O SEGREDO MAÇÔNICO


 

A Maçonaria é uma instituição ancestral e que preza a Tradição. Mas, como todas as instituições ancestrais bem sucedidas, sabe preservar a Tradição, adaptando os seus usos e costumes ao evoluir dos tempos e das sociedades. Só assim evita ser anacrônica e mantém interesse e importância e valor, ao longo da passagem dos anos, décadas e séculos.

O século XXI lançou-nos a todos na voragem da Sociedade da Informação. As chamadas Novas Tecnologias permitem aceder a mananciais de informação que ainda há poucas décadas – há poucos anos… – eram impensáveis.

A Maçonaria não pode, não deve, obviamente, ser indiferente às consequências desta evolução. Não deixou de fazer sentido a subsistência do segredo maçônico. Mas a mitificação do mesmo, essa sim, não me parece que seja vantajosa, nem para os maçons, nem para os profanos.

A Maçonaria prossegue objetivos honrosos e louváveis. É frequentemente denegrida por quem, sendo-lhe hostil, a acusa de prosseguir propósitos menos recomendáveis e, sistematicamente, esgrime com o segredo maçônico como alegada prova dos tenebrosos propósitos da Maçonaria.

Em época de acelerada circulação da informação, não basta à Maçonaria seguir o seu caminho, não ligando aos cães que ladram à passagem da caravana. Porque tanto ladrido de tanta canzoada acaba por impressionar quem o ouve.

A Maçonaria deve continuar a prosseguir o seu caminho, apesar dos rafeiros e seus latidos. Mas, para bem de si própria e elucidação de todos, nestes tempos de abertura de informação, deve mostrar e informar para onde vai, porque vai e como vai. Assim todo o verão qual o caminho e não se impressionarão com a barulheira dos canídeos, que todos poderão ver ser vã e sem motivo que a sustente.

O segredo maçônico é um dos objetos dos latidos. Pois bem, é tempo de mostrar, a quem estiver de boa fé, que esse vozear não tem razão de ser.

Não abandonando o segredo maçônico ou traindo os compromissos assumidos. Mas explicando os limites, a natureza e as razões do dito segredo. Quem estiver de boa fé perceberá. Os outros… continuarão a ladrar, mas já impressionarão menos…

Em minha opinião, não há um segredo maçônico. Há dois. Um exotérico e outro esotérico. Quero com estes adjetivos significar duas diferentes realidades. No meu entendimento, o segredo maçônico exotérico é aquele que é constituído por matéria ou conhecimento que é suscetível de fácil apropriação por qualquer pessoa, que sem dificuldade de maior pode ser transmitido por quem o sabe a quem não o sabia. Inversamente, o segredo maçônico esotérico não comunga dessa facilidade de apreensão e de transmissão.

O segredo maçônico exotérico só existe enquanto e na medida em que for preservado por todos aqueles que o detêm, os maçons, nos seus respectivos graus e qualidades. O segredo maçônico esotérico existe independentemente de qualquer esforço de preservação, porque o seu teor não é suscetível de ser adequada e completamente transmitido por quem atinge o seu conhecimento (apenas alguns maçons ou não).

Tem de ser descoberto, num esforço individual, mediante um percurso de autopreparação para atingi-lo e reconhecer, em que cada patamar atingido é condição necessária para poder conseguir-se chegar ao seguinte. Este segredo existe independentemente de qualquer propósito de preservação por quem o detém. Direi mesmo que existe apesar dos esforços e das tentativas de partilha por quem o descortinou.

Dito de outro modo: o segredo maçônico é composto por uma parte que não é sequer particularmente importante (o segredo exotérico) e subsiste graças e na medida dos cuidados dos maçons na sua subsistência; e existe também outra componente (o segredo esotérico) que existe independentemente da vontade dos seus detentores, por impossibilidade de sua adequada e completa transmissão, seja por via oral, seja por escrito. O acesso a este implica vivência, experiência, vontade, esforço. Não basta ouvir ou ler. Portanto, o segredo que se guarda não é especialmente importante e o que importa não se consegue transmitir…

O segredo maçônico exotérico é constituído por quatro aspetos:

Reserva da identidade dos maçons que não se hajam assumido publicamente como tal;

Reserva de divulgação das formas de reconhecimento entre os maçons;

Reserva de divulgação de rituais e de cerimônias;

Reserva de divulgação do teor concreto e específico dos trabalhos de qualquer reunião de Loja ritualmente realizada.

Talvez com exceção da última faceta, o segredo maçônico exotérico é um verdadeiro segredo de Polichinelo: só não o conhece quem não quiser. Basta um pouco de esforço e trabalho para apurar o seu conteúdo. Então com as possibilidades atualmente disponíveis com as Novas Tecnologias de Informação e os potentes motores de busca universalmente disponíveis, aceder a esse conhecimento é uma pura questão de perseverança, trabalho e alguma habilidade. Ao contrário do que vulgarmente se pensa, está tudo publicado. Só é preciso descobrir onde… E – esta será porventura a maior dificuldade – destrinçar entre o que verdadeiramente é e o que é falso ou imitado ou errada ou desajustada ou intempestivamente utilizado.

O objetivo primacial do segredo maçônico exotérico é permitir aos maçons saber, de uma forma exclusivamente a si acessível, quem é e quem não é maçom – e também que grau detém quem é maçon.

Nos tempos de antanho, foi essencial. Hoje, nem por isso. Outras formas de saber, rápida e eficazmente, quem é e quem não é maçom existem. Hoje, a facilidade e rapidez das comunicações, particularmente das telecomunicações e da comunicação eletrônica, permitem, em caso de necessidade, fácil e rapidamente verificar junto de uma Grande Loja ou de uma Loja se fulano é seu membro. Antigamente, era diferente. Daí que a importância do conhecimento da forma de obter essa informação, e a sua preservação, fosse nuclear. As realidades da vida, da evolução e do desenvolvimento em muito erodiram a necessidade e importância do segredo.

Sendo assim, porque continuam os maçons a preservar esse já não tão importante segredo? Por duas razões, uma acessória, outra essencial. A acessória é que, embora a necessidade de preservação das reservas de informação tenha diminuído, seja menos importante, não cessou completa e universalmente, não perdeu TODA a importância (ainda há locais onde é perigoso ser maçom). A essencial é que os maçons preservam o segredo maçônico PORQUE SE COMPROMETERAM, POR SUA HONRA, A FAZÊ-LO.

Sendo assim, porque se continua a exigir aos maçons esses compromisso de honra? Não já pela necessidade de antanho. Ou não já essencialmente. Nem também por um cego tributo à Tradição, o continuar a fazer agora assim porque dantes assim se fazia. Antes como um exercício permanente do que é na essência inerente à condição de maçom.

Um maçom é um homem livre, apenas escravo da sua palavra; sério, sempre preservando a sua honra; cumpridor dos seus compromissos, apenas porque se obrigou a eles. A palavra de um maçom vale tanto ou mais do que um contrato escrito, é mais duradoura do que se tivesse sido gravada em pedra. Independentemente da importância do assunto. Um homem só é honrado e de confiança se o for nas pequenas como nas grandes coisas. A verdadeira palavra sagrada de um maçom é a sua palavra de honra.

É, portanto em execução desse princípio inderrogável de que o maçom cumpre sempre a sua palavra, seja-lhe ou não conveniente, seja o assunto importante ou sem destaque particular, que este preserva o segredo maçônico. Porque se comprometeu a fazê-lo. Independentemente de ser ou não ser já importante fazê-lo.

Mesmo que, por esse mundo fora, esse segredo, total ou parcialmente, tenha sido centenas ou milhares de vezes exposto. Se o não fizesse, sabia-se merecedor do opróbrio e desprezo unânimes dos maçons. E um maçom só o é na medida em que seja reconhecido como tal pelos seus pares…

O maçom preserva o segredo maçônico porque se comprometeu a fazê-lo e esse compromisso continua a ser exigido aos maçons como forma de exercício diário, constante, permanente, dos deveres inerentes a um homem honrado, livre e de bons costumes. Outros existem que, diz-se para aí, pontuam a sua pertença à organização em que buscam a excelência através do cilício, da mortificação do corpo.

Os maçons buscam a excelência do caráter, do espírito, e, portanto exercitam continuamente o caráter e o espírito. Uma das formas de o fazerem é honrando escrupulosamente os seus compromissos. Independentemente de serem importantes. Sem questionar a eficácia ou o interesse desse cumprimento. Sendo-lhes indiferente que outros, mais fracos ou imerecedores, porventura tenham falhado esse cumprimento.

