REFLEXÕES SOBRE REDES SOCIAIS E MAÇONARIA

As redes sociais se constituem em hábito presente na vida de todos nós, atraindo cada vez mais e mais usuários, especialmente entre jovens já nascidos na era da mobilidade digital. Não se trata de “modismo”, mas de comportamento definitivamente incorporado na vida de um número cada vez maior de pessoas. 

Criou-se uma espécie de dependência dessa forma de interação interpessoal, não presencial e imediata. Em qualquer lugar e com apenas um clique pode-se entrar em contato com uma, várias ou centenas de pessoas.

Recente publicação de “O Globo” ([1]) dá conta de pesquisa feita na Universidade de Pittsburgh, com quase dois mil adultos americanos de idade entre 19 e 32 anos, revelando que quanto mais tempo as pessoas passam navegando por plataformas como Twitter, Face book, Istagram, Linkedln, Whatsapp e outras maiores são as chances de elas experimentarem uma sensação de isolamento social.

Esse é um fenômeno observado desde a década de 1.990, quando estudos começaram a constatar o chamado “paradoxo da Internet”, ou seja, a contradição entre a extrema facilidade e de se manter contato virtual com tanta gente, por intermédio das redes, e a “ausência real de contato humano”. Ou seja: mais tempo “on-line”, menos tempo no mundo real.

É compreensível, mesmo ao leigo, essa relação direta entre o aumento do uso da Internet e o isolamento. Algumas pesquisas constataram que essa prática também aumenta a sensação de angústia, ansiedade, inveja, frustração e estresse, o que torna a coisa toda, um problema de saúde. Contudo, as conclusões desses estudos também apontam para o fato de que os malefícios advindos do uso das redes dependem da forma como os usuários se envolvem com essas plataformas. 

O que se poderia afirmar, com alguma segurança, é que, se alguém utiliza as redes para estimular e aumentar contatos reais com outras pessoas, isso será sempre saudável, do ponto de vista individual e social.

De todo modo, essa não é uma questão simples. Ao contrário, é complexa demais para ser tratada neste artigo, mesmo porque o mérito dessa questão não é o objetivo ora proposto. Também não se cogita, aqui, do uso das mídias nas relações institucionais, pois, neste ponto, a Ordem e sua estrutura organizacional se utilizam 
das ferramentas e tecnologias como qualquer outro empreendimento, público ou privado.

O que realmente interessa, neste artigo, é fazer algumas reflexões sobre o uso das redes sociais pelos maçons, enquanto irmãos, e as suas relações com a vida maçônica e, destacadamente, confrontar com as tradições da fraternidade e da existência necessária da Loja Maçônica, como centro de união e lugar de “encontro real” entre seus obreiros.

Nesse sentido, deve-se reconhecer, desde logo, o aspecto positivo que as redes sociais proporcionam à fraternidade maçônica, dada a rápida interação dos irmãos entre si e com as atividades da sua Loja e fora dela. Isso vale especialmente nas grandes cidades, onde a mobilidade urbana é fator que sempre dificulta encontros presenciais, os quais, por isso mesmo – e quase sempre –, acabam por se restringir às sessões maçônicas, ordinárias ou não, e eventos importantes organizados pela Loja no plano maçônico, familiar ou social.

Em algumas plataformas, como é o caso do Whatsapp, essa facilidade de interação, para além do contato individual, apresenta pelo menos duas outras vertentes bastante comuns entre os membros de uma mesma oficina: a) um grupo específico para tratar exclusivamente de assuntos afetos à administração da Loja e do seu quadro de obreiros; e, b) um ou mais grupos onde os irmãos postam livremente aquilo que lhes parece oportuno dentro do espírito para o qual esse determinado grupo foi criado. Nestes últimos, a boa camaradagem e mesmo o bom humor são fatores importantes para agregar e manter presente o espírito daquela fraternidade em particular.

