Solicitar a iniciação não é algo superficial. É necessário firmar um
pacto.
A verdade não tem firma estampada, visível e externa, não vai aposta com
uma pena empapada de sangue, senão que moral e imaterial, comprometendo
puramente a alma consigo.
Não se trata aqui de um pacto com o diabo, espírito maligno e, por
certo, fácil de enganar, mas, na realidade, trata-se de um comprometimento
bilateral e muito sério, cujas cláusulas são iniludíveis. Os iniciados, com
efeito, contraem deveres muito sérios com o discípulo que admitem em seus
templos e este fica, por sua vez, unicamente pelo ato de sua admissão, ligado
de modo indissolúvel a seus Mestres.
Seguramente, é possível enganar nossos Mestres e burlar-lhes as
esperanças ao nos revelarmos maus discípulos, depois de lhes haver feito
conceber grandes esperanças. Mas toda experiência resulta instrutiva e, por
dolorosa que seja, ensina-nos a prudência; quem resta, ao final, confundido é o
presunçoso que quis empreender uma tarefa superior às suas forças.
Na verdade, se sua ambição limita-se a luzir as insígnias de uma
associação iniciática como a Franco-Maçonaria, pode, com pouco dinheiro,
pagar-se esta satisfação. Mas as aparências são enganadoras e, do mesmo modo
que o hábito não faz o monge, tampouco pode o avental fazer por si só o Maçom.
Ainda que alguém fosse recebido na devida forma e proclamado membro de
uma Loja regular, poderia ficar para sempre profano no que se refere ao seu
interior. Uma fina capa de verniz iniciático pode induzir em erro as mentes
superficiais, mas não pode, de modo algum, enganar o verdadeiro iniciado. Não
consiste a Iniciação num espetáculo dramático nem aparatoso, sem que sua ação
profunda transmute integralmente o indivíduo.
Se não se verificar em nós a Magna Obra dos hermetistas, seguiremos
sendo profanos e jamais poderá o chumbo de nossa natureza transmutar-se em ouro
luminoso. Mas quem seria bastante crédulo para imaginar que tal milagre pudesse
ter lugar em virtude de um apropriado cerimonial? Os ritos da iniciação são
apenas símbolos que traduzem, em objetos visíveis, certas manifestações
internas de nossa vontade, com a finalidade de ajudar-nos a transformar nossa
personalidade moral. Se tudo se reduzisse ao externo, a operação não daria
resultado: o chumbo permanece chumbo, ainda que recoberto de ouro.
Entre os que lerem estas linhas, ninguém, por certo, há de querer ser
iniciado por um método galvanoplástico. O que se chama toque não se aplica à
Iniciação. O iniciado verdadeiro, puro e autêntico não se contenta de um verniz
superficial: deve trabalhar ele mesmo, na profundidade de seu ser, até matar
nele o profano e fazer com que nasça um homem novo.
COMO PROCEDER PARA OBTER ÊXITO?
O Ritual exige, como primeiro passo, que se despoje dos metais.
Materialmente, é coisa fácil e rápida; sem embargo, o espírito se desprende com
dificuldade de tudo quanto o deslumbra. O brilho externo o fascina e é com
profundo pesar que se decida a abandonar suas riquezas. Aceitar a pobreza
intelectual é condição prévia para ingressar na confraternidade dos Iniciados,
como também no reino de Deus.
Ser consciente de nossa própria ignorância e rechaçar os conhecimentos
que acreditamos possuir são o que nos capacita a aprender o que desejamos
saber. Para chegar à Iniciação, é preciso voltar ao ponto de partida do próprio
conhecimento, em outros termos: à ignorância do sábio que sabe ignorar o que
muitos outros figuram saber, quiçá demasiado facilmente. As ideias
preconcebidas, os preconceitos admitidos sem o devido contraste falseiam nossa
mentalidade. A iniciação exige que saibamos desprezá-los para voltar à candura
infantil ou à simplicidade do homem primitivo, cuja inteligência é virgem de
todo ensinamento pretensioso.
Podemos pretender o êxito completo? É, desde logo, muito duvidoso; mas
todo sincero esforço nos aproxima da meta. Lutemos contra nossos preconceitos,
buscando nos livrar de nós mesmos; sem pretender atingir uma libertação
integral, este estado de ânimo favorecerá nossa compreensão que se abrirá,
assim, às verdades que nos incumbe descobrir, principiando nossa instrução.
Em primeiro lugar, o desenvolvimento de nossa sagacidade. Ser-nos-ão
propostos enigmas, a fim de despertar nossas faculdades intuitivas, posto que,
antes de tudo, devemos aprender a adivinhar. Em matéria de iniciação, não se
deve inculcar nada, nem se impor nada, ainda que com o mínimo espírito. Sua
linguagem é sóbria, sugestiva, cheia de imagens e parábolas, de tal maneira que
a ideia expressa escapa a toda assimilação direta. O iniciado deve negar-se a
ser dogmático e guardar-se-á de dizer:
“Estas são minhas conclusões; acreditai na superioridade de meu juízo e
aceitai-as como verdadeiras”. O iniciado duvida sempre de si mesmo, teme um
possível equívoco e não quer se expor a enganar os demais. Assim é que seu
método remonta até o nada saber, à ignorância radical, confiando em sua
negatividade para preservar-lhe de todo erro inicial.
Entre os que pretendem ser iniciados, por se haverem empapado de
literatura ocultista, quantos haverão de saber depositar seus metais? Se eles
faltam, de tal sorte, ao primeiro de nossos ritos, é de todo ilusório o valor
de sua ciência, tanto mais mundana quanto mais originária de dissertações
profanas.
Tantos quantos tentaram vulgarizar os mistérios, profanaram-nos; e os
únicos escritores que permaneceram fiéis ao método iniciático foram os poetas,
cuja inspiração nos revelou os mitos, e os filósofos herméticos, cujas obras
resultam de propósitos ininteligíveis à primeira leitura.
A iniciação não se dá nem está ao alcance dos débeis: é preciso
conquistá-la e, como o céu, só a conseguirão os decididos. Por isso se exige do
candidato um ato heroico: deve fazer abstração de tudo, realizar o vazio em sua
mente, a fim de logo poder criar seu próprio mundo intelectual, partindo do
nada e imitando Deus no microcosmo.
Oswald Wirth