Índice

RESERVA DA IDENTIDADE DOS MAÇONS QUE NÃO SE HAJAM ASSUMIDO PUBLICAMENTE COMO TAL

RESERVA DE DIVULGAÇÃO DAS FORMAS DE RECONHECIMENTO ENTRE OS MAÇONS

RESERVA DE DIVULGAÇÃO DE RITUAIS E DE CERIMÓNIAS

RESERVA DE DIVULGAÇÃO DO TEOR CONCRETO E ESPECÍFICO DOS TRABALHOS DE QUALQUER REUNIÃO DE LOJA RITUALMENTE REALIZADA

O SEGREDO MAÇÓNICO ESOTÉRICO: O VERDADEIRO SEGREDO MAÇÓNICO

RESERVA DA IDENTIDADE DOS MAÇONS QUE NÃO SE HAJAM ASSUMIDO PUBLICAMENTE COMO TAL

Mesmo nas sociedades mais abertas e com maior inserção social da Maçonaria, mesmo no Brasil, nos Estados Unidos ou em Inglaterra, existem preconceituosos contra a Maçonaria que, se tiverem o poder e a posição para tal, podem sub-repticiamente prejudicar um maçom apenas por o ser – embora porventura ocultando o seu preconceito e usando qualquer outra desculpa ou justificação… Também nas sociedades mais abertas e com maior inserção social da Maçonaria se continua a justificar uma atitude prudente em relação aos preconceituosos e, portanto, o cumprimento do princípio de não revelar que alguém é maçom, se esse maçom não assumiu publicamente essa condição.

Outra razão justifica ainda o cumprimento deste princípio. A Fraternidade implica o reconhecimento da dignidade do outro em todas as circunstâncias. Implica o respeito pelo outro, pela sua inteligência, pelas suas escolhas. Se um maçom divulgasse que outrem tem essa qualidade, sem que o visado tivesse previamente assumido a mesma publicamente, estaria, sobretudo a desrespeitá-lo, a desrespeitar essa sua escolha.

Se o visado não se tinha assumido publicamente como maçom, isso resultava de uma análise do mesmo, de uma escolha sua. Análise e escolha que era seu direito fazer e que só a ele competia fazer. Divulgar que esse que se não assumiu como maçom é maçom corresponde a substituir, a desvalorizar, a desconsiderar, o juízo por ele feito, em favor do juízo (ou da falta de juízo…) do próprio.

A decisão de cada um se assumir publicamente como maçom a cada pertence. Não pode, não deve ser apropriada por nenhum outro maçom. E não o é. Em nome do respeito pelo outro, pela sua inteligência, pela sua capacidade de análise, pelas suas escolhas, que é inerente ao elo que une todos os maçons: o elo da Fraternidade. Trair esse elo, mais do que trair o outro seria traição ao próprio e a todos.

RESERVA DE DIVULGAÇÃO DAS FORMAS DE RECONHECIMENTO ENTRE OS MAÇONS

Antigamente era, em muitos locais, perigoso ser maçom. Ainda hoje o é, em várias partes do globo. Os maçons tinham necessidade de se conseguirem reconhecer uns aos outros, sem necessidade de perguntar.

Com efeito, se um maçom perguntasse a outrem se também era maçom e esse outrem não só não o fosse como denunciasse quem o inquirira, estava o caldo entornado… Havia, pois, que arranjar maneira de um maçom se poder assegurar que outro homem também tinha essa qualidade, de forma que, se assim fosse, o interrogado soubesse que tal interrogação lhe estava a ser feita e soubesse responder da mesma forma, mas que, se o interrogado não fosse maçom, não se apercebesse sequer da interrogação.

 Havia que criar uma forma de um maçom se dar a conhecer como tal, de maneira que só os maçons se apercebessem disso e só eles reconhecessem essa forma. Havia que poder testar se alguém que se arrogava de ser maçom efetivamente o era. E, sobretudo, havia que tudo isto fazer de forma discreta, apenas perceptível por quem devesse perceber. E havia, obviamente, que guardar segredo dessas formas de reconhecimento.

Antigamente, não havia as facilidades e rapidez de comunicações e de deslocação que há hoje. Os agregados populacionais eram fechados, muito mais isolados do que agora e, sobretudo, mais distantes, em termos de tempos de viagem. Ir de Lisboa ao Porto demorava dias. Ir de Lisboa a Londres demorava semanas. Ir da Europa à Ásia, a África ou à América demorava meses.

Um viajante que chegava a qualquer local era um desconhecido e desconhecia todas ou quase todas as pessoas desse local. Arrogava-se qualquer título ou condição, não havia meios de comunicação rápidos que permitissem verificar, em terras distantes, se o afirmado era verdade.

Viajar era demorado e perigoso. Os maçons em viagem podiam beneficiar do auxílio de seus Irmãos. Muitas vezes sendo – viajante e residente – desconhecidos um dos outro. Não bastava ao viajante dizer que era maçom. Tinha de comprovar essa qualidade.

Antigamente era, pois, essencial que existissem formas de reconhecimento discretas, eficazes e de conhecimento restrito aos maçons. Que deviam ser e eram avaramente guardadas em segredo.

Essas formas de reconhecimento eram e são constituídas por determinados sinais, por certas palavras, por específicos toques. Os sinais permitiam que os maçons se reconhecessem como tal no meio de uma multidão, se preciso fosse, sem que mais ninguém se apercebesse.

As palavras permitiam confirmar esse reconhecimento, constituindo uma segunda forma de verificação, que confirmaria a identificação ou permitiria desmascarar impostor que, por conhecimento ou sorte, tivesse efetuado corretamente um sinal de identificação. Os toques, discretos, permitiam, além de uma fácil identificação mútua absolutamente discreta e insuscetível de ser detectada por estranhos, também desmascarar impostores, pois não bastava, nem basta usar certo toque: é preciso saber quando o usar, para quê e que deve suceder em seguida…

Sempre os sinais de reconhecimento foram objeto de curiosidade profana. Por quem perseguia a Maçonaria e os maçons, por razões evidentes. Por quem, não sendo maçom, gostaria de se infiltrar entre os maçons ou, viajando, beneficiar da ajuda que os maçons residentes davam aos maçons viajantes. Ou, simplesmente, por quem era curioso…

Milhares e milhares de maçons conhecem os sinais de reconhecimento. Ao longo do tempo, milhões de maçons acederam a esse conhecimento, nas quatro partidas do Mundo. Houve zangas. Houve dissensões. Houve abandonos. Houve traições. Houve inconfidências. Um segredo só é verdadeiramente secreto se for conhecido apenas por um – e, mesmo assim, se este não falar a dormir… Era inevitável que as formas de reconhecimento dos maçons fossem expostas. Existem livros. Existem filmes.

Existem vídeos. Existem panfletos. Existem, hoje em dia, inúmeros suportes em que estão expostas aos profanos as formas de reconhecimento dos maçons. Mas também existem publicados nos mesmos suportes formas de reconhecimento falsas ou inventadas ou simplesmente ultrapassadas… Quem está de fora tem o magno problema de descobrir o que é verdadeiro e o que é falso, de distinguir o certo do inventado, de descortinar o que se mantém vigente e o que foi ultrapassado…

Por isso, ainda hoje, as formas de reconhecimento vigentes, apesar de conhecidas por milhões, apesar de repetidamente expostas, continuam a ser úteis e eficazes.

Mas, mesmo que algum profano consiga conhecer os sinais, palavras e toques certos e consiga descobrir quando os utilizar e como o fazer corretamente, ainda assim só logrará, quando muito, enganar alguns maçons durante algum tempo e acabará – porventura mais cedo do que mais tarde – por ser desmascarado como impostor. Porque não basta executar o sinal certo na hora precisa, pela forma correta, nem dizer a palavra adequada, pela forma prescrita, a quem deve ouvi-la, nem dar o toque acertado, no momento asado e sabendo o que se deve passar a seguir.

Tudo isso já é suficientemente complicado – mas não basta! Tudo isso, ainda que porventura executado de forma atinada, constitui ainda uma determinada informação: que quem o fez tem um determinado nível de conhecimentos, certa postura e compostura, um exigível comportamento, um específico nível de desenvolvimento pessoal, social e espiritual. Ser maçom e ser reconhecido como maçom não é só conhecer e saber executar sinais, palavras e toques. Isso é o que menos importa. É, sobretudo, saber fazer um percurso, utilizar um método, avançar num caminho.

As formas de reconhecimento são apenas sinais exteriores básicos e nem sequer particularmente importantes. Isso também, mas, sobretudo muito mais, é que faz com que um maçom seja reconhecido como tal pelos seus Irmãos.

Reservo o segredo dos sinais, palavras e toques que constituem as formas de reconhecimento dos maçons, porque a isso me comprometi. Mas digo e afirmo: podíamos divulgar publicar, mostrar, explicar, exemplificar, ensinar, filmar e exibir o filme, executar todos os sinais, palavras e toques de reconhecimento; podíamos ensinar a toda a gente como e quando e por que forma utilizar cada um deles. Ainda assim, pouco tempo e apenas um razoável cuidado bastariam para reconhecer quem efetivamente é maçom e quem, ainda que perfeitamente executasse todos os sinais, palavras e toques, não o é!

Porque ser maçom é muito mais do que saber sinais, palavras e toques. Ser reconhecido como tal implica muito mais do que essas minudências, pois não basta saber sinais, palavras e toques para ser reconhecido maçom. É preciso efetivamente sê-lo e vivê-lo e praticá-lo.

Que nunca ninguém se esqueça disto. Seja profano ou tenha sido iniciado. Especialmente estes!