Óbvio que as observações feitas acima não esgotam as possibilidades de uso de tais redes pelos irmãos de uma Oficina, pois não raro se expande e pode interessar a outros tantos membros de outras tantas Lojas, independentemente de suas respectivas Potências, sejam elas nacionais ou não. Nesse amplo espectro, não seria de todo equivocado reconhecer que as redes sociais, assim utilizadas por maçons, poderiam reafirmar, na prática, aquele princípio de “universalidade da instituição maçônica”, bem como o sentimento de “pertencimento a uma grande família”, cujos membros, em comum, cultivam os mesmos rituais, valores e tradições.

Está claro, também, que as redes sociais propiciam novos espaços e possibilidades na comunidade maçônica. Além disso, podem, ainda, ser utilizadas para incrementar novas metodologias na produção de atividades culturais e na elaboração de trabalhos doutrinários ou filosóficos, tudo dependendo, apenas, da criatividade dos irmãos que busquem empregá-las de forma inteligente.

Nesse sentido, a Loja Harmonia e Trabalho, 222, iniciou interessante experiência no campo da produção maçônico-cultural, criando grupos de whatsapp e de e-mail, para propor e desenvolver pesquisas sobre temas específicos (História da Maçonaria, Filosofia, Simbologia, Doutrina, Ritualismo, Práxis maçônica, ou mesmo de comentários de lições dos diversos graus).

Cada grupo conta com seu respectivo coordenador, mas o planejamento da pesquisa e a divisão de tarefas são previamente definidos, de forma que cada um contribua com a parte da pesquisa que lhe cabe e apresente suas conclusões para debate com os seus pares. 

A facilidade está em que a apresentação e desenvolvimento dos temas são apresentados, pela mídia, aos demais participantes do grupo, para análise, comentários e discussão, até a formatação do texto final. Com isso, as ideias são ordenadamente desenvolvidas, debatidas e compartilhadas por todos, coisa que seria bem mais difícil, caso se tivesse de marcar reuniões presenciais com os integrantes, para apresentação de resultados e o necessário debate antes da conclusão do trabalho.

Enfim, mediante essas metodologias, as redes podem ser mais um importante elemento de integração entre os irmãos, em torno da valorização da cultura maçônica, preparando ambiente pedagógico para aqueles que vierem a compor futuramente os quadros da Loja. Desnecessário dizer que isso melhor orientará as ações do mundo profano, com base no conhecimento mais aprofundado dos princípios da nossa Sublime Instituição.

Certamente, essa ideia não é original e deve estar sendo explorada algures. Entretanto, o que importa encarecer é o fato de que essas novas metodologias e ferramentas virtuais se constituem, também, em mais um estímulo para aprofundar os conhecimentos da fraternidade, a par dos tantos outros métodos tradicionais e ritualísticos que fazem parte da própria essência evolutiva do ensinamento maçônico.

Para encerrar estas reflexões, cumpre retornar às considerações iniciais acerca da relação, observada por especialistas, entre o uso das redes sociais e o isolamento social. De fato, as redes aproximam as pessoas, mas, como isso ocorre de forma virtual, acaba comprometendo o envolvimento real e afetivo, se mantido apenas naquele nível superficial.

As redes vieram para ficar e são úteis e práticas para manter contatos com velhos e novos amigos, com colegas de trabalho ou com pessoas que sequer conhecemos pessoalmente, tornando tudo e todos mais próximos de nós como jamais estiveram. “Porém estamos ajudando menos aqueles que são próximos de nós, não sabemos nomes de vizinhos e pessoas com as quais convivemos, nossa rede de relação (física) cai vertiginosamente quando ainda temos 20 anos (idade considerada como auge da juventude). Em suma estamos nos distanciando daqueles que estão perto, para nos aproximarmos daqueles que estão longe.” ([1])

Neste contexto, impossível não cogitar e reafirmar a existência necessária da Loja Maçônica, enquanto “tempo e lugar” de encontro entre irmãos para aprofundarem, entre si, o conhecimento recíproco, como seres humanos iniciados na Arte Real. Definitivamente, não se concebe Maçonaria tradicional sem o “tempo-espaço” da Loja, onde os maçons se congregam e trabalham ritualisticamente. 

