A PROPÓSITO DO SEGREDO MAÇÔNICO


 

Em comentário ao texto Os meus Irmãos reconhecem-me como tal, alguém se insurgiu contra o mesmo, entendendo que nele era revelada matéria integrando o que se convencionou chamar de segredo maçônico e que eu, como todos os maçons, jurei não revelar a profanos.

Em resposta a esse comentário, o Ruah já esclareceu que nada do que nos comprometemos a não revelar foi exposto no dito texto. Assim é: que os modos de reconhecimento dos maçons são sinais, palavras e toques é, de há muito, do domínio público e é, até intuitivo.

Para alguém reconhecer outrem como integrando determinado grupo ou qualidade, terá de se aperceber através do que vê (sinais), do que ouve (palavras) ou do que sente (toques). Referi-lo, pois, não atenta contra o chamado segredo maçônico. Atentatório, sim, contra ele e contra os compromissos por todos os maçons assumidos, seria revelar que sinais são esses, que palavras estão em causa, que toques relevam.

O chamado segredo maçônico é um dos pontos que mais suscita a curiosidade de quem não é maçon. Mas, relativamente a ele, não posso e não devo satisfazer a curiosidade profana: se o fizesse, o segredo deixaria de existir e o motivo para a curiosidade também…

O chamado segredo maçônico é também um dos pontos utilizados por aqueles que são hostis à Maçonaria e aos maçons para procurar atacar e vilipendiar uma e outros, ao abrigo do genérico pretexto de que se não tivessem um propósito criticável, não precisavam de segredo para nada.

Como se não fosse intuitivo que todas as pessoas têm e guardam segredos, uns só para si, outros apenas acessíveis aos que lhe são mais chegados – chama-se a isso reserva da vida privada e tem dignidade de direito fundamental, constitucionalmente protegido em todas as sociedades civilizadas…

Como se todas as sociedades e associações não tivessem matérias e planos e decisões e estratégias cujo conhecimento reservam apenas para os seus membros…

Como se os empresários, os membros da alta finança e os políticos não proclamassem todos, com alegre satisfação, que o segredo é a alma do negócio…

A todos é naturalmente reconhecido o direito ao segredo, à reserva do que não se destina a ser do conhecimento público. Só os maçons são verberados por respeitarem o seu compromisso de guardar o segredo maçónico!

Muita da curiosidade, muito do combustível para os ataques aos maçons resulta, afinal, de se mitificar a essência, a natureza e a amplitude do segredo maçónico. Mitificação para que a Maçonaria e os maçons contribuíram, reconheço… Mitificação que, sendo um exagero, é um distorcer da verdade. E do torcer da verdade não resulta, normalmente, nada de bom…

A Maçonaria é uma instituição ancestral e que preza a Tradição. Mas, como todas as instituições ancestrais bem sucedidas, sabe preservar a Tradição, adaptando os seus usos e costumes ao evoluir dos tempos e das sociedades. Só assim evita ser anacrônica e mantém interesse e importância e valor, ao longo da passagem dos anos, décadas e séculos.

O século XXI lançou-nos a todos na voragem da Sociedade da Informação. As chamadas Novas Tecnologias permitem aceder a mananciais de informação que, ainda há poucas décadas – há poucos anos… – eram impensáveis.

A Maçonaria não pode, não deve, obviamente, ser indiferente às consequências desta evolução. Não que tenha deixado de fazer sentido a subsistência do segredo maçônico. Mas a mitificação do mesmo, essa sim, não me parece que seja vantajosa, nem para os maçons, nem para os profanos.

A Maçonaria prossegue objetivos honrosos e louváveis. É frequentemente denegrida por quem, sendo-lhe hostil, a acusa de prosseguir propósitos menos recomendáveis e, sistematicamente, esgrime com o segredo maçónico como alegada prova dos tenebrosos propósitos da Maçonaria.

Em época de acelerada circulação da informação, não basta à Maçonaria seguir o seu caminho, não ligando aos cães que ladram à passagem da caravana. Porque tanto ladrido de tanta canzoada acaba por impressionar quem o ouve.

A Maçonaria deve continuar a prosseguir o seu caminho, apesar dos rafeiros e seus latidos. Mas, para bem de si própria e elucidação de todos, nestes tempos de abertura de informação, deve mostrar e informar para onde vai, porque vai e como vai. Assim todos verão qual o caminho e não se impressionarão com a barulheira dos canídeos, que todos poderão ver ser vãs e sem motivo que a sustente.

O segredo maçônico é um dos objetos dos latidos. Pois bem, é tempo de mostrar, a quem estiver de boa-fé, que esse vozear não tem razão de ser. Não – repito – abandonando o segredo maçónico ou traindo os compromissos assumidos. Mas explicando os limites, a natureza e as razões do dito segredo. Quem estiver de boa-fé perceberá. Os outros… continuarão a ladrar, mas já impressionarão menos…

Nos próximos dias tenciono, pois, publicar alguns textos sobre o segredo maçônico, explicando o que abrange, porque existe, porque se justifica. Sem trair os meus juramentos.