RESERVA DE DIVULGAÇÃO DE RITUAIS E DE CERIMÓNIAS

Os maçons estruturam o seu trabalho em Loja mediante rituais. A abertura e o encerramento dos trabalhos são sempre executados da mesma forma, a maneira como, durante os trabalhos, cada um fala ou se movimenta em Loja está tipificada, etc.. Os maçons assinalam também diversas situações, individuais ou coletivas, consideradas significativas com Cerimônias meticulosa e ritualmente executadas. Assim sucede com a Iniciação, a Passagem, a Elevação, a Instalação, a Consagração de Loja, etc..

A preservação do segredo sobre os rituais e cerimônias é uma das obrigações dos maçons. Quanto aos rituais, porque são parte integrante da identidade da instituição, que só fazem sentido no âmbito da mesma. A pior coisa que se pode fazer a um conceito, uma informação, uma declaração, é descontextualizá-la.

A descontextualização atraiçoa o espírito, o propósito, o aspeto, do conceito, da informação, da declaração. Torna-o, ou pode torná-lo, inentendível. Desvaloriza-o. Quiçá, submete-o a ridículo. No entanto, no seu devido contexto, os rituais maçônicos, não só são entendíveis, como são fonte de estudo e iluminação. Não só têm valor, como são fonte de união. Não só são seriamente tomados e executados, como são fonte de fortalecimento do espírito de grupo e da fraternidade entre os maçons.

Os rituais só fazem plenamente sentido se e quando executados no local e pela forma próprios, por e perante o qual está apto a compreendê-los. Expô-los aos olhares profanos seria permitir que juízos turvados pela ignorância, obnubilados pelo preconceito, prejudicados pela distância, extraíssem conclusões erradas, perfunctórias, vãs.

Quanto às cerimônias, acresce ainda outro motivo para o seu teor e o seu desenrolar ser reservado não apenas aos maçons, mas aos maçons do grau em que são executadas, ou superior. É que é importante preservar o fator surpresa, em relação àquele ou àqueles em benefício de quem cada cerimônia é executada.

A Maçonaria destina-se a propiciar um terreno apto para o aperfeiçoamento moral e espiritual dos seus membros. Coloca ensinamentos, princípios, máximas, à disposição destes.

Um pouco de cada vez, para que os ensinamentos, os princípios, possam ser detectados, descobertos e interiorizados pelos interessados. A Maçonaria nada ensina. Apenas possibilita que se aprenda. Mas essa aprendizagem não é efetuada apenas com o recurso à memória e ao elemento racional.

Essa aprendizagem, essa melhoria, esse avanço, resulta também da marca deixada em cada um, através da respectiva inteligência emocional e seu desenvolvimento. Daí que as noções obtidas não sejam apenas adquiridas, mas realmente entranhadas. Daí que se dê valor ao tempo, ferramenta indispensável à construção da melhoria de cada um. Todo este processo se desencadeia através da disponibilidade de apreensão de algo que se desconhece.

Daí a importância do fator surpresa. Muitas vezes o que se transmite não é novo. Já foi centenas de vezes lido, milhares de vezes visto. Mas nunca foi visto ASSIM, nunca foi contextualizado DESTA forma, nunca tinha sido introduzido COMO tal.

O maçom a quem uma cerimônia é dedicada é sempre o centro da mesma. Para que a viva e não apenas a ela assista. O objetivo é VIVER a cerimônia. Não revivê-la. Por isso a deve desconhecer antes de dela beneficiar. Por isso devem as cerimônias maçônicas permanecer secretas, de conhecimento reservado a quem o deve ter – e só a esses.

Mas há dezenas de versões de rituais publicados. Através dos quais se podem ler o texto de diversas cerimônias. Qual então o interesse de continuar a preservar o sigilo sobre rituais e cerimônias? Duas razões avanço: em primeiro lugar, muito do que está publicado não é já atual.

Pode ter semelhanças com o que atualmente se pratica, mas também tem diferenças, algumas significativas. Em segundo lugar, um ritual, uma cerimônia, não é – longe disso! – apenas um texto que se lê ou recita. É muito mais que isso. É movimento, é entoação, é gesto, é interpretação.

Muito do que ritualmente é executado não está escrito. É aprendido pela observação, aperfeiçoado com o auxílio dos que antes aprenderam a executar. Por isso é importante o trabalho de aperfeiçoamento ritual de uma Loja. Como um meio. Nunca um fim em si mesmo.

Preservar o segredo quanto a rituais e cerimônias é preservar a essencialidade da cultura maçônica, da sua diferença em relação ao mundo profano. É preservar o método de transmissão e apreensão de conhecimentos. É, enfim, proteger o cerne da Maçonaria.

RESERVA DE DIVULGAÇÃO DO TEOR CONCRETO E ESPECÍFICO DOS TRABALHOS DE QUALQUER REUNIÃO DE LOJA RITUALMENTE REALIZADA

Os maçons comprometem-se finalmente a não divulgar o teor concreto dos trabalhos de uma reunião de Loja, ritualmente realizada. À primeira vista, isto parece excessivo. Sobretudo, se tivermos em conta que, de cada reunião, é elaborada uma ata que, depois de aprovada, é conservada na documentação e no arquivo da Loja. Por essa ata se alcança que assuntos foram tratados na reunião, que deliberações foram tomadas. E uma ata existe para ser consultada – senão, para quê fazê-la? Independentemente da delicadeza dos assuntos tratados, a ata é elaborada e preservada.

Eu publiquei no blogue A Partir Pedra um documento histórico, uma ata que registrou os trabalhos da sessão de 18 de setembro de 1835 da Loja brasileira Philantropia e Liberdade. Essa ata registrou nada mais, nada menos, do que a preparação e planificação de um movimento revolucionário, a Revolução Farroupilha!

Por que então guardar sigilo sobre os sucessos de uma reunião, ao mesmo tempo em que se registra, e se guarda escrupulosamente esse registro, o que se passou, elaborando-se uma ata formal? Se for certo que o acervo documental constituído pelas atas das reuniões das Lojas maçônicas pode constituir – e constitui! – precioso material de investigação histórica, nem sequer é esse o principal objetivo do registro em ata. Como referi, uma ata serve para ser consultada. Cem anos depois ou dois dias depois…

Esta aparente incongruência esclarece-se se tivermos a noção de que uma Loja maçônica é uma organização – que deve registrar os seus eventos e deliberações mediante atas, até em obediência às leis civis e em cumprimento dos bons costumes sociais -, mas uma organização com uma característica bem distintiva: é uma fraternidade.

Enquanto fraternidade cultiva e desenvolve especialmente as relações de confiança mútua entre os seus elementos, em estrito espírito de igualdade, sem prejuízo dos graus e qualidades de cada um e dos particulares deveres e meios que cada grau ou qualidade confira a quem os detém.

Enquanto organização, uma Loja maçônica cumpre as regras civis e, portanto registra quem esteve em cada reunião, o que se tratou nela, o que ficou decidido. E guarda e preserva esse registro, que, a qualquer momento, pode ser necessário nos mesmos termos em que qualquer ata de qualquer reunião de qualquer associação ou sociedade pode ser necessária.

Enquanto grupo fraternal procura-se que cada elemento se sinta, no interior do grupo, completa e absolutamente livre de expressar as suas ideias, opiniões, projetos, preocupações, sem constrangimentos de qualquer espécie.

O espaço de uma Loja em reunião ritual é um espaço em que todos e cada um podem baixar completamente as suas defesas e guardas, em que não necessitam de manter a sua “máscara social”, em que todos e cada um podem ser e comportar-se e aparecer como realmente todos e cada um são, com suas forças e fraquezas, virtudes e defeitos. Porque, neste espaço, todos e cada um sabem que devem aos demais a mesma tolerância que dos demais recebem.

Porque todos e cada um sabem que todas as opiniões, ideias, contribuições, são analisadas e consideradas pelo seu valor intrínseco, sem argumentos ad hominem, sem acrescentar ou retirar valia à opinião expressa em função de quem a expressa.

Enquanto grupo fraternal cultiva-se a absoluta confiança mútua, a cooperação, o auxílio a todos na medida das possibilidades de cada um. Procura-se criar um laço forte e duradouro entre todos. Que por isso se consideram Irmãos. Ao criar-se um laço desta natureza, está-se a criar um espaço onde a crítica é aceite, porque a aceitação existe ainda que haja lugar a crítica. Preserva-se um espaço de cumplicidade imensa, em que cada um está à vontade junto dos demais, porque confia nos demais como nele mesmo.

Num espaço assim, de Fraternidade, pode desabrochar sem peias a Liberdade. A Liberdade de opinar, de arriscar testar uma ideia, sem medo de que ela seja apoucada por disparatada. Se o for, assim será considerada. Mas isso não diminui quem a teve. Porque se sabe que ela só foi expressa porque se estava à vontade e porque é em espaços assim que livremente se pode testar a real valia de ideias, opiniões, propósitos.

E aperfeiçoar. E limar arestas. E – quantas vezes! – transformar uma balbuciante e hesitante ideia num projeto sólido e com mérito, através do contributo de todos. Um espaço assim é potencialmente um espaço de criatividade e cooperação sem paralelo – porque ninguém teme o juízo, ou a troça, ou o apoucamento, dos demais. Porque todos sabem que ninguém tem só excelentes ideias, que só expondo todas – as péssimas, as sofríveis, as regulares, as boazinhas, enfim, todas – é possível peneirar delas as que têm efetiva valia.

