O verdadeiro maçom
não precisa dizer que é maçom, aonde quer que ele esteja será reconhecido como
tal.
Disseram-me um dia, como a muitos outros também deve ter sido dito em
algum momento da caminhada na vida maçônica, que dom Pedro, numa mesma data
teria sido iniciado, elevado, exaltado e conduzido ao Grão-Mestrado da
Maçonaria no Brasil, e que teria adotado o nome simbólico de Guatimozim, em
homenagem ao último Imperador asteca do México que resistiu em 1522 ao
conquistador espanhol Cortez.
O relato histórico das reminiscências desmistifica os “ditos” para
conduzir ao real entendimento que dom Pedro de Alcântara, iniciado em 02 de
agosto de 1822, só foi guindado ao cargo de Grão-Mestre em 04 de outubro de
1822, e confirma que o então Príncipe Regente foi iniciado na Maçonaria com os
rigores ritualísticos, adotou o nome de Guatimozim e que não ordenou o “fechamento”
da Ordem Maçônica.
Fica aqui o nosso primeiro registro curioso. O nome Guatimozim,
entrementes, era o nome histórico adotado por Martim Francisco Ribeiro de
Andrade, irmão carnal e maçônico de José Bonifácio, e que perfilava ao lado de
Falkland [Antônio Carlos Ribeiro de Andrade], Tibiriçá [José Bonifácio de
Andrade e Silva], Caramuru [Antônio Telles da Silva], Aristides [Caetano Pinto
de Miranda Montenegro] e Claudiano [Frei Sampaio – Francisco de Santa Tereza de
Jesus Sampaio] nas alas maçônicas e registros do Apostolado e da Nobre Ordem
dos Cavaleiros da Santa Cruz. Ademais, no Recife existia uma Loja Maçônica
denominada Guatimosin, fundada em 1816 e que em 1821 mudou o seu nome para
“Loja 6 de Marco de 1817”, em homenagem aos maçons sacrificados na gloriosa
Revolução Pernambucana de 1817.
A historiagrafia maçônica, contudo, passa ao largo da preferência de dom
Pedro pelo nome heróico de Guatimozim.
Outro registro nos remete ao restabelecimento dos trabalhos maçônicos na
forma ordenada por dom Pedro I. E estes, contudo, não foram reencetados, haja
vista que a 02 de novembro de 1822, José Bonifácio determinou uma devassa
contra os maçons do “Grupo do Ledo”, no episódio que ficou conhecido como
“Bonifácia”.
As razões ainda são pouco claras, ao que tudo indica o fato de dom Pedro
ter sido aclamado Grão-Mestre numa sessão presidida por Joaquim Gonçalves Ledo
foi interpretado como um golpe maçônico ao “Grupo do Bonifácio”, e os ânimos
entre os grupos [azul e vermelho] que se mostravam em acirramento crescente
desde o episódio que resultou em repreensão ao Frei Francisco Sampaio [Pílades]
mostravam-se mais radicalizados com a eleição de dom Pedro para o cargo de
Grão-Mestre em substituição a José Bonifácio.
Devemos dizer que José Bonifácio
efetivamente não compareceu a sessão em que dom Pedro tomou posse no cargo de
Grão-Mestre, como de resto, não compareceu a nenhuma sessão importante e até
mesmo foi colocado no cargo sem ser consultado, mas não foi totalmente tirado
da diretoria, porque ainda era ministro de dom Pedro e continuava a exercer o
cargo de Grão-Mestre Adjunto e Lugar-Tenente de dom Pedro no Apostolado.
O clima realmente esquentou quando o “Grupo do Ledo” tentou impor a dom
Pedro, por ocasião da sua aclamação a Imperador do Brasil, em 12 de outubro de
1822, um juramento prévio da Constituição que seria elaborada pela Assembléia
Geral Constituinte e Legislativa convocada pela circular de 17 de setembro de
1822. Tal fato desagradou profundamente ao “Grupo do Bonifácio” e ao próprio
dom Pedro I, daí a interrupção dos trabalhos ordenada por este, para as
“averiguações” procedimentais, na forma narrada nas reminiscências.
A abertura da “devassa” ordenada por José Bonifácio, dois dias depois da
autorização emanada do Imperador e Grão-Mestre para o recomeço das atividades
maçônicas, ocorreu depois que os Andradas [José Bonifácio e Martim Francisco]
colocaram seus cargos de ministros à disposição do Imperador.
