Quem nunca ouviu a máxima de que “o trabalho dignifica o
homem” a qual foi tão bem defendida por Voltaire, Adam Smith, dentre outros?
Voltaire, maçom, registrou que “o trabalho nos afasta de três grandes males: o
ócio, o vício e a pobreza”. Já na visão de Adam Smith, “onde predomina o
capital, o trabalho prevalece”.
Essa relação entre homem e trabalho não é apenas suportada
pelas Ciências Sociais, mas também pelos ensinamentos judaicos, cristãos e
islâmicos: “também, que todo o homem coma e beba, e goze do bem de todo o seu
trabalho; isto é um dom de Deus.” (Eclesiastes 3:13); “Ora, o que planta e o
que rega são um; mas cada um receberá o seu galardão segundo o seu trabalho.”
(I Coríntios 3:8); “Que trabalhem por isso, os que aspiram lográ-lo!” (Alcorão,
37:61).
Este é um assunto sobre o qual as diferentes vertentes –
socialistas ou capitalistas, ateus e crentes – concordam: o homem nasceu para
trabalhar e viver dos frutos de seu trabalho. Na Maçonaria não é diferente: uma
vez feito maçom, o Aprendiz já é chamado ao trabalho, sendo apresentado a ele
suas ferramentas de trabalho.
Porém, um erro que muitos podem cometer ao promover uma
abordagem simplista sobre o assunto é pensar que o trabalho dignifica o homem,
pois através dele pode-se proporcionar uma vida decente para si e sua família.
Tal raciocínio está equivocado, pois, nesse sentido, não
seria o trabalho que dignifica o homem, mas o seu resultado: o salário. Cometer
esse erro seria desonroso, negligenciando e zombando tanto o homem quanto o seu
trabalho, por julgar que o trabalho só tem valor porque gera um salário e que o
homem só trabalha para ganhar o seu próprio pagamento.
O trabalho produz mais do que simplesmente o salário do
trabalhador. O trabalho gera um produto ou serviço que é demandado por outra
pessoa ou pela sociedade. O trabalho gera habilidade e experiência para aquele
que o executa. O trabalho cria não apenas relações comerciais, mas também
sociais. Trabalho resulta em aprendizagem e conhecimento. Trabalho proporciona
prazer quando bem-feito. Trabalho estabelece parcerias.
Desse modo, o trabalho mostra que todos nós dependemos uns
dos outros, porque um alfaiate não pode fazer um terno sem o agricultor que
planta e colhe o algodão, o caminhoneiro que transporta o algodão para a
fábrica, o operário da indústria Textil que o transforma em tecido, o motorista
da transportadora que entrega o tecido para o atacadista, e, finalmente, o
atacadista que o fornece para o alfaiate. Apenas pelo trabalho de muitos
trabalhadores, o alfaiate pôde realizar seu próprio trabalho.
E o ciclo de trabalho não para por aí, visto que o terno
produzido pelo alfaiate vestirá outro profissional, o qual depende não apenas
do alfaiate, mas de muitos outros profissionais para sobreviver e poder
desempenhar seu trabalho, do qual outros trabalhadores podem depender,
incluindo o alfaiate.
Assim sendo, como pode o salário chamar a atenção quando o
trabalho significa algo muito maior e muito mais relevante para a vida de todos
os homens de boa vontade? Quando o trabalho cria uma riqueza muito mais
valiosa, imensurável em comparação com o salário?
Pensando assim, pode-se afirmar que o salário é, talvez, o
resultado menos importante do trabalho, servindo apenas como moeda de troca
para os produtos e serviços dos trabalhadores – algo necessário entre os homens
para tornar o fruto de seus trabalhos mais acessível a todos.
Olhe para si mesmo e veja a imensidão que lhe rodeia. Veja
cada objeto, parte e acessório que você está usando. Olhe para o ambiente ao
seu redor e tente imaginar quantos trabalhadores de todo o mundo estiveram
envolvidos na produção desses utensílios.
Olhe para o celular que provavelmente está contigo agora.
Imagine a energia que talvez mantenha sua lâmpada ou computador ligado. Agora
pense nas vastas redes de produção e de transporte e os milhares de
trabalhadores envolvidos nelas para permitir que este livro estivesse em suas
mãos neste exato momento, sem mencionar as paredes em que talvez se encontre e
serviços de água, internet, telefone, etc.