Por hoje, e para terminar, deixo apenas este aperitivo: na minha opinião, não há um segredo maçônico. Há dois. Um exotérico e outro esotérico. Aquele é o que normalmente é referido. Mas, na minha opinião, é o que menos importa…

In Blog “A Partir Pedra” – Texto de Rui Bandeira (06.01.2009)

 

ENTRANDO EM UMA LOJA MAÇÔNICA


 

Um Aprendiz entrou numa Loja e viu um Irmão no balcão. 

Maravilhado com a beleza do lugar, perguntou: 

- Irmão que se faz aqui? 

- Cavamos masmorras ao vício e levantamos templos a virtude; 

- O que se vende aqui? 

- Os dons do G.'.A.'.D.'.U.'.. respondeu-lhe o irmão. 

- Quanto custam? - voltou a perguntar. 

- Não custam nada. Aqui tudo é de graça, basta que se dedique e caminhe junto de seus irmãos! 

O aprendiz contemplou a Loja e viu que haviam jarros de amor, vidros de fé, pacotes de esperança, caixinhas da salvação, muita sabedoria, fardos de perdão, pacotes grandes de paz e muitos outros dons. 

O Aprendiz, maravilhado com tudo aquilo, pediu: 

- Por favor, quero o maior jarro de amor, todos os fardos de perdão e um vidro grande de fé, para mim, meus irmãos e família. 

Então o irmão preparou tudo e entregou-lhe um pequeno embrulho que cabia na palma da sua mão. 

INCRÉDULO, o Aprendiz disse: 

- Mas como pode estar aqui tudo o que pedi? 

Sorrindo, o gentil irmão lhe respondeu: 

- Meu respeitável irmão, em uma Loja de São João justa e perfeita não vendemos frutos! Só Sementes! Plante-as! 

TFA.’. 

(Autor desconhecido)

 

OS CAMINHOS DA MAÇONARIA


 

A “Maçonaria” moderna, especulativa, tem uma data de nascimento precisa: nasce em 24 de Junho de 1717, em Londres, da reunião conjunta de representantes de quatro das Lojas da cidade (compostas de maçons operativos e de maçons “maçons aceitos”, três das quais eram lojas de criação muito recente) que, em “conflito” virtual com as lojas operativas mais tradicionais – os antigos – onde se distinguia o célebre arquiteto da Catedral de São Paulo Sir Chistopher Wren – decidem criar a primeira formação maçónica de tipo federativo, a Grande Loja de Londres, para cujo governo logo elegeram, por braços levantados, o mal conhecido Anthony Sayer como Grão-Mestre e o carpinteiro Jacob Lamball e capitão John Eliott como Grandes Vigilantes.

A Grande Loja de Londres, assume-se desde logo como uma espécie de “Loja-mãe”, que se vai arrogar um “poder central” de caráter ordenador e legislativo, sob o crescente domínio de intelectuais protestantes, constituindo a sua fundação um momento de ruptura com as tradições das Lojas operativas de composição artesanal e de inspiração católica (que vieram a dar lugar a outro movimento federalizante, onde se distinguiu Dermott que terá promovido a elaboração das Constituições “Ahiman Rezón”, de 1756). (Grande Loja Unida de Inglaterra, 1815?) Poucos anos decorridos, em 29 setembro de 1721, a Grande Loja de Londres, em reunião ampla com a presença de delegados de 16 lojas, sendo então Grão Mestre o nobre duque de Montagu, invocando terem-se encontrado “grandes erros em todas as cópias das antigas constituições”, delibera encarregar o irmão Anderson de “as pôr em ordem, segundo um novo e melhor método” [1].

Com esta “decisão capital”, a emergente G L Londres assume-se como sucessora das Fraternidades de pedreiros e outros artesãos da “Arte Real” e como continuadora e depositária das suas antigas tradições e costumes, que mandava que fossem coligidos e fixados em textos precisos, unívocos e “oficiais”, expurgados dos “grandes erros” encontrados nas cópias preexistentes, por esse modo deixando implícita a sua intenção de os preservar.

Intenção, aliás, muito controvertida, já que – segundo alguns – Anderson modificou deliberadamente os “Antigos Deveres” e, com a sua equipa de sábios, intelectuais pouco conhecedores dos ritos iniciáticos, criou outro movimento, sobre uma base humanista, com abandono do pensamento tradicional. E, sendo assim, a G L L não seria a continuadora da maçonaria operativa nem se poderia reclamar dessa qualificação.

Como quer que seja o trabalho de compilação e arranjo começou ¡mediatamente, desenvolvendo-se rapidamente, e sendo dado por terminado em 27 de dezembro do mesmo ano de 1721. Os respectivos manuscritos foram então submetidos ao exame e parecer de um “comité de 14 irmãos eruditos”, designados pelo Grão-Mestre Duque de Montagu. 

O Comité apresentou o seu parecer na reunião da Grande-Loja de 25 de março de 1722 que aprovou, depois de algumas emendas, “a história, as obrigações, os regulamentos e o canto do mestre” compilados e arranjados por Anderson, como lei da maçonaria, exprimindo o desejo de que o Grão-Mestre ordenasse a sua impressão. E afetivamente a obra é impressa e publicada em 1723, “para o uso das Lojas”, sob o título “The CONSTITUTIONS of the FREE-MASONS containing the History, Charges, Regulations, e&c. of that most Ancient and Right Worshipful Fraternity” [2].