Porque todos sabem que um bom projeto só raramente é produto do valor de apenas qualquer iluminado, antes resulta da concatenação de ideias, que se acumulam e organizam e dão forma, muitas vezes diferente no final do que fora o lampejo inicial.

Num espaço assim não se tem medo de ser ridicularizado, apoucado, magoado. Mesmo que se use o direito ao disparate. Num espaço assim, sabe-se que o juízo sobre o valor de cada um não depende de uma excelente ou uma péssima ideia, antes resulta do Todo que cada um é e que os demais vão conhecendo, cuja evolução vão constatando.

Um espaço assim é um espaço de intimidade intelectual sem paralelo. E só subsiste porque blindado numa confiança mútua absoluta. O que se diz ali fica ali. Seja a ideia do século, seja o mais profundo disparate. Quer uma, quer outro, são ali vistos na correta perspectiva, de procura de contribuição para a melhor decisão do grupo, de experimentação, de sugestão, sem reservas, sem cuidados, sem temores de ridículo ou de crítica.

Um espaço assim propicia a mais livre da Livre Expressão do Pensamento. Porque livre da necessidade da pior das censuras, a autocensura. Um espaço assim, baseado na confiança, na Fraternidade, só pode subsistir se todos e cada um souberem que o à vontade em que se expressam não é traído por juízos exteriores feitos por quem, descontextualizando o paradigma em que as ideias são expostas, possa vir a apoucar a ideia, o pensamento, a opinião.

É para preservar esse espaço intimista de Liberdade que se preserva o que de concreto se passa numa reunião maçônica. Porque fora se julga segundo os critérios de fora, não se atendendo às condições que se criam para que todas as contribuições sejam bem-vindas.

É preciso garantir que todos e cada um possam no decorrer de uma reunião ritual de Loja, expressar sem quaisquer constrangimentos, de qualquer natureza, as suas ideias e convicções e opiniões. Para que essa Liberdade absoluta exista, mister é que todos e cada um saibam que o que se passa em Loja fica em Loja. E, portanto, cada um guarda cuidadosamente para si o que em Loja se passou. Quem quiser saber e tenha o direito, a saber… consulte a ata!

O SEGREDO MAÇÓNICO ESOTÉRICO: O VERDADEIRO SEGREDO MAÇÓNICO

Em minha opinião, já hoje aqui o disse, o verdadeiro segredo maçônico vai muito além da discrição sobre identidades, modos de reconhecimento, rituais, cerimônias e trabalhos efetuados. Em minha opinião, o verdadeiro segredo maçônico, o que importa, o que releva, existe, não porque os maçons o queiram preservar, mas porque não o conseguem revelar. Porque é insuscetível de plena transmissão.

O verdadeiro segredo maçônico, aquilo a que muitos chamam de Palavra Sagrada ou, muito simplesmente, de Luz, é aquilo que o maçom aprende através do contacto com seus Irmãos, do convívio e busca de entendimento dos elementos simbólicos que a maçonaria profusamente coloca à disposição dos seus elementos, do método de análise, de trabalho, de esforço, de meditação, de extenuada conquista, passo a passo, degrau a degrau, patamar a patamar, sobre si próprio, a pulso desbastando suas imperfeições, despojando-se do interesse sobre toda a ganga material que obnubila os nossos espíritos, indo-se cada vez mais longe em épica viagem, com começo e fim no fundo de si mesmo e aí descobrindo a resposta que procura.

Esta busca, esta viagem, esta procura, tem um começo e um fim, mas nem um nem outro serão porventura os esperados. O começo será sempre depois do meio dia, a hora a que os maçons iniciam os seus trabalhos, quando cada um está efetivamente apto a começar a trilhar o caminho sem marcos, bordas ou fronteiras, que conduzirá não sabe onde.

O fim, esse, tem hora marcada, aquela em que os maçons pousam as suas ferramentas, a meia noite. Como em muito do que tem valor, tão importante é o resultado como o trabalho para obtê-lo, tão atraente é o destino, como o caminho que a ele conduz. E muito raramente o caminho mais curto entre o ponto de partida e o de chegada será uma reta…

Em bom rigor, duvido mesmo que haja apenas um verdadeiro segredo maçônico, um único segredo esotérico. Nesta altura do meu entendimento, propendo a considerar que cada maçom atinge a sua própria Luz – a deste com mais brilho, a daquele mais baça, a daquele outro, qual bruxuleante chama de longínqua vela, mal se vendo -, cada maçom encontra e resgata a sua própria e individual Palavra Perdida – a de um bela e cristalina, a de outro sonora e estentória, a de um terceiro suave e quase inaudível murmúrio.

Cada um encontra o que procura e o que trabalha e se esforça por encontrar. Cada um encontra Segredos, Luzes, Palavras, diferentes ao longo da sua busca. Porque esta nunca termina. Cada resposta encontrada dá origem a novas perguntas, nascidas de mais lúcida compreensão, em perpétua evolução e aprofundamento de compreensão.

É por isso que tenho para mim que eu não posso, não consigo, não sei partilhar a minha Palavra, com mais ninguém, nem sequer com o meu mais chegado Irmão. Não só porque não consigo descrevê-la em toda a sua extensão e complexidade, como porque o mero enunciar do ponto do caminho em que me encontro me abre novos horizontes de busca, para lá dos quais nem sequer sei se não terei de pôr em causa e de reformular tudo ou parte do que me levou a percorrer esse preciso caminho, quer ainda porque cada viagem, mesmo a do meu mais chegado Irmão, seguiu rumos diversos dos meus, levando a linguagens distintas, a conceitos diferentes, a complexas variantes.

Cada um, em cada momento, encontra diferente Palavra, vê diversa Luz, preserva variado Segredo, porque cada um viaja para destinos diferentes: cada um viaja até ao fundo de si mesmo e cada um é todo um Universo diferente do parceiro do lado.

Nessa viagem, nesse trabalho, nessa busca, cada um procura coisa diversa. Eu só posso definir o que neste momento busco. Já me reconciliei – há muito! – com a finitude da vida neste plano de existência, já abandonei, por estulta e estéril, a busca do imenso por que, a mim nunca me interessou particularmente interrogar-me sobre o cósmico como.

Por agora, desde há muito e não sei até quando, concentro-me na busca do sentido da Vida e da Criação. Tenho uma ideia rude e imprecisa desse sentido. Busco o melhor ângulo para obter mais Luz. Espero que consiga obter o Brilho suficiente para, através do sentido da Criação, entrever o Criador… E tudo isto eu – neste momento – busco, em fantástica viagem, sem outro veículo que não eu próprio, não consumindo outro combustível senão tudo aquilo de que me interiormente despojo, sem outro destino e caminho senão o fundo de mim mesmo.

Porque é o conhecimento de mim mesmo, em todas as complexas vertentes que condicionam o meu Eu, que me habilitará a conhecer o Outro, o Mundo e quem o criou e por que e para quê e como.

Eu sou a pergunta, a pergunta sem resposta, a pergunta buscando a resposta e, simultaneamente, a resposta contida na própria pergunta, que me levará a nova pergunta, que gerará nova resposta, em contínuo alargar de horizontes, que espero me permita entrever o que está para além do horizonte e contém todos os horizontes…

Confuso, não é? Pois é! Eu bem avisei que o segredo maçônico esotérico é aquele que existe porque não se consegue transmitir…

Rui Bandeira – Mestre Maçom

 

A ESCÓCIA E AS PRIMEIRAS SUPERSTIÇÕES SOBRE A MAÇONARIA


 

INTRODUÇÃO

Quando revelei a um amigo que estava para ingressar na Maçonaria, ele – que não era uma pessoa religiosa (muito menos um fanático) – me disse: “Tome cuidado, ouvi dizer que te penduram de cabeça para baixo e queimam os seus pés com brasa quente!”

Costuma-se associar, com toda razão, esse tipo de crendice em grande parte aos opositores da Maçonaria que, por razões políticas, desejaram persegui-la ao longo dos séculos, bem como a charlatães do passado, como Léo Taxil, ou mais modernos, como Tio Chico.

Porém, as primeiras superstições associadas à Maçonaria Especulativa são tão antigas quanto ela própria e podem ter tido origem em algo muito mais trivial.

A Maçonaria Especulativa teve sua origem nos idos do século 16. Nessa época, a Igreja e outros grupos não estavam muito preocupados com a abrangência da mesma, pois ainda não tinha atingido poder político a ponto de gerar profundos incômodos.

Sobre isso, o historiador David Stevenson afirma: “A ideia de que a Igreja da Escócia estava pronta a aceitar a existência de lojas, e os rituais dentro delas, desde que não fossem rituais religiosos, explicariam muito bem o que seria uma surpreendente falta de preocupação (com algumas exceções) na Igreja acerca das lojas. A Igreja não tinha necessidade de perseguir as lojas porque sabia que elas não eram uma ameaça para a sua autoridade religiosa exclusiva.”