Sem dúvida, podemos dizer que milhões de trabalhadores de
sua cidade, estado, país e inclusive de outros países estiveram e estão
envolvidos na produção dos produtos e serviços que neste momento circundam
você.
Às vezes, a pressa da vida diária não nos permite parar por
alguns minutos e fazer essa reflexão. Simplesmente olhar ao redor e entender
como todos nós somos dependentes do trabalho de inúmeros trabalhadores
desconhecidos e sermos gratos a cada um deles.
Um dos principais ensinamentos maçônicos é o de que, para
fazer qualquer trabalho, deve-se equilibrar três conceitos arquetípicos
diferentes que são potenciais em cada um de nós: sabedoria, força e beleza.
Somos ensinados que estes são pré-requisitos para qualquer
grande e importante empreitada. Fugir disso pode levar à infeliz tendência de
sacrificar um planejamento adequado, o refinamento estético ou a mão de obra
adequada em uma tentativa equivocada de ser “prático”.
Quando cometemos essa imprudência e erguemos uma estrutura
sem a devida força ou beleza, não estamos conservando qualquer coisa de valor,
senão sendo contrários às melhores lições da tradição maçônica.
Pensando em termos individuais, não seria útil ter a vontade
e a força para realizar um trabalho se o trabalhador não tem a sabedoria ou as
habilidades necessárias para completá-lo. Da mesma forma, se tem a inteligência
e a força para trabalhar, mas falta a vontade, significa que nada será feito.
E do mesmo modo, é impossível para um trabalhador produzir
apenas com a vontade e a inteligência, mas sem a força exigida. Ou seja, é
necessário empregar todas essas três qualidades para que um trabalho seja feito
de uma forma justa e perfeita. Este é o segredo da perfeição: não está no
trabalhador, mas em seu trabalho.
Isso nos leva a uma característica essencial da Ordem
Maçônica. Nossa tradição valoriza todas as classes socioeconômicas e recusa-se
a levar em conta a posição profana de um homem, a não ser em termos de seu
caráter moral. É fácil de entender a partir desse ensinamento que nossa Ordem
ensina a dignidade de todo o trabalho. Em seu clássico trabalho, Moral &
Dogma, o célebre filósofo maçônico norte-americano Albert Pike ensina-nos:
Que nenhum companheiro imagine que o trabalho dos humildes e
sem influência não vale o feito. Não há limite legal para as possíveis
influências de uma boa ação ou uma palavra sábia ou um esforço generoso.
Nada é muito pequeno. Quem está aberto para a penetração
profunda da natureza sabe disso. Embora, na verdade, nenhuma satisfação
absoluta poderá ser concedida à filosofia, mais em circunscrever a causa do que
em limitar o efeito, o homem de pensamento e de contemplação cai em êxtases
insondáveis, tendo em vista todas as decomposições de forças resultantes na
unidade.
Todos trabalham para todos. (DE HOYOS, Arthuro. Ed. Albert
Pike’s Morals and Dogma of the Ancient e Accepted Scottish Rite of Freemasonry:
Annotated Edition. Washington, DC: Supreme Council, 2011.)
Não é apenas o seu trabalho que o dignifica, mas o trabalho
de todos os homens em todo o mundo que contribui para que você, um indivíduo,
possa viver com dignidade.
O maçom deve procurar compreender que o que o conecta a
todos os homens de boa vontade do mundo é o trabalho digno que cada um realiza.
Trabalho esse que, direta ou indiretamente, afeta todos os outros. Além da fé
no Grande Arquiteto do Universo, o trabalho é um dos grandes laços que nos une
em um vínculo que, mitologicamente, nós, como maçons identificamos como o mesmo
vínculo compartilhado por aqueles que trabalhavam no Templo de Salomão.
Portanto, durante a execução de um trabalho perfeito, o
trabalhador está aprendendo, desenvolvendo-se, evoluindo, interagindo com
fornecedores e clientes, em parcerias, atendendo a uma demanda de um indivíduo,
um grupo ou sociedade, gerando empregos, proporcionando felicidade para si e
para os outros, contribuindo com o seu trabalho para a humanidade, e é isso que
conecta todos os homens de bem no mundo. Há algo mais digno do que isso?
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