Para tanto, com inegável dinamismo e determinação, assume-se como instância ordenadora qualificada da maçonaria moderna, arrogando-se a faculdade de determinar o que está certo e deve ser preservado e observado, e o que está errado e deve ser banido.

II – É certo que o percurso da Maçonaria, desde o ato fundador de 1717, está longe de ser um percurso linear e pacífico. O nosso Irmão Antônio Carlos Carvalho, evidenciando a rotura com a tradição artesanal e católica e referindo que o trabalho de Anderson, apresentado como uma revisão necessária, foi na realidade um trabalho de alteração dos “Old Charges”. sustenta mesmo que “Dessa data em diante …a Maçonaria entra em decadência, num processo descendente que vem até hoje” [3].

Por maior respeito que nos mereça a opinião assim expressa por aquele nosso Ilustre e sábio I, não pode deixar de se salientar que a Maçonaria que ele refere ter entrado em decadência, terá sido a Maçonaria dos “antigos”, de fundo operativo acentuadamente iniciático e tradicional, visto que a Ordem, na sua expressão moderna, com diferentes e variados fundamentos ideológicos, conheceu desde então uma expansão planetária inegável.

O certo é que, através dos conflitos entre “antigos” e “modernos”, cristãos, teístas, racionalistas e agnósticos, das “lutas” por supremacias pessoais, das divergências filosóficas, das cisões e dos cismas, dos apoios e das perseguições, a Maçonaria especulativa (que apesar de tudo se revê no ato fundador de 1717) foi-se desde então espalhando por todo o Mundo, “como nódoa de azeite”, com persistência e consistência, assente num núcleo singular de regras e especialmente de formas, que fazem dela uma “grande família”, em todo os países do Mundo.

Sem reconhecerem uma estrutura hierárquica unificante, a qualquer nível, “sem leis gerais nem livro santo que a definam e obriguem todo o maçom através do Mundo” [4], operando com autonomia (sempre ciosamente reivindicada) nas pequenas unidades que são as Lojas, a Maçonaria adquiriu como que uma “personalidade de fato” que permite que, do interior e especialmente do exterior, seja apercebida como “uma Instituição” de expressão verdadeiramente universal, impar e incontornável, apesar das diferenciações filosóficas que foram individualizando os diferentes ritos e as várias Obediências.

III – Os “maçons”, que na fase operativa foram os construtores das joias da arquitetura e das grandes obras monumentais, são, por tradição, os perseguidores da perfeição e também os depositários dos conhecimentos iniciáticos e reservados, dos símbolos e das formas associadas aos seus mestres e da solidariedade fraternal, e universal, que provinha da comunidade dos seus particulares saberes, dos seus interesses sócio- profissionais, da sua aptidão para representar e traduzir o inefável em realizações materiais perenes, exaltantes de beleza e de espiritualidade, em que se iam sedimentando as civilizações …

Como grandes construtores, invocando a “sabedoria” e a “força” que vêm do G A D U, praticando entre si a igualdade fraternal e o seu aperfeiçoamento interior, excluindo dos seus trabalhos a discussão sobre questões religiosas e políticas que os poderiam dividir, os “maçons” empenharam-se sempre em decorar com “beleza” as realizações dos homens, por modo a tomar o “templo universal” mais livre, mais igual, mais fraterno e solidário e mais belo.

Estes fatores de unidade e de individuação, assumidos como herança pela “maçonaria especulativa”, foram decerto condição necessária para a rápida difusão da Ordem a partir do ato fundador de 1717. Mas não pode deixar de se reconhecer a importância fulcral e aglutinadora das Constituições de Anderson, quaisquer que sejam os seus erros e insuficiências ou as diversas leituras dos seus exegetas e intérpretes, para a unidade na diversidade dos maçons de todo o Mundo e de todos os Ritos e Obediências, até aos dias de hoje.

IV – Como já se disse, a Maçonaria moderna espalhou-se por todo o Mundo, “como nódoa de azeite”, a partir de Inglaterra e da Escócia, num movimento imparável iniciado depois do ano de 1723. Estabelece-se em França pelo menos a partir de 1725/1726 [5], em Portugal a partir de 1733 e na maioria dos outros países europeus até 1743; e cedo foi levada para os outros Continentes, designadamente para os EUA, onde há notícias de em 1930, se ter formado uma Loja em Filadélfia [6].

Na França, no Século das Luzes e da Enciclopédia, no dealbar do processo histórico que conduziu à Revolução Francesa, e depois dela, a maçonaria encontrou um terreno cultural e sócio-político propício a uma implantação explosiva e a uma caracterização particular, que deu lugar a uma franco-maçonaria havida por liberal, em que foram salientados os temas da igualdade, da liberdade, da solidariedade social e da fraternidade.

A expansão é tão rápida, que se refere que eram maçons 477 dos 605 deputados à Assembleia Constituinte, de 1789 [7].

Desde então, os “maçons”, foram sempre atores determinantes dos grandes movimentos da história da humanidade, na arte, na autodeterminação e independência de povos e de nações, na conquista da igualdade e das liberdades, na consolidação da democracia, na sedimentação dos direitos sociais, na instrução e educação, na implementação dos sistemas internacionais de segurança coletiva, nas ações de assistência e solidariedade com os mais carenciados…

Os desafios postos por aqueles temas, foram assumidos por uma parte significativa dos “maçons” de todo o Mundo.

