O Venerável-Mestre eleito de uma loja maçônica é o detentor de obrigações e direitos regulamentares e constitucionais e responde, perante a assembleia da loja, em primeira instância, e perante a obediência, em última, por todos os atos que praticar ou deixar de praticar. Representante máximo do povo maçônica da loja tem os seus deveres traçados no Regulamento Geral da Federação, nos Estatutos da loja e em outros diplomas legais, a eles devendo ficar adstrita a sua atuação como administrador e orientador da loja.
No cumprimento de suas obrigações, o V.’. M.’. deve levar em consideração que é o depositário de valores intrínsecos e abstratos, concedidos pelos maçons da loja, tais como a confiança, a solidariedade, a harmonia e a eficiência. Além disso, seu norte mais importante é a obtenção de um estado de felicidade que se caracteriza pela harmonia plena entre os irmãos, pela aferição de conhecimentos maçônicos, pelo bem-estar dos obreiros nas sessões de loja e nas comemorações coletivas, pelo prazer de uma convivência sadia e isenta de conflitos de qualquer natureza.
Não tendo poderes mágicos ou divinos, o V.’. M.’.depende dos irmãos que escolheu como auxiliares diretos para a condução das obrigações administrativas e para o cumprimento dos compromissos assumidos com a obediência. Ele também se vale dos irmãos – mestres instalados, em particular, pela sua experiência – para difundir a luz da obra maçônica, através dos trabalhos que os obreiros apresentam em loja ou que são oferecidos por outros meios.
Claro está que, como intérprete dos anseios do quadro de obreiros, ele tem que tomar decisões nem sempre fáceis, muitas vezes dando solução a problemas insolúveis ou contornando dificuldades para evitar que as asperezas dos caracteres e temperamentos individuais causem mossa à harmonia que deve reinar entre os irmãos.
A tomada de decisão, por si só, é solitária, indivisível e
indelegável. É, ao mesmo tempo, um privilégio e um desafio à inteligência e aos
conhecimentos de maçonaria que o V.’. M.’. detiver. E, como acontece na maioria
das vezes, a sua opção decisória pode não ser agradável para todos, o que, de
fato ocorre com uma frequência compreensivelmente humana.
Ao decidir, o V.’. M.’. considera, obrigatoriamente, além das injunções legais, os reflexos que a sua decisão projetará sobre o coletivo da loja, analisando, à luz de sua experiência maçônica, de sua formação ética e moral e de seu senso de equidade e justiça, com vistas à adoção de uma linha de conduta que não se afaste dos anseios e esperanças coletivos nem deixe ao sabor do acaso os assuntos cuja relevância mereçam sua atenção especial. Neste afã, o V.’. M.’. tem que refletir pensar, considerar, sopesar, avaliar cada pormenor do assunto em tela, a fim de identificar todas as consequências dos seus atos, o que elas representarão para cada um dos irmãos diretamente interessados e para a loja como um todo.
Tomada a decisão, o V.’. M.’. arrosta as consequências do que tiver optado fazer. Em geral, as decisões administrativas, fortemente calcadas nos preceitos constitucionais e regulamentares, não causam mossas à harmonia da egrégora. Se, porém, os assuntos administrativos vierem eivados de conotações interpretativas pessoais, como os preconceitos e as opiniões individuais, ou estiverem carregados de malícia, ainda que não intencional, é quase inevitável que surjam contestações às suas decisões, particularmente quando os interesses em jogo transbordam do conteúdo meramente maçônico e espraiam-se sobre as posições individuais.
Nessas horas, decidir significa, sempre, abrir caminho para o
litígio, quando houver razões de direito em jogo, ou para a contenda entre
irmãos, quaisquer que sejam os campos do comportamento em que venham a ocorrer.
Em face dessas dificuldades nativas do processo decisório, o V.’. M.’. sempre busca a maior quantidade possível de opiniões e pareceres, quando for nítida a multiplicidade de escolhas à sua disposição, na tentativa de selecionar o curso de ação mais consentâneo com a sua obrigação juramentada de mantenedor da harmonia, da paz e da ordem. Ouvidos os irmãos, o V.’. M.’. dá início à análise do caso, dando atenção a cada pormenor e grupando razões e direitos de forma a ter, por fim, uma luz sobre o caminho a seguir. Isso feito elabora a sua decisão, anuncia e coloca em prática, independentemente das possíveis sequelas emocionais ou sentimentais que fiquem naqueles que foram contrariados.
Aí, entra em cena o principal fator de discórdia e de conflitos em loja: a intolerância. Tendo dificuldade para perceber exatamente o que está em jogo, alguns irmãos podem, em dado momento, discordar de uma decisão do V.’. M.’., por lhe parecer absurda, incompatível, não regulamentar, não maçônica ou inadequada para a loja.
Todos os irmãos podem e devem ter a sua opinião sobre
quaisquer assuntos que incidam sobre suas mentes. Todos podem e devem
contribuir para que o caminho afinal adotado seja o melhor possível para a
ordem maçônica e para a loja. Com a consciência dessas premissas, alguns irmãos
sentem-se no direito de contestar algumas decisões do V.’. M.’, a fim de que os
rumos selecionados para a loja sejam modificados. Esse direito existe e é real,
podendo e devendo ser exercido, respeitada a constituição, o regulamento, os
usos e os costumes da ordem, que sempre deverão ser preservados.