Por isso as Obediências reconhecidas internacionalmente como regulares advertem que, embora haja sites nesse sentido (FakeMasonary) ([2]), ninguém poderá ingressar e participar da Maçonaria pela via da internet, pois todo o processo é pessoal e exige a presença tanto na iniciação, quanto nas reuniões da Loja. ([3])

A essência da Maçonaria é aproximar os “seres humanos”, condição para construir uma fraternidade. Por isso, os primeiros artigos das Constituições dos Franco-Maçons, de 1.723, prescreveram a tolerância como virtude elementar e necessária entre pessoas que professam religiões, filosofias e ideias políticas diversas. A Loja tem sido, desde então, o lugar onde os maçons se encontram e superam suas diversidades pessoais, porque se reconhecem simplesmente como seres humanos.

Esse é o motivo pelo qual a Maçonaria há de se tornar o CENTRO DE UNIÃO e meio de conciliar, por uma amizade sincera, pessoas que teriam, perpetuamente, permanecidos separados. ([4])

Essa noção de encontro, que a Loja proporciona aos seus obreiros, é absolutamente fundamental para a existência da Maçonaria. É preciso estar presente, física e espiritualmente, nas reuniões maçônicas, porque é o encontro com outro ser humano que propicia a possibilidade de um aprendizado sobre nós mesmo. Nesse sentido, a melhor e mais profunda justificação que jamais ouvi sobre a verdadeira essência da Maçonaria talvez esteja nas palavras de Leo Apostel, quando afirma que:

Os Seres humanos, basicamente diferentes – i.é, diferentes social e psicologicamente, ideológica e emocionalmente – tentam encontrar-se em nível de intimidade, fora da sociedade civil, em um grupo fechado. Estas pessoas chamam a si mesmas de Maçons e utilizam vários rituais e mitos como instrumentos de suas reuniões. ([5])

E essas pessoas se reúnem para uma reeducação, baseada na redução do conhecimento ao puramente humano, para depois retornar ao convívio social com um sentimento de compreensão muito mais rico e fecundo. Essa interação é elementar, porque só é possível relacionar-se com outro quando aprendo a me conhecer e, vice-versa, aprendo mais sobre mim mesmo ao relacionar-me com o outro. É em presença dos irmãos, sob seus olhares, movimentos, ações e palavras que recebo suas ideias e sou influenciado por elas. Mas isso não retira de mim a minha liberdade e a minha individualidade. Aprimora-me!

A Loja Maçônica foi, é e sempre será o “espaço” e o “momento” para os maçons se encontrarem, física e espiritualmente, cultivando suas tradições obreiras, 
utilizando-se de práticas rituais, símbolos e mitos, como instrumentos de aperfeiçoamento moral e social. Em Loja, cria-se o ambiente propício para encontrar respostas que existem em cada um e em todos nós e, assim evoluir enquanto seres humanos.

E isto, jamais será possível por outra via que não seja presencial, real e não virtual. Aqui, a internet e redes sociais são inócuas e nunca poderão substituir a verdadeira iniciação e prática maçônicas. 

Por essa razão, a Maçonaria e nossas Lojas regulares são, igualmente, um porto seguro na atualidade, porque é da sua própria essência que haja o encontro pessoal, real e afetivo entre aqueles iniciados em seus mistérios, em oposição ao isolamento social, a ansiedade e estresse, que o exagerado uso das redes sociais possam eventualmente causar.

Antonio Carlos Bloes - (março/2017)
Loj“Harmonia e Trabalho, 222”

[1] - Cf. 06/03/2017, cf. em <http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/psicologos-alertam-que-uso-de-redes-sociais-pode-alimentar-solidao-21016908#ixzz4aq0pCm27>
 [2] - Cf. interessante artigo em <https://www.blink102.com.br/redes-sociais-e-o-isolamento-social>
[3] - Cf. <http://www.masonicinfo.com/fakemasonry.htm>
[4] - Cf. <http://www.masonicinfo.com/grandlodges.htm>
[5] - Cf. Constituições dos Francos Maçons ou Constituições de Anderson de 1723, Ed. Fraternidade, SP – 1982, pag. 50.
[6] - A Maçonaria – Um ensaio filosófico, Ed. Maç. ”A TROLHA” 1ª. ed., 1989, Londrina/PR, p. 11

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