E “maçons” foram muitos daqueles cujos nomes ilustram a história da humanidade, em todos os domínios da ciência, da arte a da política … O seu cimento de unidade foi a procura do aperfeiçoamento da sociedade, pela valorização da vertente social do homem, pela atenuação progressiva das suas misérias e das discriminações que atingiam a grande massa dos desfavorecidos, pelas iniciativas assistenciais e de solidariedade ativa, pela consagração dos seus direitos fundamentais à liberdade, à justiça e à igualdade formal, ao acesso à cultura, à saúde e a uma vida digna.

Como já referi, foi esse desafio – traduzido no brocardo “Igualdade, Liberdade e Fraternidade”, anteposto ao projeto espiritual do aperfeiçoamento individual e da construção do templo interior – que a Maçonaria Universal implicitamente assumiu, que explicou a rápida e fulgurante difusão da Ordem desde 1717 até meados do século XX, motivando adesões e perseguições. A Ordem, através da ação individual dos seus irmãos estava presente e era influente em todos os centros de poder.

A sua ação era discreta, mas produzia resultados.

O carácter secreto (ou discreto) e esotérico da Ordem, o simbolismo das suas formas comuns e universais, as próprias perseguições da Igreja e dos poderes instituídos, eram tudo fatores de sedução e de força apelativa, que concitavam à adesão de quantos tinham real vontade de contribuir positivamente para os resultados procurados.

Estava assim a Maçonaria constituída numa “ideia-mito”, com o sentido que pode ser extraído do intuicionismo vitalista de Bergson, segundo o qual a razão não é o modo superior de conhecimento, que antes cabe a uma relação cognoscitiva mais próxima da realidade última e que se exerce quando, em vez de pensarmos conceitualmente as coisas, distanciando-as com a análise, as vivemos intimamente e agimos coerentemente com tal conhecimento intuitivo.

Foi ao apelo dessa ideia-mito de que a “igualdade, liberdade e fraternidade” era possível e constituía um objetivo elevado e alcançável com a colaboração dos “maçons”, que responderam os milhões de homens que em todo o Mundo aderiram à Maçonaria.

A partir de meados da década de 70 do século XX, há a sensação de terem sido alcançados, em boa medida, os objetivos prosseguidos, com a adopção do “estado social de direito”, com a implantação da democracia política e dos regimes estatais mais ou menos generalizados de segurança social e de assistência na doença, no desemprego, na velhice e nas situações de extrema carência, com a ampla difusão do acesso ao ensino e à cultura e com a minimização das formas mais gritantes de desigualdades sociais.

A sociedade do “bem estar” e do reconhecimento dos direitos fundamentais do homem parecia instalada e, em razão do seu próprio êxito, a tal ideia-mito, com os conteúdos que se lhe assinalaram, e que foi motor da expansão da maçonaria, esgotou a sua força apelativa.

V – Perdido esse “élan”, a Maçonaria parece ter entrado em crise de crescimento. Há que procurar e que encontrar uma nova ideia-mito, em que os maçons se revejam e que apele à adesão e ao entusiasmo. Não basta que os irmãos se sentem nas colunas sessão após sessão e que progridam nos cargos maçônicos ou na posse de mais ou menos medalhas e decorações, sem objetivos concretos de trabalho efetivo e de resultados a alcançar.

Na fase que foi encerrada, foi a vertente material e exotérica da maçonaria que foi sobrevalorizada, em prejuízo do esoterismo e da procura do melhoramento espiritual.

Será agora a vez de atribuir a prioridade ao aperfeiçoamento espiritual, à cultura integral, segundo as convicções de cada iniciado em matéria de fé, num movimento consistente de regresso às “origens” e às tradições. Conforme diz Foster Bailey,

“No tempo atual, a necessidade da Maçonaria não é mais membros, mas de melhores membros; não salas de Lojas a abarrotar, mas a participação de grupo em rituais bem entendidos como espirituais no significado e, assim, ajudas (na) demanda de compreensão espiritual e crescimento pelos quais a … antiga Ordem de Franco-Maçons foi criada” [8].

E nesta linha, talvez, que cumpre aos “maçons” de hoje pesquisar e encontrar novos fatores míticos de envolvimento e de adesão empenhada e efetiva, que não deverão estar aptos a provocar “movimentos de massa”, mas que devem antes almejar “mudar a qualidade de vida” de cada um através dos ensinamentos espirituais seguidos e interiorizados, considerando que a diferença específica entre a Maçonaria e outras organizações é uma busca de aperfeiçoamento espiritual.

Que o G A D U nos ajude a encontrar, enunciar e definir os fatores integradores da nova ideia-mito que julgo necessário fazer nascer, e a alcançar, nessa vertente esotérica, êxitos paralelos aos que foram alcançados na vertente material da solidariedade e do aperfeiçoamento da sociedade.

Este é o porventura o desafio que a nossa época lança aos homens livres e de bons costumes.

