres
sociais e, alheios a elogios mútuos e inclinações contrárias aos rígidos
princípios da moralidade.
Busquem-na em elevados sentimentos de Amor
Fraternal. - A Maçonaria é, portanto, o progresso contínuo, por ensinamentos em
uma série de graus visando por iniciações sucessivas, incutir no íntimo dos
homens a LUZ ESPIRITUAL E DIVINA, que, afugentando os baixos sentimentos de
materialidade e sensualidade e de mundanismo e invocando sempre o GRANDE
ARQUITETO DO UNIVERSO, os tornem dignos de si mesmo, da Família, da Pátria e da
Humanidade.
- Chega! Pare! Não diga mais nada! “Violentamente o
velho maçom, gritou ao seu interlocutor”. Este ficou surpreso e interrompeu a
dissertação! ...
Aos prantos, disse: - Como agradeço, ó meu
pensamento!
- Vivi até agora na escuridão da VAIDADE e da
IGNORÂNCIA, sempre tendo como medíocre os meus irmãos, quando na verdade o
ignorante, sou eu.
Como me envergonho das minhas atitudes posso até
considerá-las nefastas, quantas vezes me tornei pedante e prepotente diante dos
meus irmãos. Quantas intervenções inoportunas e quantas interrupções
despropositadas nas sessões em que participei.
- Ainda hoje, tornei-me intolerante, é por isso que
os meus irmãos, quando chego à loja, ficam incomodados com a minha presença.
- Muitas vezes, escutei palavras xistosas, com
insinuações de ter chegado o professor de Hiram Habiff...
- Eu não entendia como dirigidas a mim!
- Agora entendo por que fugiam de mim. Agora
entendo por que, nas sessões em que eu estava presente, os irmãos muitas vezes
se encolhiam nas cadeiras situadas no oriente e no ocidente esperando que não
me manifestasse.
Nesse instante, o Velho Maçom, pôs-se a chorar
copiosamente, colocou carinhosamente, junto ao peito a obra que lhe trouxera
tantas reflexões e declarou diante de si próprio, da sua consciência e do seu
PENSAMENTO.
- Como eu estava errado, solenemente prometo
corrigir-me e me transformar em um novo maçom; na verdade, somente posso fazer
apenas uma afirmação, tudo o que eu pensei saber de maçonaria, é pouco, pois na
verdade ouso afirmar convictamente:
“TUDO O QUE
SEI, É QUE NADA SEI SOU UM GRANDE IMPOSTOR” A partir de hoje o meu lugar em
loja não será mais aquele que eu pensava ser merecedor por direito.
“O MEU LUGAR SERÁ NO TOPO DA COLUNA DO NORTE, COMO
O MENOR DOS APRENDIZES DA ARTE REAL.”
Naquele instante nasceram em seu coração os mais
nobres sentimentos de: “TOLERÂNCIA E HUMILDADE.”
Miranda Delgado.
Parabéns meu Ir.´., excelente trabalho, realmente vejo em loja a falta de “TOLERÂNCIA E HUMILDADE.” e o verdadeiro sentido da palavra IRMÂO. T.F.A
ResponderExcluirELvis Luiz ALves email: elelvis2@gmail.com
ResponderExcluir