A PALAVRA DO MAÇOM

Quanto à Maçonaria Operativa, pode-se considerar que uma pessoa se tornou um Aprendiz Maçom quando começou literalmente a aprender a manejar os instrumentos do ofício de pedreiro da pedra livre (Firestone mason). Certamente que esse seria considerado o ponto focal.

Já na Maçonaria Especulativa, o Aprendiz não mais aprenderia literalmente o manejo das ferramentas. Com o passar do tempo, evidentemente, esse aprendizado foi sendo substituído por ferramentas abstratas, de cunho moral e filosófico.

Mas, se ele não sabia literalmente lapidar uma pedra livre, qual era o conhecimento principal que lhe era ensinado? Stevenson esclarece:

“No centro das atividades esotéricas descritas nos catecismos estava a Palavra do Maçom e foi através do falar sobre ela que os profanos primeiro aprenderam que os maçons tinham segredos.”

(Observação: O sentido aqui empregado do termo “esotérico” é algo restrito a um grupo interno de pessoas; não algo de cunho ocultista.)

Trocando em miúdos: O Aprendiz recebia a Palavra do Maçom, que era uma das formas através das quais ele poderia se comunicar com outras pessoas, identificando-se como maçom.

(Embora isso tenha mudado com os séculos e já não seja mais nenhum segredo, nem seja a forma como confirmamos hoje que alguém seja maçom, o autor deste material, por zelo quanto ao seu juramento, se absterá de dar detalhes sobre o processo.)

O problema: Essa prática da “Palavra do Maçom” foi terrivelmente mal compreendida por profanos.

A mente humana é extremamente hábil em imaginar. Desde quando somos pequenos e vemos nossos pais fechar a porta do quarto para discutir, criamos uma ideia de que se uma porta está fechada, então existe algo terrível acontecendo ali, tão horrendo que não pode ser revelado publicamente. Assim sendo, é claro que uma sociedade que se reúne a portas fechadas acabaria vítima da criatividade da imaginação alheia. Na realidade, seres humanos trabalham a portas fechadas o tempo todo. Empresas fazem reuniões fechadas; igrejas fazem assembleias só entre a liderança; etc.

UM PODER SOBRENATURAL

Quando, portanto, os profanos tomaram conhecimento de que, através da “Palavra do Maçom”, os maçons poderiam se reconhecer mutuamente, mesmo sem nunca terem se conhecido, logo imaginaram que se tratava de algum tipo de bruxaria ou encantamento. Afinal, vários feitiços e afins utilizam palavras mágicas para serem realizados.

Isso pode parecer absurdo e pueril ao leitor, mas realmente aconteceu. Em 1653, debochando de tais crendices, Sir Thomas Urquhart de Cromarty afirmou:

“Por ser capaz, por intermédio da Palavra do Maçom, de detectar um maçom, a quem ele nunca viu antes, sem falar, ou sem sinal aparente, vir e cumprimentá-lo reputado, por muitos da mesma estirpe, como tendo tido um espírito familiar, sua grosseira ignorância os impelindo, a chamar isso de sobrenatural, ou acima do alcance natural de um mero homem, porque eles não sabem a causa disso.”

Urquhart, portanto, descreve que pessoas achavam que alguém que usava a Palavra do Maçom estava possuído, ou trabalhando com algum tipo de espírito que lhes dava a possibilidade de ver, até mesmo à distância, se o outro era também um maçom.

O mesmo tipo de pensamento aparece em um poema publicado em Edimburgo, em 1638, denominado “The muses threnodie, or, mirthfull mournings on the death of Master Gall”, que afirma:

“Pois somos irmãos da Rosa Cruz;
Temos a Palavra do Maçom e a clarividência,
Coisas vindouras podemos prever corretamente.”

Esse poema foi escrito por Henry Adamson, que morrera um ano antes da publicação. Adamson era um assistente de um ministro de uma paróquia local.

Como se pode perceber, o autor alude a uma ideia de que, através da Palavra do Maçom, seria possível prever o futuro. Em outras palavras, revela uma crença de que a Palavra do Maçom pudesse ter algum tipo de poder oculto.

Não é difícil perceber de onde ele tirou essa ideia: Através da Palavra do Maçom, era possível identificar outro maçom, isto é, ver aquilo que era invisível para outras pessoas. Basta um pouco de criatividade para transformar isso em alguma espécie de clarividência.

CONCLUSÃO

A Maçonaria Especulativa muito provavelmente surgiu no final do século 16. Nessa época, a Igreja não estava muito interessada na Maçonaria, pois a mesma não tinha conotação religiosa nem tampouco havia ainda desenvolvido qualquer grande poder político.

Como foi demonstrado, pouquíssimo tempo depois, no início do século seguinte, já havia documentos mostrando crendices e receios populares que derivam não de um desejo por parte de opositores de demonizar a Maçonaria, mas sim do entendimento equivocado da população com relação às práticas maçônicas.

Claro, certamente isso viria mais tarde a ser explorado e fomentado por aqueles que visavam combater a Maçonaria, bem como por aproveitadores e até mesmo por pessoas que tentaram (ou ainda tentam), de fato, transformar a Maçonaria em uma sociedade ocultista.

BIBLIOGRAFIA

NEWMAN, A. N. A Reference to the “Mason Word” in 1653. ARS Quatuor Coronatum. Londres, no. 80, 1967.

STEVENSON, David. The Origins of Freemasonry: Scotland’s century, 1590-1710. Nova Iorque: Cambridge University Press, 1998.

Sobre o Autor

Luis Felipe Moura é M M, membro da ARLS Conde de Grasse-Tilly nº301 (Grande Oriente Paulista/COMAB). É bacharel em Letras (inglês), mestre em Teologia e em Psicanálise, atualmente trabalha como psicanalista e professor de Bíblia Hebraica.

 

A HISTÓRIA DA MAÇONARIA


 A história da Maçonaria é datada em um tempo antes da era cristã. Em meados do século XVII, um grupo de hábeis arquitetos uniu-se para a proteção de seu ofício e a prosperidade de suas práticas. Eles foram os primeiros “Mestres Maçons”, criadores dos magníficos edifícios do período medieval, da construção das catedrais na Europa. Eles trabalharam sob seu próprio governo, viajando de um lugar para outro conforme seu trabalho era requisitado.

Alguns anos depois, em 1702, em Londres, Inglaterra, lojas decidiram abrir as portas da maçonaria aos homens sem habilidade na arquitetura. Como a demanda por habilidades específicas diminuía, os altos princípios morais, nobres ações e principais virtudes daqueles que já eram membros, atraíam esta sociedade de homens de destaque na Igreja e Estado, cujo alto caráter e boas realizações os tinham tornado distintos.

Esta é origem da Maçonaria que conhecemos hoje. Perseguidos pela Igreja e pelo Estado por causa do sucesso de seus esforços em promover o pensamento livre e altos ideais, suas páginas na história foram manchados com o sangue dos mártires que deram suas vidas para que essa Ordem sobrevivesse.

Sua história também tem muitas páginas douradas cobertas com o registro de ações bem feitas, de homens libertados, e da misericórdia e boa vontade para toda a humanidade. Um escritor de autoridade sobre o assunto maçonaria nos diz que o grande segredo dessa Ordem é que ela torna homens conscientes da divindade que existe dentro de si.

Uma vida inteira de Maçom tem a sua beleza e significado nessa divina chama e inspira-o a segui-la e obedecê-la. Esse mesmo escritor diz: “um homem é um maçom, quando pode olhar através dos rios, das montanhas, e distante no horizonte com um profundo senso de sua própria pequenez na vastidão da forma das coisas, e ainda ter fé, esperança e coragem que é a raiz de cada virtude”.

Esta citação de “O Véu de Isis” por Winwood Reade é uma revelação dos altos ideais dessa Grande Ordem Maçônica que nós reverenciamos e honramos. "As doutrinas da Maçonaria são as mais bonitas que se possa imaginar. Elas inspiram a simplicidade dos séculos, animadas pelo amor de um Deus martirizado. Aquela palavra que os Puritanos traduziram “Caridade”, mas que realmente é “Amor”, é a pedra-angular que sustenta toda a estrutura desta ciência mística.

Amar uns aos outros, ensinar uns aos outros, ajudar uns aos outros. Essa é a nossa doutrina, toda a nossa ciência, toda nossa lei. Nós não temos preconceitos mesquinhos, nós não excluímos da nossa sociedade esta ou aquela seita. É suficiente para nós que o homem adore a Deus, não interessa sob que nome ou de que maneira. 

É impossível ser um maçom sem ser um bom homem.

A imagem do Esquadro e Compasso simboliza o emblema da Ordem exaltada, para qual a juventude reunida deve sua herança. Nós a exaltamos, e a homenageamos.

Estamos orgulhosas de suas vitórias sobre perseguições, nós somos gratas por seu triunfo sob as ciladas do tempo. Juntos somos fortes, mais unidos somos invencíveis, Amém e Glória a Deus .'.

Autor Desconhecido.

O SIGNIFICADO DA INICIAÇÃO


 

Uma perspectiva histórica fascinante sobre a iniciação maçônica, fornecendo muita iluminação para a importante questão: por quê?