Autor desconhecido

Fonte

Revista “Entre Colunas” – edições 1 e 2 – II série – 1º ano

Notas

[1] Daniel Ligou, “Constitutions d’Anderson”, 4a ed., Paris, pg.21

[2] Traduzindo livremente “As Constituições dos Franco-Maçons contendo a História, Obrigações, Regulamentos, etc. desta muito Antiga e Muito Venerável Confraria

[3] In Prefácio à “História da Franco-Maçonaria em Portugal (1733-1912)”, de M. Borges Grainha, Lisboa, 4a ed, pg. 7 4

[4] Oliveira Marques, “A Maçonaria em Portugal”

[5] Paul Gordot, “Les sources maçonniques du socialisme Français”, pág..15

[6] Foster Bailey, “O Espirito da Maçonaria”, 1957, trad. Portuguesa, Lisboa 1999, pág..130

[7] Paul Gordot, op. Cit., pág. 19

[8] Foster Bailey, op. cit. pág. 133

 

BREVE HISTÓRIA DO RITO ADONHIRAMITA


 

Místico, espiritual, histórico, ortodoxo e tradicional. Muitos são os adjetivos empregados para definir o Rito Adonhiramita.

Definir as suas origens e história é algo tão difícil quanto apaixonante e desafiador. Pelas mais diversas razões a literatura dedicada é bastante escassa, e documentos referentes aos primórdios da sua prática são bastante raros.

O Rito Adonhiramita é definido por muitos autores como preservador da sua essência original, mantenedoras tradições ritualísticas e práticas iniciáticas das escolas de mistério da antiguidade, e das ordenações do período operativo da Maçonaria. É metafísico, teísta, esotérico e místico.

O Rito Adonhiramita é fruto da evolução e do aperfeiçoamento dos Ritos de Kilwinning, York e Clermont, praticados pelas Lojas britânicas, e, sobretudo, do desdobramento do Rito de Heredon (Monte Místico), também chamado de Rito de Perfeição, originário da Escócia e amplamente praticado na França no século XVIII [1].

Porém, o Rito Adonhiramita não absorveu os conceitos jacobitas inseridos pelos exilados na França da linhagem escocesa dos Stuarts, adoptando os conceitos da Maçonaria inglesa, particularmente da corrente denominada de Modernos, após a fundação da Grande Loja de Londres e Westminster em 1717.

Apesar disto, Oscar Argollo [2], autor maçónico das primeiras décadas do século XX, classifica o Rito Adonhiramita como um dos mais antigos, associando a sua origem a um ritual de 1248, utilizado pelos construtores da Catedral de Colónia, Alemanha, que chamou de Rito Primitivo do Egito, do qual os rituais Adonhiramitas ter-se-iam originado. Afirma ainda que há indícios da prática do Rito Adonhiramita em 1616. Na verdade, mesmo que estas afirmações até certo ponto surpreendentes sejam verídicas, esse Rito com certeza não possuía o nome de Adonhiramita. A denominação Adonhiramita é posterior a 1725.

No anterior a 1750, quando ocorreu a explosão de Ritos na França, a Maçonaria continental tinha a mesma prática das ilhas britânicas, ou seja, havia rituais com diferenças entre si, mas não Ritos como os conhecemos atualmente.

Em 1781, o ritualista Louis Guillemain de Saint-Victor publica em Filadélfia, EUA, o primeiro volume da obra intitulada Recueil Précieux de la Maçonnerie Adonhiramite, Compilação Preciosa da Maçonaria Adonhiramita no nosso idioma, que abordava os três Graus do Simbolismo e o Grau de Mestre Perfeito. Posteriormente publica o segundo volume contendo do Grau Cinco ao Doze, correspondendo este último ao Grau de Cavaleiro Rosa-Cruz que classificou como nec plus ultra, expressão latina que significa nada há além. Esta é considerada a obra de referência do Rito Adonhiramita.

A primeira edição dos dois volumes da Compilação Preciosa da Maçonaria Adonhiramita postulava a seguinte hierarquia de Graus, divididos do 1 ao 4 no primeiro volume e do 5 ao 13 no segundo:

Grau 1 – Aprendiz Maçom

Grau 2 – Companheiro Maçom

Grau 3 – Mestre Maçom

Grau 4 – Mestre Perfeito

Grau 5 – Primeiro Eleito ou Eleito dos Nove

Grau 6 – Segundo Eleito ou Eleito de Perignan

Grau 7 – Terceiro Eleito ou Eleito dos Quinze

Grau 8 – Pequeno Arquiteto

Grau 9 – Grande Arquiteto ou Companheiro Escocês

Grau 10 – Mestre Escocês

Grau 11 – Cavaleiro da Espada, do Oriente ou da Águia

Grau 12 – Cavaleiro Rosa-Cruz

Ocorre, no entanto, que neste segundo volume da Compilação Preciosa foi publicada a tradução de um ritual alemão, que anteriormente já tinha sido feita no Jornal de Trevoux, que se referia à antiga Ordem dos Cavaleiros Noaquitas ou Prussianos, traduzido para o idioma francês por De Bérage, que sugeria a existência de um décimo terceiro Grau e causando uma enorme controvérsia em relação ao número de Graus originalmente praticados pelo Rito Adonhiramita.

