POR QUÊ “ARTE REAL”?


 

O que é “Arte Real”? Coloquialmente, “Arte Real” significa a Ordem Maçônica. Mas por quê? Qual é o significado e qual a origem da expressão “Arte Real”? Por que Arte Real, informalmente, significa a Maçonaria? Há muitas variantes para esta resposta. Inicia-se pela que, creio, ser a mais apropriada, racional, erudita e perspicaz.

A Maçónica é uma arte e não envolve uma doutrina, religião ou conjunto de dogmas. A Maçonaria não ensina nenhuma doutrina ou dogma e nem deve ensiná-la e isso é um dos seus grandes méritos. É, na verdade, a arte da edificação espiritual, do aprimoramento do ser interior, à qual corresponde, simbolicamente, à arquitetura espiritual e mental. E esta edificação espiritual é feita pelo próprio Maçom, isto é, independe de dogmas ou conceitos impostos por alguém e que deve ser deglutido por imposição.

Os instrumentos maçônicos têm, pois, um sentido figurado e simbólico na obra da transmutação, isto é, na arte da formação de um novo homem.

O segredo da Arte Real corresponde, de forma simbólica, ao segredo arquitetônico dos construtores das grandes catedrais medievais. É natural, pois, que os maçons venerem o Grande Arquiteto do Universo, cuja definição é um problema de foro íntimo, mesmo que não se delimite, explicitamente, o que se deve entender por esta fórmula.

Para alguns o G A D U é Deus, para outros um Ser Superior, para outros ainda uma Energia Criadora. Pode-se dizer, genericamente, que o G A D U é O Criador. Se somos criaturas, deve existir um Criador. Esta indefinição do G A D U e o facto de que a Maçonaria não é e não adota nenhuma religião, é o que permite dizer que a Maçonaria e Universal.

Uma vez que a Maçonaria é uma arte destinada à construção do ser interior, adoptou como base da sua filosofia os simbolismos e as ferramentas da arte de construir, vale dizer, da arquitetura. Este é o motivo pelo qual os símbolos, alegorias, lendas, arquétipos, modelos e paradigmas estarem ligados à ideia de construção ou reconstrução espiritual e mental, do edifício moral da Humanidade, iniciando pela reconstrução do próprio ser interior.

Trata-se da construção de um edifício na forma de um mundo ideal. Por isso o Maçom é um construtor social. Nos templos maçônicos não se pratica uma liturgia religiosa. Pratica-se uma arte, cujo propósito é o aperfeiçoamento do ser humano, o aprimoramento moral da sua conduta, o respeito pela Humanidade e o bem-estar da comunidade.

Os dicionários definem “arte como a habilidade ou disposição dirigida para a execução de uma finalidade prática ou teórica, realizada de forma consciente, controlada e racional” (Houais, 2009). Adaptando à Maçonaria outra definição sobre arte encontrada em Houais: (conjunto de meios e procedimentos através dos quais é possível a obtenção de finalidades práticas ou a produção de abjectos): a Arte Maçônica é o conjunto de meios e procedimentos através dos quais é possível o aprimoramento do ser humano, o aperfeiçoamento do ser interior e através disso, o aperfeiçoamento da comunidade, da sociedade e, por extensão, da Humanidade.

E por que esta Arte é Real? Há, também, várias respostas possíveis. A mais paradigmática: a “grande obra” do aperfeiçoamento humano é realizada trabalhando a “pedra bruta”, vale dizer, o ser humano inalterado, grosseiro, espiritual e mentalmente intocado.

Trabalhar a “pedra bruta”, simbolicamente, significa desbastar, polir e esquadrinhar o ser humano grosseiro até transformá-la em “pedra cúbica da Maestria”, vale dizer real, ou realisticamente verdadeiro, que não é ilusório, em conformidade com os fatos e com a realidade, autêntico, genuíno. Arte Real é, pois, sinônimo de arte genuína, autêntica, verdadeira. É a arte superior de se conhecer a si próprio e de realizar o Eu.

Antes que exponha sobre a origem do termo “Arte Real”, interrogo: quem primeiro usou esta expressão? Quem primeiro utilizou o termo Arte Real foi Máximo de Tiro (Μάξιμος Τύριος), também conhecido como Cassius Maximus Tyrius, um filósofo grego eclético, um dos precursores do neoplatonismo. Nasceu em Tiro, Fenícia, Circa 125 da E.V. e faleceu em 185, em Roma. Escreveu sobre a História da Grécia. Usou o termo Arte Real como sinónimo de Filosofia.