Em todos os ritos e mistérios antigos, cujos participantes eram recebidos pela iniciação, sempre se exercia o maior cuidado em relação a certos detalhes, que, se não realizados adequadamente, poderiam prejudicar ou invalidar toda a cerimônia.

O verdadeiro significado de toda iniciação já foi o de um renascimento espiritual. O Agrouchada sagrado dos hindus diz: “O primeiro nascimento é apenas o advento da vida material; o segundo nascimento é a entrada para uma vida espiritual”.

Os recém-iniciados no primeiro grau de Bramanismo foram chamados “douidja“, que significa “nascido duas vezes”. A própria palavra iniciado indica que o candidato está pelo menos simbolicamente na mesma situação como se ele não tivesse uma existência anterior. Ele deve ser introduzido num mundo completamente novo.

Nas iniciações antigas, o extremo da humildade era expresso pelas roupas rasgadas da contrição por ofensas passadas na vida a ser apagada, o peito oferecido à espada do carrasco e a atitude de um cativo.

PREPARAÇÃO DO CANDIDATO

O costume mais curioso talvez tenha a ver com o que poderia ser chamado de preparação completa do candidato contra as influências que afetaram a sua carreira anterior. Durante a multidão de séculos em que a astrologia foi considerada a parte mais forte nos assuntos humanos, todas as circunstâncias que afetaram o bem-estar da humanidade foram consideradas como tendo surgido num ou noutro dos planetas, ou talvez numa sorte ou mal, combinação de vários.

A ciência da medicina surgiu inteiramente desta curiosa crença nas afinidades planetárias. O médico antigo diagnosticou a doença do seu paciente de acordo com as doenças listadas sob as infelizes estrelas deste último e tentou curá-lo pela aplicação de substâncias designadas como governadas pelos planetas favoráveis a ele.

A mesma ideia governava o indivíduo com referência aos artigos publicados sobre a sua pessoa.

O supersticioso carregava vários encantos e amuletos destinados a atrair influências planetárias favoráveis em seu auxílio e era igualmente cuidadoso em evitar substâncias que pudessem produzir um efeito contrário. Na ordenação do candidato à iniciação nos mistérios antigos, essa crença teve um papel importante. O candidato pode levar sobre a sua pessoa nada que atraia a atenção dos poderes planetários ocultos através do laço misterioso que os vincula a objetos terrestres.

TOKENS METÁLICOS

As listas de plantas, flores, minerais, metais e outras coisas sujeitas a estas influências misteriosas eram longas e complicadas. O ouro o ligava ao sol que incitava ao pecado assolador do orgulho intelectual; a prata atraía sobre ele as inconstantes qualidades da lua; cobre, sagrado para Vênus, provocação de luxúria e ferro, o metal de Marte, brigas; estanho, tirania e opressão, as qualidades de Júpiter; chumbo, preguiça e indolência, pertencentes a Saturno; enquanto mercúrio ou mercúrio eram responsáveis por desonestidade e cobiça. Portanto, uma chave ou uma moeda, e acima de tudo uma espada, provavelmente causariam confusão em toda a misteriosa operação de regeneração.

Acima de tudo, foram impostas ao candidato as três virtudes sagradas, que pelas seitas jainistas na Índia ainda são chamadas de “as três jóias”, representadas por três círculos, “crença correta”, “conhecimento correto” e “conduta correta”. Para alcançar o plano espiritual, no qual a alma está totalmente livre dos laços da matéria, essas eram as principais necessidades, e a pessoa que se apegava a elas certamente aumentaria mais até chegar ao estado de libertação.

TRÊS ETAPAS REGULARES

Ao candidato antigo também foram recomendados “os três passos sucessivos que abrem a alma para atividades e comunicações livres e desobstruídas, tanto no plano psíquico quanto no espiritual”.

O primeiro foi acalmar o ego e esvaziar a mente de todos os preconceitos e padrões de si e dos sentidos.

O segundo consistia, quando este estado passivo era induzido, em fixar e prender a atenção no objeto específico sobre o qual a verdade era desejada.

Em terceiro lugar, tendo sido dados os dois passos anteriores, o indivíduo deveria permanecer firme e persistentemente na atitude receptiva e de escuta pela revelação imediata da verdade, na expectativa plena de alcançá-la.

Este estado receptivo e atitude expectante abriram a consciência para “as vibrações psíquicas que escrevem infalivelmente a sua história na mente receptiva”.

QUEM REPRESENTA O CANDIDATO?

Dentro do problema simples e facilmente formulado, mencionado no cabeçalho, está contido o mais sublime de todos os segredos, que vários dos graus mais altos procuraram responder, cada um à sua maneira. Envolve a aplicação íntima de todos os graus simbólicos ao próprio iniciado, sem o qual eles são tão vazios quanto o ar.

Em todos os mistérios antigos, um personagem era assumido pelo candidato, e como os candidatos eram qualquer um e o personagem sempre representado da mesma forma, deve ter representado algo essencialmente comum a todos. Além disso, a semelhança precisa das experiências às quais cada candidato foi submetido argumentou a mesma lição em todos os casos.

O exame de todos os detalhes disponíveis, especialmente os escritos sagrados de muitas raças, confirma-nos na convicção de que esse caráter universal era apenas uma representação alegórica do ego ou do “eu”, envolvido na guerra da qual se diz que o vencedor é o vencedor.

Maior do que quem toma uma cidade ”e emergiu um conquistador no mesmo instante de aparente derrota. Recebemos a nossa primeira apresentação concreta desse personagem no célebre documento conhecido como Livro Egípcio dos Mortos, a Bíblia dos construtores das Pirâmides, cujos fragmentos são encontrados embrulhados nos panos de quase todas as múmias.

A ALMA PEREGRINA

O Livro dos Mortos apresenta as peregrinações de uma alma que partiu pelo mundo subterrâneo ao conselho dos deuses, que deveriam ouvir os seus acusadores, darem ouvidos aos seus defensores e finalmente pesarem as suas boas ações acumuladas na balança contra o símbolo da pena de verdade.” O nome deste personagem é dado como Ani, o Escriba. Finalmente, constatou-se que esse nome era equivalente ao termo latino Ego, que significa “eu sou” ou “eu” no homem.

Isto leva ao que foi talvez o maior e mais importante de todos os ensinamentos secretos do mundo antigo, um que ficou tão obscurecido pela confusão das suas muitas representações dramáticas com personagens históricos reais, que é necessário um trabalho mais claro e cuidadoso para traçar as ideias principais de idade para idade e pessoas para pessoas, a fim de mostrar que elas estão fundamentalmente em todos os lugares exactamente iguais.

Não há dificuldade alguma em reconhecer o princípio autoconsciente de todo homem como sendo uma centelha real da infinita autoconsciência precipitada na existência material, através do labirinto do qual ela é obrigada a se esforçar na busca incessante da Palavra do Mestre, segredo do seu ser e destino imortal.

Se esta ideia da luta de uma alma divina e imortal, sobrecarregou o fardo da matéria e foi atacada a cada momento por inimigos que simbolizam as transformações contínuas da matéria de “vida” para “morte” e “morte” para “vida’’, tomados como o princípio vital de todo drama de regeneração, do Livro dos Mortos ao Peregrino Progresso de John Bunyan, nós também teremos avançado muito no caminho para entender o da Maçonaria.

Frank C. Higgins

Fonte

universalfreemasonry.org

 

DA TEORIA À PRÁTICA: O QUE FAZER COMO MAÇONS


 

Existe uma história que é atribuída a Gandhi que passo a relatar e servirá de base para este trabalho.

“Certa vez, uma mãe muito preocupada com o seu filho, veio de uma aldeia muito distante para pedir a Gandhi que falasse para o filho dela parar de comer tantos doces, pois ele comia demasiado. Gandhi então olhou para ela e respondeu: “Volte daqui a duas semanas“. Passado este tempo, a mãe trouxe o seu filho novamente e então, dessa vez, Gandhi olhou para ele e disse: “Você deve parar de comer doces, isso fará muito mal à sua saúde“. Então a mãe do menino perguntou: “Porque é que o senhor nos pediu para esperar este tempo todo para aconselhar o meu filho? Nós moramos numa aldeia muito longe daqui e a viagem é muito cansativa, porque o senhor não disse isto ao meu filho há duas semanas quando estivemos aqui pela primeira vez?”Mahatma Gandhi então respondeu: “Porque há duas semanas eu também ainda comia muitos doces”.”

Na Maçonaria alguns princípios regem a nossa conduta: Liberdade, Igualdade e Fraternidade, combatem a ignorância, ao preconceito e aos erros; segundo o ritual do Aprendiz Maçom a Maçonaria nasceu para forjar líderes.

Líder (segundo Carl Rogers – psicólogo comportamental, especializado em psicologia organizacional), é aquele que inspira e conduz pelo exemplo, aqui abro aspas para questionar:

O que estamos a fazer para liderar?

Onde estamos a aplicar o que aprendemos em Loja?

Que exemplo estamos a passar para a sociedade moderna, tão carente de ídolos e heróis?