O exame dos textos de Saint-Victor revela a possibilidade de se tratar de uma espécie de Grau honorífico, pois era condição sine qua non para ser decorado com ele que o Mestre Maçom possuísse o Grau de Cavaleiro Rosa-Cruz, ou seja, o Grau realmente existia.

O facto é que durante muito tempo o Rito Adonhiramita foi conhecido como Rito dos Treze Graus e os seus praticantes chamados de Cavaleiros Noaquitas. O primeiro Ritual Adonhiramita publicado em solo brasileiro, pelo Grande Oriente do Brasil, em 1836, tinha esta configuração.

Desde a sua formalização o Rito Adonhiramita ganhou muitos adeptos na França, porém, a convulsão social pela qual o país atravessava naquela década o levou progressivamente ao declínio.

A religiosidade do Rito Adonhiramita, teísta e com forte influência cristã, chamou a atenção dos maçons portugueses, maior nação católica da Europa à época, fazendo com que ele migrasse para as terras lusitanas e as suas colónias, onde teve mais aceitação, dentre elas o Brasil.

A sua chegada ao Brasil ocorreu presumivelmente entre o final do século XVIII e início do século XIX. Há menções à fundação da Loja Reunião em 1801, no Rio de Janeiro sob obediência do Grande Oriente da Ilha de França, atuais Ilhas Maurício; da fundação da Loja Distintiva em São Gonçalo, Rio de Janeiro em 1812 e da fundação da Loja Comércio e Artes no Rio de Janeiro em 1815, todas sob a égide do Rito Adonhiramita, sendo as duas últimas obedientes ao Grande Oriente Lusitano [3].

Estas hipóteses na atualidade têm sido exaustivamente investigadas, e as descobertas têm trazido enorme enriquecimento sobre os primórdios da Maçonaria no Brasil e do próprio início do Grande Oriente do Brasil.

Porém, há registros da prática do Rito Adonhiramita em período anterior, entre 1813 e 1815, no que foi o primeiro embrião de uma Potência Maçónica brasileira fundada em Salvador, Bahia. Neste sentido, o Museu da Grande Loja Unida da Inglaterra – GLUI, possui no seu acervo um ritual Adonhiramita traduzido por Hipólito José da Costa, talvez o Maçom brasileiro mais proeminente na Europa do século XIX, que comprova de forma documental a prática do Rito Adonhiramita no Brasil antes mesmo de nos tornarmos uma nação independente [4].

Após a fundação do Grande Oriente do Brasil, no dia 17 de junho de 1822, o Rito Adonhiramita permanece sendo praticado aqui de forma regular e goza de período de amplo crescimento, notadamente após a fundação do Grande Oriente do Vale dos Beneditinos, ou Grande Oriente do Passeio, cujas Lojas seriam mais tarde integradas ao Grande Oriente do Brasil.

Em 2010 o Rito Adonhiramita faz o caminho de volta à Europa, de onde surgiu, e passa a ser praticado novamente em Portugal.

As três Potências Simbólicas Regulares do Brasil possuem Lojas Adonhiramitas.

Atualmente o SCAB – Supremo Conselho Adonhiramita do Brasil é uma Potência Filosófica que administra os Altos Graus do Rito Adonhiramita em território brasileiro, com a prática dos 33 (trinta e três) graus, sendo da sua competência e organização os graus do 4 (quatro) ao 33 (trinta e três).

Os maçons Adonhiramitas usam terno preto liso, os mestres usam chapéus também pretos, faixas azul celeste e espadas. Todos os maçons Adonhiramitas usam luvas e gravatas brancas.

Tratam-se por “Amados Irmãos”, pois isso induz subliminarmente o princípio da ampla e irrestrita fraternidade que deve nortear a relação entre os maçons. Por esta razão também é chamado de “Rito do Amor”.

É um Rito dos mais atraentes, que faz da requintada liturgia, da musicalidade presente nas sessões, e da espiritualidade as suas principais características.

Sérgio Emilião, M I – F. R+C

Notas

[1] O Rito de Heredon além de ser a base do Rito Adonhiramita, também o é do Rito Moderno e do Rito Escocês Antigo e Aceito.

[2] ARGOLLO, Óscar, O Segredo da Maçonaria, 1ª edição, Rio de Janeiro, 1942

[3] PINTO, Teixeira, A Maçonaria na Independência do Brasil 1812-1823, Editora Salogan, Rio de Janeiro, 1961, p. 14

[4] https://catalogue.museumfreemasonry.org.uk, página visitada em 25.05.2021

 

O CONTEXTO DO NASCIMENTO DA MAÇONARIA ESPECULATIVA NO CONTINENTE EUROPEU


 

“E, como a habilidade artesanal permanece a base da manufatura e o mecanismo global que nela funciona não possui qualquer esqueleto objetivo independente dos próprios trabalhadores, o capital trava uma luta constante com a insubordinação deles. [...] A queixa sobre a falta de disciplina dos trabalhadores atravessa então todo o período da manufatura [...].”

Karl Marx, O capital, v. I, [1867] 2017, p.442

É geralmente aceito que a maçonaria especulativa apareceu na Inglaterra, quando outros elementos, estranhos à profissão de pedreiro, foram admitidos nas corporações de pedreiros.