Há várias versões sobre as origens do termo “Arte Real” na Maçonaria. Uma dessas versões aponta a história do Rei Carlos II de Inglaterra. Carlos II nasceu em Londres, em 1630 e faleceu em Londres, em 1685. Foi Rei da Inglaterra, Escócia e Irlanda de 1649 até à sua morte. O seu pai Rei Carlos I foi executado (decapitado) em 1649 durante a Guerra Civil Inglesa.

Carlos II foi proclamado rei na Escócia, mas Oliver Cromwell destituiu-o e Carlos II fugiu para Europa continental. Cromwell transformou-se em governante (“Lorde Protetor”), instituindo uma república parlamentarista e, segundo os ingleses, uma ditadura que britânicos a chamam de “interregno”, isto é, entre reinos. Os ingleses nunca aceitaram a existência de uma república no Reino Unido (Churchill, 2009) por isso chamam este período de interregno. Carlos II, em França (ou na Escócia), tornou-se Maçom. Não se sabe onde nem como. Após a morte de Cromwell em 1658, o Rei Carlos II foi recebido em Londres em 1660 no dia do seu aniversário (29 de maio) – a Restauração – e todos os documentos legais foram datados como se ele tivesse sucedido a seu pai em 1649.

O período de exílio chamou-se “interregno” (interregnum). Carlos II era da casa de Stuart e casado com Catarina de Bragança, portuguesa e católica. Carlos II assinalou o seu reconhecimento para com a Maçonaria, conferindo, formalmente, à Sublime Ordem o título de Arte Real (documento que se encontra no Museu Britânico).

James Anderson aplicou a expressão “Arte Real” nas suas “Constituições” de 1723, com o sentido de Geometria, Arquitetura e Arte de edificar.

Em 1774, em França, o Grande Oriente de França substituiu, por um ato, o termo “Arte Real” por “Ordem Maçônica”, por considerar o termo “Real” muito pouco democrático. Observa-se que se vivia, então, num período pré-revolucionário com muitas críticas contra a realeza autocrática francesa.

Há ainda uma outra versão da origem do termo Arte Real, que tem origem na alquimia. Chama-se arte real a operação alquímica realizada em balões de vidro, a “via real”, consequentemente, chamavam a “arte” quando realizada em balões, de arte real. Entretanto, esta versão nada tem a ver com a Maçonaria.

Assim, terminando a justificativa do título deste ensaio, “Por quê Arte Real?”: trata-se, pois, de uma arte maçônica destinada ao aprimoramento do ser humano e ao aperfeiçoamento do seu ser interior, aprimoramento da comunidade e por extensão do aprimoramento da Humanidade. É uma Arte Real, por ser realístico, verdadeiro e genuíno.

Walter Celso de Lima – Loja Alvorada da Sabedoria n° 4285 – Rito Emulação

Bibliografia

  • Anatalino, J. “Maçonaria, a Arte Real”. Recanto das Letras, 2012. http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/3535227 Acesso em 07.set.2017.
  • Aslan, N. “Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia”. Vol. 1. 3a Londrina: A Trolha, 2012.
  • Boucher, J. “A Simbólica Maçônica”. 2a ed. São Paulo: Pensamento, 2015.
  • Churchill, W. S. “Uma História dos Povos de Língua Inglesa”. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira – Universidade, 2009.
  • Figueiredo, J. G. “Dicionário de Maçonaria”. 2a ed. São Paulo: Pensamento, 2016.
  • Girardi, J. I. “Do Meio-Dia À Meia-Noite”. Vade-Mécum Maçônico. 2a ed. Blumenau: João Ivo Girardi, 2008.
  • Houais, A. “Dicionário Eletrônico Houais”. E-book. Versão 3.0. Instituto Antonio Houais. Rio de Janeiro: Ed. Objetiva, 2009.
  • Reghini, A. “Qual é a arte da Arte Real?”. O Ponto Dentro do Círculo, 2015. https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2015/08/27/qual-e-a-arte-da-arte-real/ Acessado em 07.set.2017
  • Rodrigues, R. “Arte Real”. In: O Prumo, 1970-2010. Vol. II, pp: 91-96. Florianópolis: O Prumo, 2010.

 

 

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