Antes de mais, importa distinguir entre segredo, numa conotação
negativa da palavra e assuntos internos de qualquer organização, seja de que
natureza for.
Nenhuma organização é totalmente transparente existindo sempre
assuntos, processos, decisões, formas de estar e de atuar que são para consumo
interno.
Quando no mundo profano se fala de Segredos Maçônicos, faz-se normalmente
uma tripla associação: o assunto interno passa a ser segredo e o segredo é
normalmente uma coisa má; logo, os Maçons são maus.
Não é assim: nem todos os segredos são maus e nem todos os
assuntos internos são segredos. Parece existir perante a Maçonaria uma
exigência de total e absoluta transparência que não é feita para mais nenhuma
organização.
Dos Maçons, queremos saber tudo… dos outros, nem por isso.
Poucos assuntos atraem mais as atenções do que “aqueles segredos dos maçons”
que naturalmente só existem porque eles (os maçons) querem dominar tudo e
todos.
Por vezes fica-se com a sensação de que, quando qualquer
jornalista não tem mais matérias sobre o qual se debruçar ou pretende incendiar
os leitores, tem sempre a saída de meter os maçons ao barulho.
Pensa-se imediatamente em conspiração, até porque se os maçons
estão metidos, não pode ser coisa boa. Os segredos parecem atrair as pessoas.
Creio que já terá ocorrido a muitos Irmãos ao revelarem ser Maçons, serem
metralhados com perguntas discretas ou abertas, insinuações e até provocações
visando sempre saber mais; tentar descobrir o que ninguém mais descobriu ou até
gerar desconfiança pela nossa Ordem.
Mas também creio que são os segredos uma das principais razões
que levam profanos a tentar saber mais sobre nós: “quem são estes gajos que até
têm segredos???”; “isto deve ser giro”.
Rapidamente se apercebem de que somos mais do que um “Clube do
Bolinha” em que mulher não entra e que tem uns segredos formidáveis. E desse
processo de tentativa de descoberta dos segredos, nasce por vezes um genuíno
interesse pela Ordem e eventualmente um desejo de identificação e pertença que
poderá levar a uma Iniciação. Que desilusão seria se soubessem que não há
segredos, que a Maçonaria não é secreta, sendo unicamente discreta na sua atuação.
Que desilusão seria se soubessem que tudo o que há para saber
sobre os maçons, já se sabe e que pouco ou nada resta por divulgar. Talvez
esperem que nós separemos o trigo do joio e que sejamos nós a identificar entre
tudo o que está publicado, o que é verdadeiro ou não.
Talvez um dos segredos que devamos tentar manter seja
precisamente o não haver segredos. Por que o segredo? Deixem-me dar a minha
interpretação para a reserva que devemos manter sobre alguns aspectos da nossa Ordem
e vou centrar-me, sobretudo nas três cerimônias que considero marcarem o
percurso de um Maçom: Iniciação, Exaltação e Instalação.
Creio poder afirmar que por mais recheada que seja a nossa vida maçônica
e tendo todos nós provavelmente interpretações pessoais da nossa vivência
durante essas cerimônias, todos as recordamos com especial ênfase e carinho.
Destas três, destaco naturalmente a Iniciação.
É o fim de um percurso e o inicio de um novo. Mas então, se é
tão marcante, porque motivo não as divulgamos e damos assim a toda à gente a
possibilidade de vivê-las? Talvez pudéssemos até vender uns DVDs interativo ou
até mesmo um jogo de computador em que o jogador poderia ir fazendo a sua
própria cerimônia de Iniciação, talvez acompanhado pelos amigos e bebericando
umas cervejotas.
Tentemos estabelecer um paralelismo com a visualização de um
filme, sendo que existem basicamente três atitudes: Na primeira, alguém fez o
favor de nos contar o filme do princípio até ao fim… e até já sabemos quem é o
“bandido”.
Até podemos ir ver o filme, mas será tudo previsível, saberemos
de antemão o que vai acontecer a seguir e até podemos ir buscar pipocas, pois
saberemos sempre onde estamos. Todo ao fator surpresa, a descoberta e o
inesperado não estão lá.
Noutra, já lemos o livro, conhecemos a história toda,
lemos as críticas e ate já o discutimos com os amigos.
Não há aqui muito por descobrir, sendo que o filme acaba por ser
um espaço para comparações: se o filme corresponde ao livro, ou se fica aquém
ou além deste; se a opinião do amigo A faz sentido ou até se os quadros
descritos na história original estão bem retratados em filme.
Mais uma vez, o filme em si pouco importa… já sabíamos… Na
terceira, pouco sabemos. Conhecemos o título, temos uma breve ideia sobre a
história e conhecemos alguns dos atores, noutros filmes. Nesta, estamos atentos
do princípio ao fim e acompanhamos cada cena tentando absorver o mais e o
melhor possível. Este filme vai certamente deixar-nos algo.
Qual vos parece ser a melhor situação quando se trata de uma cerimônia
maçônica? Uma iniciação ou um aumento de salário, por exemplo? Numa Iniciação
Maçônica pretende-se criar um momento marcante para o Profano, algo que o
acompanhe para o resto da vida e que constitua realmente um Nascer para a Luz.
Ora isto só é possível se o Profano ainda não tiver lido o livro, nem ninguém
lho tiver contado.
Se já o tiver lido ou já conhecer o enredo, então teremos uma cerimônia
e um profano pouco focado na cerimônia. Estará ocupado a fazer comparações
(“esta parte esteve bem representada…”,) ou a gerir o enredo: “a seguir vai
acontecer isto…”, “este que está a falar é o VM.'. ou até, “falta muito (ou
pouco) para isto acabar”. No final dirá… “comparando com o que já sabia,
esperava mais (ou menos)”.
Em face de isto, diria que os tais segredos, que como
sabemos não o são, são importantes e preservá-los não é um direito nosso, mas
uma obrigação e uma dívida que temos e sempre teremos perante todos os profanos
que vierem a ser iniciados.
Devemos-lhes o direito a terem cerimônias marcantes,
inesquecíveis e com momentos que possam recordar para o resto da sua vida.
Resistamos à tentação de contar o que é para ser vivido.