Sucede que este tipo de corporações, que regulavam o exercício da profissão e garantiam a assistência entre os seus membros, estavam ligadas à igreja, e ao direito canônico, porque os principais clientes das obras eram também a Igreja.

Mas no continente Europeu, onde existiam também estas corporações, a guerra dos cem anos interrompeu as grandes obras da Igreja, passando estas a ser mais de caráter civil, ficando por acabar muitas das catedrais, como Rodez, Albi, Saint Quin de Ruen, Ratisbona, Nuremberg, Milão, etc.

O que fez com que gradualmente, a partir desta época, as corporações de ofícios deixassem de estar vinculadas a Igreja, que era o principal patrão, por estatutos semelhantes aos das confrarias religiosas e sujeitos à lei canónica.

Mas a tradição de independência já era antiga e embora as corporações tivessem esta vertente religiosa e assistencial, já eram independentes quanto à sua regulamentação da atividade, e muitas vezes o próprio poder central as regulamentava, como foi o caso de Portugal, no fim do século XIV com a “casa dos 24” e em França em meados do século XIII, no tempo de S. Luís, com a regulamentação dos cento e um ofícios.

O certo é que, o século XIV, em particular, foi perturbado — em todo o ocidente europeu — por dramas revolucionários, mais ou menos violentos, não apenas de camponeses, mas também porque as tradicionais corporações eram muito restritivas no acesso dos companheiros à mestria, formando-se legiões de "conpagnons" nos vários ofícios, que devido às regras rígidas das corporações acerca da prestação do trabalho, formavam um mundo de mão-de-obra qualificada e mal paga.

E a partir daí, surgiram muitas novas corporações de “compagnos”, que estavam na vanguarda no mundo do trabalho.

As anteriores referiam-se apenas às suas práticas habituais de solidariedade entre trabalhadores e regulavam as rigorosas condições de acesso ao grau de mestre.

Estas uniões novas, afirmando a sua personalidade diante dos mestres e aos olhos das mais diversas autoridades, aparecem principalmente, pelo menos à primeira vista, como formações de combate e reivindicação de classe.

E muitas das antigas tiveram de se adaptar às novas circunstâncias, de forma a que os seus estatutos fossem puramente civis, respondessem às reivindicações laborais dos companheiros, regulando do exercício da profissão em matérias como o salário, os direitos de autor, assistência mútua, fundo de garantia mútuo, e sobretudo regulando o direito à greve, com rituais de reunião não religiosos e em que o juramento era prestado já não sobre os Evangelhos, mas sobre os estatutos da corporação.

Uma das que alteraram substancialmente os seus estatutos, foi a corporação “dos pedreiros de Estrasburgo”, constituída em 1325, aquando do início da construção da catedral desta cidade, mas que em 1459, embora mantendo alguma influência religiosa, como a invocação da Santíssima Trindade, Santa Maria Mãe de Deus e dos quatro santos coronados, cujos estatutos foram alterados, abrangendo a região de Spire, Estrasburgo e Ratisbona, com o um cunho laico e jurisdição interna e puramente civil.

É precisamente no ponto 46 destes novos estatutos, que tenho conhecimento da primeira adesão de não profissionais do ofício, ao estatuir-se que: “Se um homem piedoso deseje participar no serviço divino, devemos recebê-lo, mediante um estipêndio inicial, depois anual. Mas além do serviço divino, ele não pode participar nos trabalhos da corporação”.

Aqui o “Serviço Divino”, já não é a tradicional missa, mas as cerimónias de juramento sobre os livros da corporação e o estipêndio já não é a tradicional esmola, mas a contribuição obrigatória para o fundo comum.

Neste caso, estamos já em presença de uma organização meramente profissional, com um sistema de recrutamento de aprendizes, companheiros, ajudantes e mestres, à semelhança das antigas corporações, mas estatutos próprios, embora ainda secretos, em razão das regras próprias e métodos de construção próprios do ofício, uma tesouraria, abrangendo já vastas regiões geográficas e não apenas uma cidade.

A preocupação era já a de uma organização civil, de classe, regulamentando e uniformizando as práticas do ofício e de um fundo de garantia mútua.

Na Inglaterra o nascimento da maçonaria especulativa surgiu mais tarde, porque as corporações de maçons, mantiveram até muito mais tarde as suas características de confrarias religiosas, de um ofício, circunscritas a uma cidade ou a circunscrição diocesana, e quando começaram a admitir não profissionais do ofício ainda mantinham esta característica de corporação religiosa.

Como as convulsões sociais abalaram a Europa logo no século XIV, em plena era da produção em regime de manufatura, e na Inglaterra muito tardiamente já em meados do século XVII (1648), na transição para a produção industrial, as confrarias tradicionais não tiveram tempo de se adaptar, mantendo as anteriores características, quando admitiram novos membros alheios ao ofício.

E também não faziam já sentido, como reguladoras de um ofício, num novo sistema de produção, que substituiu a manufatura e o artífice, pela produção industrial e operariado.

Por esta razão, a maçonaria inglesa tornou-se especulativa sem ter tempo de se laicizar, ao contrário da continental.

Talvez estas diferentes características, estejam na origem de a maçonaria Inglesa ser gnóstica e a maçonaria continental ser de tendência laica.

