A PEDRA E SEU NOVO DESPERTAR


Esta era uma pedreira enorme, com grandes vetas de todos os distintos tipos de pedras, havia nela, desde o rude granito até o apreciado mármore.

Todas as pedras comuns invejavam as pedras finas, pois elas seriam escolhidas pelos grandes artistas e escultores e, iriam morar em grandes palácios e mansões convertidas em magníficas obras de arte ou pisos lisos e colunas de mármore.

As pedras sabiam que elas nunca seriam as escolhidas para isto e aceitavam seu destino. Mas, isto não significava que não se cobrissem de pó para intentar clarear sua cor e ser mais parecidas ao invejado mármore ou que deixassem que o barro preenchesse as imperfeições de seus rugosos contornos para ocultá-los.

Todas elas diziam vir de vetas muito próximas às do mármore e por isto pertencer àquela linhagem em sua estrutura. Era uma sociedade pétrea como qualquer outra sociedade comum, com as classes baixas querendo se parecer às altas.

Aquela era uma pedra a mais do montão, não tinha uma estrutura comum, mas certamente tampouco era de mármore, ela também se cobria às vezes com pó e barro para se retocar, mas o fazia mais pelo que diriam as pedras da vizinhança do que pelo que ela realmente sentia. Embora em silencio invejasse as pedras lisas, posto que elas fossem as que iriam morar em suntuosos palácios, enquanto ela continuaria sempre em aquela comum e empoeirada pedreira. 

Todos os dias vinham renomados artistas em suas finas charretes de cedro lavrado, puxadas por elegantes e briosos corcéis, escolhiam os melhores mármores e os colocavam com o maior cuidado no piso aveludado de suas charretes, logo partiam imaginando em suas mentes as maravilhosas obras de arte que fariam, enquanto que aquelas pedras escolhidas se despediam de suas congêneres fazendo notar o êxito que agora alcançaram. 

Mas certo dia passou pela pedreira um ancião a quem ninguém nunca tinha visto antes, mas, aquele homem já conhecia as pedras, pois esteve observando a pedreira desde longe durante muito tempo, antes de decidir se aproximar de uma.

O ancião protegia suas roupas com um avental de couro branco, amarrado às costas, muito desgastado pelo uso continuo, ele não era nenhum artista renomado, pelo contrario, um simples obreiro que se aproximou com passo decidido, escolheu aquela pedra, a subiu na sua envelhecida charrete, cobrindo-a com uma manta, e ajudado pelo seu burro a levou até sua oficina.

A pedra estava muito assustada, pois ainda não compreendia o que acontecia, pensava que talvez o ancião por ser muito velho, a teria confundido com uma pedra de fina classe ou pior, por um mármore, e temia pelo seu futuro social quando fosse devolvida à pedreira logo que o obreiro se desse conta de sua pouca valia. 

Já na oficina do ancião, este a descobriu e a limpou do pó e barro que a cobriam, sentiu-se nua, sem aquele disfarce, e ao se acostumar à penumbra do lugar viu com horror que ao seu redor haviam muitas pedras muito trabalhadas e polidas, alem de finíssimos mármores, “serei o faz-me-rir” pensou, deveria sentir-se tosca e sem valor, mas por alguma estranha razão não se sentia assim, algo em aquele ancião a fazia se sentir segura e ademais estavam àquelas pedras, que em vez de orgulhar-se de suas linhagens e menos prezá-la como se acostumava fazer na pedreira, a olhavam com afeto. Apesar de haver tantas pedras, o ambiente era cálido e agradável. 

O ancião se aproximou dela e lhe disse que ela estava destinada a uma obra muito importante, mas a pedra não acreditava nas palavras do ancião, ela era uma simples pedra tosca como tantas outras e ademais nessa oficina tinham pedras melhores, mas o homem continuou falando e lhe disse que agora não havia como voltar atrás, ele a tinha escolhido dentre as demais, não por sua aparência externa, senão porque estava seguro que a estrutura interior dela era forte e apropriada para o trabalho que necessitava lhe disse também, que poria seu melhor empenho em prepará-la, tal como o fez com as outras pedras que passaram pela sua oficina, mas sempre existiria o perigo de se a pedra não fosse à adequada, se quebraria durante o processo. 

'Embora vá te golpear não deveis temer' - lhe disse o homem - 'eu vou dirigir meus golpes aonde os necessites para ir desbastando tua superfície, mas você deverá estar disposta a recebê-los e aceitar o cambio, de outra maneira poderás rachar interiormente e já não serás útil'.

E assim a pedra começou a receber os golpes do cinzel que, habilmente a ia desbastando empurrado pelo maço do ancião, a pedra ia aceitando cada golpe que lhe arrancava parte de se mesma, esforçando-se em adaptar-se ao seu novo ser. 

Passaram-se muitos dias e o ancião continuava trabalhando, e embora a pedra agora luzia seus lados retos, isso já não parecia importar-lhe, em outros tempos tivesse menosprezado a suas toscas congêneres da pedreira, mas agora somente lhe importava ficar pronta para realizar esse trabalho tão importante, e tal como ela fosse tratada ao chegar à oficina, recebia com afeto as novas pedras que chegavam, embora fossem tão ou mais toscas como ela foi ao principio. 

Quando a pedra ficou pronta, o ancião a conduziu a um terreno baldio grande e a colocou no sentido nordeste e lhe disse que estava ali não só para ser a primeira pedra, senão que ademais seria o suporte da principal coluna estrutural da imensa catedral que ali se construiria, ela suportaria o peso das outras pedras, as quais por sua vez sustentariam os decorativos mármores. 

Se a pedra assimilou de coração o trabalho do ancião, sua estrutura estaria preparada para a grande missão, de outro modo, ao falhar a pedra, toda a catedral viria abaixo. 

Centos de obreiros de distintas nacionalidades começaram a chegar de todos os confins do mundo, trazendo consigo cada um, uma pedra para a catedral, já lavrada e polida em suas próprias oficinas.

Todas elas foram se encaixando uma a uma com assombrosa perfeição, como se o mesmo pensamento tivesse guiado a mão de todos os obreiros por igual.

Era uma obra magnífica, talvez a catedral mais bela, grande e imponente do mundo, milhares de pessoas vinham diariamente de cada canto da terra, somente para contemplar tamanha beleza. 

As pessoas se regozijavam em seu esplendor e saiam gratificadas com a paz espiritual que aquela vista produzia. Mas ninguém nunca via a pedra, nem sabiam de sua importante missão, nem que ela era o pilar principal da catedral.


E como ninguém percebia a pedra, ninguém reconhecia seu importantíssimo trabalho, mas isto à pedra não lhe importava, ela sabia o que fazia e não o fazia certamente por reconhecimento, a pedra era simplesmente feliz, sabendo que seu trabalho brindava paz e alegria as pessoas e isto era para ela recompensa suficiente, seus pensamentos já não eram materiais, ela tinha despertado para uma nova vida mais frutífera espiritualmente, ela tinha sido abençoada com um novo despertar. 

Dedicado a quem escolheu minha pedra. 

Autor: Ir.’. Juan A. Geldres AMARLS Fraternidade e Justiça 142 Lima – Peru

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