"Eu não sei a chave para o sucesso, mas a
chave para o fracasso é tentar agradar a todos."
Bill Cosby
A Sublime Ordem Maçônica sempre teve como um de
seus pilares a exaltação da razão e o combate à sua ausência, ou seja, a
ignorância, a intolerância e o fanatismo.
A coerência, um fruto da razão, é a relação lógica
e não contraditória entre as ideias. Seguindo uma retórica dedutiva, seria
“coerente” supor que o maçom, enquanto ser pensante deve ser “coerente” em suas
escolhas. Porém, infelizmente, não se pode esperar isso de todos.
O uso da razão gera conhecimento, e o conhecimento
é necessário para a busca da coerência. Entretanto, se você não usa a razão ou
não detém o conhecimento determinado, não há como ser coerente.
Há aqueles que querem agradar a todos. Contudo, o
oposto da razão, como se sabe, é a emoção. E agradar é, em sua natureza, uma
ação emocional. Com isso, corre-se o risco de ser incoerente.
Há também aqueles que não possuem o conhecimento
necessário para a ação, realizando assim ações não racionais. E ações não
racionais também tendem a serem incoerentes. E sendo as Obediências maçônicas
organizações dirigidas por homens, o perigo de decisões “para agradar” ou “por
desconhecimento”, que se mostrem decisões incoerentes, circunda a todo o
momento. Contudo, o maçom não precisa coadunar com tais incoerências.
A incoerência está presente na Maçonaria Brasileira,
principalmente quando se trata da adoção de Ritos:
O Rito Adonhiramita é um importante rito na
história da Maçonaria Brasileira. Porém, há um conflito entre o Rito e um dos
25 Landmarks de Mackey. Ora, nenhuma Obediência é obrigada a
adotar as versões de Mackey, havendo várias outras versões de Landmarks não
conflitantes. Mas adotar os Landmarks de Mackey ao mesmo tempo
em que se trabalha no Rito Adonhiramita é uma grande incoerência. Ou Mackey
está errado, ou o Rito é errado. Considerar os dois corretos é impossível.
Ainda sobre o Rito Adonhiramita, o qual tem origem
francesa, sabe-se que, tendo por um dos principais motivos as duras críticas
das quais o rito era alvo, o Rito Francês ou Moderno surgiu na França para
substituí-lo, e isso foi devidamente feito.
Em outras palavras, o Rito Moderno foi considerado
pelos franceses como uma evolução, em detrimento do Rito Adonhiramita, o qual
foi descontinuado. Nada impede de uma Obediência discordar dos franceses e
adotar o Rito Adonhiramita.
Porém, adotá-lo concomitante com o Rito Moderno, o
qual veio substituí-lo, é incoerente. Uma incoerência histórica. Ao considerar
o Rito Adonhiramita como correto, tem-se logicamente a criação do Rito Moderno
como desnecessária.
Por outro lado, ao considerar o Rito Moderno como
correto, o Adonhiramita passa a ser obsoleto.
O próprio Rito Moderno também tem seus conflitos.
Em 1817, quando passou pela reforma doutrinária no Grande Oriente da França, o
qual suprimiu a obrigação da crença num Ser Supremo, a reação da Grande Loja
Unida da Inglaterra foi rápida e drástica, declarando a irregularidade daquela
Obediência, rompimento que dura até os dias de hoje.
Considerar a decisão do Grande Oriente da França
como justa é considerar a decisão da Grande Loja Unida da Inglaterra como
injusta, ou o contrário. Tendo o Rito Moderno como símbolo da maçonaria
francesa adogmática e o Ritual de Emulação como símbolo da maçonaria inglesa
teísta, é evidente que seus princípios são conflitantes.
Outra clara incoerência é adotar o Rito Escocês Retificado
numa mesma Obediência que adota o Rito Escocês Antigo e Aceito e o Rito
Schroeder. Nada contra o RER, mas não se pode ignorar o fato de que o RER é
incompatível com o REAA e com o Schroeder.
O constructo do RER, inclusive de seu nome,
baseia-se na ideia de que o REAA desviou-se do caminho correto, de sua origem
templária, e que o RER veio resgatar isso, ou seja, veio, também sobre a
estrutura do Rito de Heredom, corrigir os erros do REAA. Outra questão
importante é que o RER é baseado no Rito da Estrita Observância, rito esse que,
por conta de seu distanciamento da Maçonaria Operativa e de seu misticismo
exacerbado, motivou o surgimento do Rito Schroeder para substituí-lo. Em outras
palavras, se o RER é correto, então o REAA é errado e a criação do Schroeder
foi indevida.
Uma mesma Obediência abrigar Adonhiramita com
Moderno, Moderno com Emulação, e Rito Escocês Retificado com REAA e Schroeder,
é algo incoerente, mas logicamente justificado como resultado de decisões
condescendentes de seus dirigentes ao longo da história, fruto daquele desejo
de agradar a todos, e revestido pelo conceito de “Colégio de Ritos”.
Por outro lado, os maçons não podem ignorar
completamente as histórias e filosofia própria de cada rito, praticando-os de
forma ignóbil e superficial, desconsiderando seus princípios e suas histórias
em nome de uma visão pseudo-holística, praticando simultaneamente ritos e
rituais originalmente conflitantes.
Nenhuma desculpa histórica local ou fraterna
justifica incoerências lógicas. Também não se está discutindo aqui o poder e
querer, a legalidade ou a regularidade. Apenas deve-se levar em consideração
que, sendo a Maçonaria uma organização baseada na Razão, não é isso que muitas
vezes seus adeptos têm refletido.
Cada maçom, sendo homem livre e dotado de razão,
tem a capacidade de fazer o que às vezes os gestores da instituição não o
fazem, tentando ser coerente em suas escolhas e atos, em vez de querer agradar
a todos.
Por fim, antes que alguém diga que tudo é
Maçonaria, tudo é lindo, e são apenas caminhos diferentes que levam ao mesmo
lugar, devemos mostrar também a imensa incoerência de tal justificativa: se
assim for, sejam coerentes com tal pensamento e aceitem todas as centenas de
Ritos e Obediências que existem por aí como regulares, pois “é tudo Maçonaria”.
Caso contrário, usem a peneira corretamente, sem relativismo, inclusive nos
Ritos.
Fonte:www.noesquadro.com