Não que seja minha pretensão elevarmo-nos ao patamar de heróis, mas a degradação chegou a tal ponto que a falta de figuras que sirvam de vetores para a sociedade facilita a aparição de pessoas que vêem preencher esta lacuna com um discurso fantasioso, que usam de uma máxima de Sun Tsu, dividir para conquistar, e, para se manter no poder, instilam o ódio entre classes, promovendo a fragmentação da mais antiga e solida instituição social que é a família.

No velho mundo, como uma forma de transmitir o conhecimento, foram criados mitos e os personagens destes mitos eram Deuses, Deuses Nórdicos, Deuses Egípcios, Celtas, Gregos, Romanos. Todos estes seres, devidos às suas capacidades extraordinárias, eram referências para o povo, a mitologia sempre teve um papel educacional importante na formação do caráter, assim como as alegorias e o simbolismo esta para a maçonaria, seja dando exemplos para o crescimento de uma sociedade, seja punindo quem não respeitasse os valores ditados por estes Deuses, heróis e ídolos também tiveram um papel importantíssimo na formação do caráter de um povo.

Por exemplo, na mitologia grega, a alma dos mortos, vai para um mundo subterrâneo, governado por Hades, nos seus domínios, todos são julgados por três juízes –, os que tiveram uma vida correta são premiados e seguem para uma região Campos Elíseos, um paraíso, já os que aprontaram na vida terrena, vão para o Tártaro, um poço profundo, escuro, sem fundo e úmido.

Todos reclamam, mas destes, poucos, procuram meios e modos para mudar o ambiente em que inseridos, para fazer frente a essa horda, nós Mestres Maçons, homens livres e de bons costumes, mais do que nunca temos que levantar templos à virtude, e isso, só será possível se passarmos de maçons da teoria, para maçons na prática – peço, por favor, que não interpretem isto como uma crítica e sim como um pedido em nome de quem não tem voz, nem conhecimento, tampouco discernimento para bradar por justiça numa sociedade fragmentada de valores morais.

Chegou a hora de nós obreiros da Arte Real, inspirados nos nossos ancestrais, honrar as suas memórias; assim como Gandhi, devemos levar para a sociedade o que praticamos em Loja, que é o combate ao despotismo, à ignorância, aos preconceitos e aos privilégios e regalias. A nossa filosofia é linda, a nossa aplicabilidade, face às dificuldades criadas pelo sistema dominante e impedimentos legais, é ainda pequena perto da capacidade que temos de liderança e mobilização.

A educação de uma sociedade só será completa se esta for politizada, e ser politizada significa ter ciência e consciência do seu papel no meio em que vive. Em Loja é-nos proibido discutir política, porém, nada impede que nós Irmãos possamos alinhar as nossas visões e participarmos da vida pública apoiando candidatos, comprometidos com o bem estar social, sabatinar pretensos candidatos para conhecer as suas ambições políticas, lançarmos candidatos que tenham visão congruentes com a nossa filosofia, apoiarmos ações concretas que derrubem estigmas de que somos uma sociedade secreta com ideais satânicos de autoproteção, bem como outros mitos gerados pelo obscurantismo e pela ignorância.

Abraham Lincoln, disse: “O campo da derrota, não está povoado de fracassos, mas de heróis que tombaram antes de vencer”.

Já Albert Einstein disse: “O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer”.

Diante destas duas verdades, fica uma reflexão, onde estamos? Como é que nos estamos a preparar para enfrentar o momento político e social que vivemos? Nós, pela capilaridade que temos na sociedade, temos o poder de influenciar muitas pessoas, temos a capacidade de formar homens melhores junto aos que conosco trabalham, junto à nossa família, junto ao nosso círculo de amigos. Devemos liderar pelo exemplo e não pela batuta. Para parametrizarmos as nossas atitudes e antes de as tomarmos, devemos colocar uma questão: isto é justo? Eu vou ter orgulho e coragem de contar aos meus filhos o que estou prestes a fazer?

Ficou bem visível ao longo deste trabalho que tenho muitas aspirações para a nossa irmandade e duvidas maiores ainda, não a respeito da Maçonaria e sim da minha capacidade de honrar e corresponder à grandeza desta instituição, porém tenho fé no GADU, que ao longo da minha caminhada terei muitas respostas e inúmeras dúvidas irão advir destas respostas. Enfim, esta é a essência do conhecimento, saber que quanto mais sei, mais sei que nada sei. Este inclusive foi um dos motivadores para  a minha admissão.

Como se trata de um tema em que, no meu entender, deve prevalecer a visão do Maçom, e, como cada visão é peculiar, de como nós devemos agir e comportar para fazer face ao momento busquei na minha experiência de vida e na minha visão de mundo ideal, sempre usando os meus valores, para produzir esta prancha de arquitetura.

Segundo Henry Ford “se você acha que pode ou não pode fazer alguma coisa, você tem sempre razão”. Finalizando, questiono: Daqui a cinco anos, se você olhar para traz, qual será o seu sentimento? Terá a certeza de que fez todo o possível? Ou terá um peso nos ombros por não ter feito o que poderia, para mudar a nossa realidade, o nosso mundo?

Adaptado de texto escrito por Francisco Esoron

 

MUDAR OU DESAPARECER - O DILEMA DA MAÇONARIA


 

Existe, atualmente, uma crise na nossa Fraternidade?

Se sim, como posso ajudar?

Na história conhecida da Maçonaria, pelo menos desde que se vem contando os Maçons, o número de membros na nossa Fraternidade sempre oscilou, subindo e descendo.

Mas, à medida que o número de membros começou a declinar, surgiu um problema jamais enfrentado.

Mais ou menos no meio do século XX, uma Loja na Austrália estava lidando com o mesmo, ou pelo menos um problema similar de declínio de membros e interesse.

Eles perceberam que a razão pela qual o número de membros estava declinando era que os seus próprios membros não entendiam o que a Maçonaria realmente era; que como resultado, a Loja tinha sido transformada em algo completamente diferente do que pretendia ser; e, que os membros e possíveis membros eram apáticos sobre essa organização chamada Maçonaria.

Eles notaram que a ênfase tinha mudado de companheirismo, estudo filosófico e desenvolvimento espiritual para discussões superficiais sobre tópicos mundanos.

Eles insistiram que se a Fraternidade retornasse ao que eles acreditavam que uma vez fora, os homens, tanto membros quanto não-membros, seriam atraídos, e o problema se resolveria por si mesmo.

Eles insistiram que os homens eram atraídos por coisas que eles consideravam valiosas e que os membros da Loja deveriam ser retratados como sendo de imenso valor a fim de atrair homens que se beneficiariam do crescimento intelectual e espiritual que a Fraternidade oferece.

Colocando a sua teoria em prática, criaram uma Loja com ênfase nas discussões intelectuais da filosofia e história maçônicas, eliminando assim muitas oportunidades de desviarem do objetivo.

Por todos os lugares, havia muitos maçons que não estavam realmente felizes com o que estava acontecendo nas suas Lojas.

Quando finalmente conseguiam tornarem-se membros da Fraternidade, ficavam desiludidos.

Quando viram o que os maçons realmente faziam nas suas reuniões, ficaram muito desapontados.

Eles tinham esperado cerimônias majestosas e impressionantes; discussões profundas de assuntos que os desafiariam mentalmente; e a oportunidade de aprender sobre grandes mistérios aos quais, de outra forma, não teriam tido acesso.

Muitos destes jovens maçons tinham grande respeito pela Fraternidade antes de apresentarem petições e pelos homens que conheciam como Maçons, mas faltava alguma coisa.

Em vez disso, viam cerimônias que poderiam ou deveriam ter sido mais impressionantes, lidas num livro por um membro da Loja que lia mal e não entendia algumas das palavras, muito menos o significado dos rituais.

Eles viam homens assumindo obrigações solenes de fazer todo o tipo de coisas elevadas e, em seguida, prontamente se comportando como se não tivessem feito aquilo.

Quando eles perguntavam “por quê?” sobre partes das cerimônias ou dos rituais, eles eram instruídos a memorizar corretamente as palavras, pois ninguém sabia “por que” eles diziam e “o que” faziam.

Eles perguntavam-se: “Em que eu me meti? Não há algum lugar melhor onde eu quero gastar o meu tempo?”

Muitos destes homens afastaram-se da Fraternidade, perdidos e desiludidos.

Alguns, no entanto, tiraram um tempo para aprender o ritual, ler a literatura, pensar sobre “o que” a Maçonaria deveria ser e decidiram que isso precisava retornar à Instituição que eles percebiam uma vez ter sido.

A partir daí, esta Loja Australiana passou a ter uma lista de espera de homens querendo se tornar membros.

Eles aprenderam a ser mais exigentes com os seus membros e discutir assuntos mais esotéricos e filosóficos, além de enfatizarem a excelência na experiência iniciática transmitida.

Eles se enquadraram no guarda-chuva que alguns chamam de “Restauração Maçônica” e organizaram-se para promover esses ideais.

Estaremos vivenciando, em pleno século XXI, situação semelhante à vivenciada por aquela Loja na Austrália?

Se sim, o que poderei fazer?