E seja por isso que é a maçonaria gnóstica que vai contra a tradição no continente europeu e não o oposto.

Marco Aurélio

M.’.M.’.

 

 

O SENTIDO DA VIDA


 

Todo o ser humano, mais tarde ou mais cedo, mais ou menos frequentemente, se interroga sobre o sentido da vida. As religiões resultam, em última análise, dessa primordial interrogação, procurando cada uma delas dar resposta à mesma.

Confrontado com a crença religiosa que a sua cultura lhe disponibiliza, o indivíduo tem, basicamente, uma de três reações. Ou aceita essa doutrina, ou a rejeita ou aceita elementos, ainda que modificando-os, dessa tradição, mas busca ir mais além e mais fundo.

Se o indivíduo aceita a doutrina da crença religiosa que a sua cultura lhe disponibiliza, o seu problema está resolvido: o sentido da sua vida contém-se nos princípios dessa doutrina, cumpre, ou procura cumprir, os preceitos dessa religião e busca a Salvação ou a Evolução que a doutrina da sua religião preconiza. Sabe qual é o seu lugar e a sua função no mundo e na vida. Não precisa de se questionar mais.

Se o indivíduo rejeita a crença religiosa que a sua cultura lhe disponibiliza, das duas, uma: ou fá-lo porque se identifica com outra doutrina religiosa, a que se converte, ou, pura e simplesmente não crê. Na primeira hipótese, o seu problema de responder à interrogação primordial sobre o sentido da vida fica resolvido, em termos semelhantes à situação anterior.

Se a rejeição da crença religiosa ocorre porque, pura e simplesmente, não crê, o seu problema fica também resolvido, mas com outra resposta: não existe qualquer sentido na vida, a vida, como o Universo, resulta de uma combinação de fatores físicos e químicos, tudo se resume ao mundo material, onde se nasce, vive-se o melhor que se pode e um belo dia morre-se e nada de nada resta, para além do que se enterra ou é cremado, para dar lugar a outros que, sucessivamente, nascerão, viverão e morrerão, sem que deles nada reste também, para além do que se enterra ou é cremado, até que um dia uma qualquer combinação de fatores físicos e químicos a tudo ponha fim – do começo ao final nada faz sentido, tudo sucede, sucedeu e sucederá por acaso, por mecânica combinação de uma miríade de fatores físicos e químicos.

Se o indivíduo, confrontado com a crença religiosa da sua cultura, aceita, ainda que modificando-os, elementos dessa tradição, mas busca ir mais além e mais fundo, esse é o que mais longa e persistentemente se debate com a interrogação sobre o sentido da vida.

A resposta institucional não o satisfaz, a opção no ateísmo materialista também não. Esse rejeita que tudo sucedeu por acaso, por mera consequência de fatores físicos e químicos e que a vida não tenha sentido.

Esse considera que existe, sim, um sentido na vida, ainda que ele o desconheça, mas entende que existe um Propósito, um Objetivo, na existência do Universo e, principalmente, da Vida. O que materialmente vê e sente é apenas uma parte do quadro da Vida. Acredita que outros planos de existência ocorrem, que a passagem por este plano material tem um propósito, simplesmente não se satisfaz plenamente com as respostas dadas pela religião da sua cultura – nem com as respostas dadas pelas demais religiões.

Esse, ou se conforma com o desconhecimento e vive segundo os preceitos da sociedade em que se insere, ainda que porventura os não aceitando plenamente, ou busca, por si, com a sua Razão, resposta ou caminhos para resposta suscetível de o satisfazer. É crente, mas não se identifica com nenhuma religião em concreto. É crente porque a sua Razão o conduz a que o seja, mas, por isso mesmo, procura as respostas por si mesmo. É o que se denomina de deísta.

Há ainda os que – talvez a maioria – vão evoluindo ao longo da sua vida, em resultado do seu crescimento, das suas experiências, dos seus encontros e desencontros com pessoas, ideias e ideais. O mesmo indivíduo pode, ao longo da sua vida, passar por mais do que um – no limite, até por todos – dos estádios acima referidos.

Cada um é como cada qual. A pergunta – qual o sentido da vida? – é a mesma, impõe-se a todos, mas cada um dá-lhe a resposta que entende ou que pode dar e, se muda os termos dessa resposta, uma ou várias vezes, é porque a sua natureza o impele a assim fazer.

Muitos, a maioria, interrogam-se sobre o sentido da vida na solidão do diálogo consigo próprio ou podem apenas obter as respostas institucionalizadas da sua tradição religiosa. Outros confrontam a sua interrogação com as similares interrogações de outrem, e daí resultam apostasias, conversões, mas também lutas, por vezes ferozes, ou indiferenças perante as diferenças.

Há uns quantos, porém, que têm a possibilidade de colocar essa interrogação em conjunto com outros, sem confrontos, com aceitação das respostas de cada um, com partilha de pontos de vista e de experiências, pondo todos em comum o que cada um tem, de forma a que cada um retire do todo posto em comum o que necessite para ir mais além e mais fundo, na sua busca pessoal de resposta à interrogação primordial que o venha a satisfazer.

Esses são os maçons!

Rui Bandeira
Publicado no Blog “A partir pedra”

 


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