“As redes sociais são muito úteis,
oferecem serviços muito prazerosos, mas são uma armadilha.” (Zygmunt
Bauman)
Com o
benefício da visão retrospectiva, temos ainda fresco na memória o cenário em
que o trato entre os irmãos se dava, notadamente, em ágapes e eventos de
confraternização maçônica. Agora, com as viciantes e infernais redes sociais
tornando-se uma unanimidade e invadindo a privacidade, as formas de comunicação
e manifestações ampliaram-se exponencialmente. Participamos de vários grupos de
bate-papos e as interações são palpitantes e, por vezes, carregadas de
contratempos e desencontros.
Em
nossa Ordem demorou menos do que pensávamos; sorrateiramente instalou-se a
controvérsia ideológica e as trocas de farpas. Nos grupos de WhatsApp é
recorrente manifestações de irmãos que afirmam ser melhor calar para que a
estupidez não se ofenda. Haja chatice e mimimi, mesmo com as reiteradas
divulgações de regras de etiqueta e de convivência em redes sociais,
incansavelmente direcionadas pelos administradores aos mais renitentes, até
utilizando o recurso de elogiar a verve dos hiperativos juramentados, na
tentativa de atingir a tão sonhada harmonia.
Os
combativos e viciados em disputas de opinião (os irascíveis de sempre), dia
sim, dia também, querem firmar suas posições amparados em sofisticada retórica,
discordando de tudo e de todos, fazendo julgamentos destrutivos de argumentos
dos quais não concordam, assumindo postura de deterem o monopólio da razão e o
malhete da censura, acreditando que a liberdade de expressão é um direito só
deles, julgando-se do lado certo da história e, quando confrontados, ameaçam
deixar o grupo denotando melindres, falta de empatia e, de plano, ainda
depreciam os discordantes. Eventualmente, para alívio geral, cumprem o
prometido, e a ausência deles preenche uma lacuna, como diz o famoso trocadilho
da citação de Stanislaw Ponte Preta:
“Há
sujeitos tão inábeis que sua ausência preenche uma lacuna.”
Porém,
como sói acontecer, reiteradamente esses adictos protagonistas não resistem
mais do que um ou dois dias e voltam rapidamente utilizando-se do link de
acesso do aplicativo, alegando que “um irmão importante e influente” ou o
próprio Venerável ligou derramando afagos convencendo-o a retornar, pois o
desafortunado faz muita falta no grupo, em face de seu elevado nível cultural e
notória sabedoria, estas raramente demonstradas em Loja, mediante apresentação
de trabalhos consistentes. Tréguas e conflitos alternam-se, basta nova postagem
provocativa e capítulos inéditos da série “não vale a pena ver de novo” voltam
à ribalta.
Nos
grupos, em geral, parte dos membros adota a locução latina: audi, vide,
tace, si vis vivere in pace. Outros tantos permanecem apenas como espiões, para
ficarem sempre bem-informados, poucos torcendo para que o circo pegue fogo e o
palhaço saia chamuscado. E é o que ocorre naturalmente, para o infortúnio de
muitos e o deleite de alguns. Aconselham os especialistas que o ideal é manter
as notificações silenciadas em determinados grupos. E se não gostar da
postagem, utilize o recurso de “apagar para mim”, que dizem ser melhor do que
ficar ruminando o conteúdo. Tal estratégia é utilizada por vários administradores
atentos que excluem, em tempo, as postagens inoportunas (“apagar para todos”),
até mesmo alertando, suspendendo ou excluindo os recalcitrantes. A alternativa
“limpar conversa” é deveras libertadora.
Quem
nunca pode constatar nos grupos de WhatsApp e em variados encontros por
videoconferência a situação de irmãos sendo elogiados por trabalhos ou
palestras e a reação daqueles que se sentem desconfortáveis e saem à francesa,
às vezes deixando no Chat ou no Grupo manifestações de desagrado por não
concordarem com algumas afirmações apresentadas ou respostas que não os
satisfizeram na integralidade? Perdem a oportunidade de defender seus
argumentos democraticamente. Em contrapartida, a Loja desses luminares segue o
destino traçado por Lewis Carroll no qual, quanto mais Alice caminha, mais
longe fica do seu destino. No caso vertente, as Lojas andam para trás ou com o
freio de mão puxado.
Essa
avaliação pode estar errada? Claro que sim! Os universos individuais compõem-se
de diferentes repertórios e as intenções nem sempre são bem captadas, mas as
bolhas se autoalimentam de uma forma ou de outra. Como adiantam os profetas do
óbvio, as consequências vêm depois.
Na
realidade, nos fóruns de debates, os discordantes tentam desacreditar todo o
processo e, em muitas oportunidades, os idealistas “pagam o pato”. A percepção
geral é de que o bom senso em torno de ideias e ideais comuns, outrora
construídos com sacrifícios pelos irmãos que nos antecederam, estão fora de
moda e vem sendo bloqueados como fruto de intolerâncias e ressentimentos,
levando à insatisfação e à desmotivação em nossas Lojas e grupos.
No
ensejo, fica um clamor aos chatos de galocha: avaliem a possibilidade de tirar
o cavalo da chuva e pregar em outra freguesia! Só que não, pois, caso
permaneçam, saibam que são amados mesmo sugando as energias do grupo, pois os
irmãos têm saco de filó reforçado pela Maçonaria que prega há mais de 300 anos
a prática da tolerância e do espírito fraternal com inspiração no Salmo 133.
Mas, lembrem-se da Regra 34 dos Beneditinos:
“É proibido resmungar! Não é proibido
discutir, debater, discordar. É proibido resmungar. Resmunga aquele que em vez
de acender uma vela, amaldiçoa a escuridão.”
Autor: Márcio dos Santos Gomes