Autor: John L. Palmer

Tradução: J. Filardo.


O ESPELHO E O CRÂNIO


 

Para inicio desta minha pequena Prancha de hoje, sobre o Espelho da Câmara de Reflexões, pareceu-me útil fazer um “flashback” ao já distante dia 4 de Março de 2011, no qual fui recebido como Aprendiz, na Respeitável Loja Romã. Para isso, recorri à leitura das minhas “Impressões de Iniciação”, curioso por recordar o que tinha, então, traçado.

O que escrevemos, não é de certa forma, também um espelho de nós próprios? Não vos parece, meus Queridos Irmãos, que escritos e fotografias são reflexos, cristalizados no tempo, do que fomos, e podemos já não ser? E que mesmo o que se afigura imutável, pode não ser visto hoje, do mesmo modo do que, no passado, o foi?

Será que, como escreve Anais Nin, “Nós não vemos as coisas como elas são, nós vemo-las como nós somos”?

Relendo a minha Prancha de então, descobri a seguinte referência: “Tendo presente todo o conteúdo simbólico desta Câmara, contemplei a minha imagem no Espelho e, perante a visão de um homem que já viveu dois terços da sua vida, procedi a um exame de consciência sobre os meus atos passados (…). E foi dentro desta linha de raciocínio, que fui questionando o mais intimo do meu ser, procurando identificar motivos para arrependimento, e correção de atuações futuras”.

Dessa noite, e dessa passagem por esta pequena divisória, onde se alternavam Luz e Trevas, recordo-me que, ao lado do Espelho, sobressaía uma inscrição, rodeada de desenhos de caveiras, tíbias, e lágrimas, a qual dizia “Esta é a gruta da tua morte profana”. Nas minhas memórias dessa caverna, que visitei (“Visita”) bem no interior (“Interiorem”) da Terra (“Terrae”), sobressai à imagem do Crânio, iluminado pela luz mortiça da Vela, e da profunda impressão que o mesmo me deixou.

Escrevi, então: “A Caveira, simboliza a Morte, a brevidade das vaidades humanas, o poder transformador da Terra, que corrompe o corpo humano, reduzindo-o ao estado de esqueleto. Veio-me à memória uma expressão latina muito utilizada na pintura medieval, associada à representação do esqueleto “Sic Transit Gloria Mundi” – (Assim passa a glória do mundo)”.

Este meu comentário, recorda-me, igualmente, que em algumas Câmaras de Reflexão, a Caveira apresenta-se acompanhada de uma inscrição do tipo “Eu fui o que tu és, tu serás o que eu sou”, a qual não constitui mais do que outra forma da mensagem deixada pelos monges, que erigiram a famosa Capela dos Ossos, existente na Igreja de S. Francisco, em Évora. Nesta singular construção, é exibida a inscrição “Nós ossos que aqui estamos, pelos vossos esperamos”.

Mas, relendo e recordando todas estas vivências únicas, que integram o âmago do meu Segredo Maçônico, ocorrem-me uma interrogação: Será que o Crânio, da Câmara de Reflexões, não é, também, uma forma de Espelho?

Será que esta imagem, da “Morte de Alguém”, não nos religa à nossa própria Morte e, como tal, nos revela uma parte intrínseca de nós?

Se as nossas imagens, no Espelho, são distintas, e especificamente nossas, para mim, que não sou paleontologista, os Crânios Humanos são todos iguais. E aquela Caveira, que me sorriu na mesa da Câmara, tanto podia ser o Crânio de Luís XIV, do Papa Alexandre VI, do padeiro que me vendia o pão, do amigo que partilhava comigo o vinho, da sem-abrigo que me pedia auxilio, do Yorik do “Hamlet” ou, pura e simplesmente, a antevisão da minha própria imagem, qual Espelho que reflete o futuro.

Nada é mais igualitário, e universal, do que a Caveira, que nos relembra o único ponto seguramente comum, de todo o destino Humano. Sensibilizarmo-nos da inevitabilidade da Morte, é apelar para a consciência da nossa Humanidade, com todas as glórias e misérias associadas a esta condição. E, aceitarmos essa Humanidade, não é esse um dos principais objetivos do processo progressivo do despertar da consciência, e da Conversão do Olhar, que se inicia com a Morte do Antigo Homem? Confrontarmo-nos com nós próprios, e com o nosso destino, não é esta a primeira etapa do processo alquímico, que tem inicio nesta “Obra em Negro”, no Athanor da Câmara de Reflexões?

Todavia, como nos demonstram as peripécias da Madrasta, da História da Branca de Neve, o Espelho também pode matar ilusões. Porém, é pela morte das falsas ideias, que se caminha para a Verdade. Não vos parece, pois, meus Queridos Irmãos, que este binário Espelho/Crânio ilustra, em certa medida, o velho Principio Hermético da Correspondência dos Contrários (“O que está em cima é igual ao que está em baixo…”)? E, que assim sendo, estes dois Símbolos se interligam, em alternância cíclica, como se fossem partes de um mesmo Ouro boros?

Mas, porque será que dos infinitos rostos, que se cruzam conosco, nas nossas vidas, o nosso é, geralmente, o que conhecemos pior?

Será porque o Espelho nos dá, apenas, uma imagem invertida de nós próprios, e não nos permite vermo-nos realmente? Ou antes, porque, como dizem ao Principezinho, de Saint-Exupéry, “Só se vê com o coração. O essencial é invisível aos olhos”? Não nos podemos, ou será que não nos queremos ver?

Para encontrarmos a Verdade, talvez tenhamos de fazer como a Alice, de Lewis Carroll, e de passar para o outro lado do Espelho. Será que, se o fizermos, encontraremos não o Espelho, mas o retrato de Dorian Gray, imaginado pelo nosso Irmão Oscar Wilde, que nos mostrará como, na realidade, somos, no nosso “Eu” profundo, e não como nos vêem?

Passados quase nove anos, da noite da minha Iniciação, que respostas vos posso dar, meus Queridos Irmãos, para estas perguntas?

Seguramente não muitas, pois a Maçonaria leva-nos mais a colocar questões, do que a encontrar respostas. E, se assim o fizermos, estaremos a praticar bem a Arte, pois são as perguntas que erodem as nossas falsas certezas, redutoras do reflexo no Espelho a uma ilusão de óptica, deformada pelo nosso Narcisismo.

Numa coisa, contudo, acredito – vale a pena olhar para o Espelho. Não disse Sêneca, que “aquele que se aproxima de um espelho para mudar, já mudou”? Passados nove anos, de muitos momentos Luminosos, e de alguns menos Luminosos, não estou, em nada, arrependido de me ter posto em marcha.

Todavia, o meu percurso faz-me acreditar, neste momento, de que não basta esperarmos encontrar a nossa própria Unidade, o nosso “Eu” profundo, este Centro essencial do Ser, apenas no interior de nós próprios, como eu supunha nas minhas “Impressões de Iniciação”. Não é só uma questão de ascese, e de exames de consciência, como eu pensava então, na minha falta de humildade profana, de julgar que podia resolver tudo sozinho.

Sem dúvida de que, se a Luz que buscamos, com o auxílio dos Símbolos, e do Rito, resulta de uma iluminação interior, que emana de nós próprios, então necessitamos dos nossos Espelhos mentais para fazê-la ver, e não podemos deixar de Retificar (“Retificando que”), para encontrarmos (“Invenies”) a Pedra Escondida (“Occultum Lapidae”).

Todavia, o meu percurso tem-me levado a pensar, que para nos autoconhecermos realmente, teremos de recorrer a todos os Espelhos, que a Maçonaria e a Vida nos oferecem, nomeadamente através da escuta, e da observação do Outro, que nos reflete a Imagem que suscitamos nele. Sem o Outro, não conseguimos, verdadeiramente, descobrir o Centro do nosso “Eu”.

São, pois, todos estes Espelhos, e inclusivamente aquele que nos deu a conhecer o nosso pior inimigo, que nos permitem a Conversão do Olhar. Em especial, daquele Olhar que focalizamos para nós próprios, levando-nos, com lucidez, Vigilância, e Perseverança, a aceitarmo-nos tal como realmente somos, e a encontrar esse fundamento essencial da Maçonaria, que é a Fraternidade, condição indispensável ao Amor.

Esta começa no momento em que o Outro se torna o Espelho de Nós próprios, esse “Alter Ego”, que nos reconhece como tal.

O percurso iniciático é, pois, um longo jogo de Espelhos, que encontramos sob a Abóbada Celeste, do Meio-Dia à Meia-Noite, no qual aspiramos a que, um dia, vejamos refletida uma imagem mais Sábia, mais sustentada na Força, e com uma Beleza interior, que verdadeiramente nos adorne, na concretização de um “Eu” mais Fraterno. Não nos esqueçamos, que para o Maçom, o verdadeiro adorno é o das Virtudes, e de que não há Virtude maior do que o Amor pela Humanidade.

Pensando bem, não acham, meus Queridos Irmãos, que iniciar um percurso destes é já, à partida, passar para o outro lado do Espelho, e arriscarmo-nos a ver tudo ao contrário?

Joaquim G. Santos

 

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