A forma de expressar a discordância pode variar, de um irmão para outro, alguns preferindo expressarem-se oralmente, em loja aberta; outros, em particular; e outros, por fim, escolhendo a forma escrita. Em qualquer caso, o irmão sabe que o processo decisório existe, é utilizado pelo V.’. M.’., que se cerca de todos os cuidados que tal procedimento exige e produz uma decisão que significa uma tomada de posição visando a atingir os propósitos maiores da maçonaria.
Por isso, ao apresentar a sua discordância, o irmão levará em
conta, sempre, que o V.’. M.’. nada mais é do que um mestre maçom investido de
um cargo, com todas as obrigações e prerrogativas que lhe são cominadas.
Presumir que, ao tomar a decisão, o V.’. M.’. agiu intencional e
capciosamente, de forma dolosa, para frustrar possíveis intenções ou opiniões
é, no mínimo, uma atitude inadequada, pois atribui ao V.’. M.’. um conjunto de
deméritos que não são, necessariamente, suas características.
Se, ao apresentar as suas críticas, o irmão lança mão de vocábulos cortantes, enfatizados pela eloquência de um bom orador, as acusações assacadas tomam cores de verdade, colocando o V.’. M.’. em situação defensiva incompatível com a dignidade do cargo e com a nobreza da maçonaria.
O dom da oratória não assegura a quem fala a veracidade do que
disser, nem a autenticidade de sua invectiva. Ao contrário, ilude aos incautos,
mas não passa pelo crivo do bom observador, que reconhece, em cada frase, o seu
exato sentido e suas intenções, claras e ocultas. Vociferar contra a autoridade
é prática comum entre os políticos, que impressionam seus eleitores pela
empolgação com que defendem suas ideias, sejam elas boas ou más, mas não se
coaduna com a prática maçônica, pois incluem, no discurso, inverdades
disfarçadas por uma retórica habilmente manipulada, contrariando os princípios
sobre os quais se assentam nossos fundamentos.
Além disso, quando apresentado o discurso em loja de aprendiz ou
companheiro, prejudica a compreensão desses mesmos fundamentos pelos noviços,
levando-os a um estado de perplexidade e estupefação que, com muita facilidade,
pode fazê-los duvidarem do acerto de sua decisão de entrar para a maçonaria.
Afinal de contas, pensarão, é com insultos que se tratam os mestres entre si? E
o amor fraterno que deveria ter sido desenvolvido pelos anos de convivência
onde fica? Será que o V.’. M.’. é um calhorda que, por trás das cortinas,
manipula a loja ao seu bel prazer? Se isso for verdade, a quem ele está
beneficiando e de que forma? Ou será ele um incompetente, guindado ao cargo
maior por bondade ou incúria de seus pares?
O prejuízo que tais pensamentos, provocados pelo excesso de veemência cometido pelos oradores em loja, trazem aos aprendizes e companheiros, é irremediável. Mais tarde, quando os que permanecerem forem mestres, procederão da mesma forma e a loja passa a ser um local desagradável, aonde os irmãos vão para desabafarem suas frustrações e para se digladiarem em jogos de poder incompreensíveis e perturbadores. É por essa razão que os assuntos mais delicados, que possam ser causadores de discussões, são levados para a câmara do meio, onde os mestres terão mais liberdade para se expressarem, ainda assim com as limitações ditadas pela fraternidade, pela boa educação, pelas normas do bem viver e pela cortesia.
Claro está que, em loja, a palavra à bem da ordem e do quadro deve ser livre, podendo, cada um, expressar-se como quiser, respondendo pelos excessos que cometer. Ora, é claro que, daí, se depreende que é necessário saber querer usar a expressão oral, a retórica, os dons de oratória e a verbosidade, para repassar a ideia desejada. O que deve ser banido é o uso das palavras cortantes e agressivas, como traidor, traição, logro, mistificação e tantas outras, para definir atitudes que, certas ou erradas, passam muito longe desses significados.
Finalmente, é bom lembrar que os processos intimidatórios incluem os discursos agressivos, desafiantes, que procuram colocar o V.’. M.’. em situação de embaraço, desconforto ou insegurança. Esses processos não causam nenhum bem à maçonaria e devem ser substituídos por atitudes mais pró-ativas, mais geradoras de soluções e mais criadoras de harmonia e bem-estar, como são as que se valem de palavras comedidas, a inquirição correta e ordenada, especificamente orientada, a postura cordial e amiga, característica das relações entre os maçons.
Para os casos em haja uma suspeita real de fraude, dolo, logro,
traição ou outra atuação ilegal ou irregular, o maçom deve preferir a
entrevista privada com o V.’. M.’. ou a denúncia, por escrito, ao Guarda da
Lei, para que um processo formal seja instaurado e o V.’. M. responda
oficialmente por seus atos, sofrendo as penalidades que merecer. Deixar de
assim proceder é demonstrar a intenção inequívoca de que está em jogo uma
opinião ou um conceito pessoal e não o interesse da loja, coletivamente
considerada.
José Prudêncio Pinto de Sá – M. I.
GOB 122.900
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