Tão logo a notícia tornou-se conhecida no meio maçônico, iniciou-se um
movimento no sentido de fazer o Imperador reintegrar os Andradas, o que acabo
acontecendo. Reintegrados e fortalecidos pelas manifestações favoráveis, José
Bonifácio desencadeou violenta repressão aos maçons identificados com a
liderança de Joaquim Gonçalves Ledo e esse conjunto de fatos ficou conhecido
como “Bonifácia”.
O devassado Joaquim Gonçalves Ledo fugiu para a Argentina com o auxílio
do Cônsul da Suécia. José Clemente Pereira foi preso e depois deportado [30 de
dezembro de 1822] para Havre, na França, em companhia de Januário da Cunha
Barbosa, e posteriormente, os dois foram para Londres.
Outros maçons foram presos e depois libertados, as lojas encerraram seus
trabalhos e o Grande Oriente do Brasil fechado, deixando os maçons em pavorosa.
Com a cissura, o fechamento do Grande Oriente do Brasil e sem oposição, os
anti-maçons recrudesceram em campanhas, fazendo com que a Maçonaria aparecesse
como inimiga do Imperador e do Trono, constituindo uma memória da Independência
cada vez mais distante dos maçons e da Maçonaria. E a única voz que se ouvia
bradar na imprensa era a do brigadeiro e maçom Domingos Alves Branco Moniz
Barreto [Sólon] em seu jornal “Despertador Constitucional”.
O que se registra no meio maçônico, contudo, e em que pese o fechamento
do Grande Oriente do Brasil, é que muitos maçons continuaram a se reunir às
escondidas enquanto as lojas cerraram suas portas, atas e documentos maçônicos
eram destruídos por todo o Brasil, à exceção de Pernambuco, onde as lojas
funcionavam e os maçons se reuniam em oposição às determinações do Rio de
Janeiro, e até conduziram os preparativos do movimento que ficou conhecido como
Confederação do Equador – um dos momentos marcantes dos tempos de ouro da
maçonaria pernambucana. Mas este é um relato para outra oportunidade.
Outra curiosidade marcante fica por conta de dois fatos. O primeiro, dom
Pedro em 20 de julho de 1822, portanto, doze dias antes de ser iniciado, enviou
um bilhete a José Bonifácio no qual tratava da Província da Bahia,
convulsionada e resistente à Regência do Rio de Janeiro.
Anote os termos maçônicos usados. Dizia o Príncipe Regente: “O Pequeno
Ocidente toma a ousadia de fazer presente ao Grande Oriente, duas cartas da
Bahia e alguns papéis periódicos da mesma terra há pouco vindas. Terra a quem o
Supremo Arquiteto do Universo tão pouco propício tem sido. É o que se oferece
por ora a remeter a este que em breve espera ser seu súdito e Iº” [Arquivo da
Casa Imperial do Brasil. Cartas (2) de D. Pedro a José Bonifácio. São Paulo,
20/07/1822 e 01/09/1822, II-POB-20.07.1822 – PI.B – c. 1-2, citado por Barata,
ob. cit. p. 233], numa patente demonstração que os termos maçônicos não lhe
eram desconhecidos e que esperava ser iniciado em nossa Ordem.
Outro fato singular refere-se a possibilidade do Príncipe Regente dom
Pedro pertencer ao Apostolado da Nobre Ordem dos Cavaleiros da Santa Cruz,
sociedade secreta de fins maçônicos fundada em 2 de junho de 1822 por José
Bonifácio.
O atesto é feito por Castellani ao citar Rio Branco em nota à “História
da Independência do Brasil” de Vernhagem: “D. Pedro já pertencia, como ficou
dito, a uma sociedade secreta, a Nobre ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz,
denominada Apostolado. Pelo livro das atas que S. M. o Sr. D. Pedro II possui,
e figurou na Exposição de História do Brasil [no 6.986], sabe-se hoje que essa
sociedade fundada por José Bonifácio, começou a funcionar em 2 de junho. D.
Pedro era, com o título de arconte-rei, o chefe do Apostolado, sendo José
Bonifácio seu lugar-tenente.
Pelo livro do juramento, também exposto em 1881, ficou patente que
Gonçalves Ledo e Nóbrega, também pertenciam ao Apostolado” [Castellani, in
História do Grande Oriente do Brasil, p. 70]. O Nóbrega referido poderia ser os
maçons Francisco Luiz Pereira da Nóbrega ou Luiz Pereira da Nóbrega de Sousa
Coutinho.
"LOUVADA SEJA A MAÇONARIA QUE
NOS FEZ IRMÃOS"
GRUPO MAÇÔNICO ORVALHO DO
HERMON