O IRMÃO PEREGRINO


Procurai e encontrareis. Batei e sereis atendido. Pedi e recebereis.” (Luc 11:9, Mat.7:7)
É sabido entre os Maçons que existem direitos e obrigações dentro da Ordem, conforme consignado no Estatuto e Regulamento da Grande Loja Maçônica de Minas Gerais, além do contido no Regimento Interno da Loja a que pertencem como nas demais Lojas irmãs congêneres de outras jurisdições.
Vale sempre ressaltar que todos os Maçons têm o direito de participar dos trabalhos de Lojas regulares, devendo-se observar o rigor disciplinar prescrito para os perfeitos conhecedores da dinâmica aplicada no telhamento, envolvendo, inclusive, os requisitos de apresentação dos documentos de identidade maçônica e civil, mensalidade atualizada e palavra semestral ou de convivência, dependendo da Obediência a que pertença.
Vencida a barreira inicial de reconhecimento cautelar que o ato encerra, tanto da parte de quem recebe, quanto daquele que visita, em especial no que se refere à legalidade da Loja visitada, cabe ao peregrino seguir os conselhos sempre repisados de manter postura sempre altiva, sóbria e discreta, observando o silêncio no que couber e manifestando-se quando cabível e no momento adequado, de acordo a ritualística aplicada à Loja e ao Rito seguido.
Nesse aspecto, além de ser um direito que assiste ao Maçom regular, a visitação é um dos mais antigos costumes maçônicos e está vinculada à teoria de que todas as Lojas são apenas divisões da “Fraternidade Universal”.

Historicamente, o direito em questão está embasado no eterno e imutável 14º Landmark, dentre os 25 colecionados pelo irmão Alberto G. Mackey, que assim se apresenta:

O direito de todo Maçom visitar e tomar assento em quaisquer Lojas é um inquestionável Landmark da Ordem. É o consagrado direito de visitar que sempre foi reconhecido como um direito inerente que todo irmão exerce quando viaja pelo Universo. É a conseqüência de encarar as Lojas como meras divisões, por conveniência, da Família Maçônica Universal.”

A história da Maçonaria já relata essas visitas como um costume dos mais antigos e mais amplamente praticados da Maçonaria Simbólica. No trabalho do Irmão Ken Anderson, Guia do Maçom Viajante – Orientações para um Maçom Viajante -, relata-se que “em tempos operativos, bem antes do surgimento da maçonaria especulativa como a conhecemos hoje, os pedreiros eram trabalhadores itinerantes que se viam forçados a viajar para renovar seu emprego à medida que cada projeto de construção fosse concluído. Este caráter fluido da Maçonaria Operativa levou à formação de sociedades comerciais, conhecidas como Lojas, para proteger a integridade de seu ofício, e para melhorar as práticas morais e sociais dos seus membros”.

É bom que se diga que a visitação não é somente recomendada aos jovens maçons, como se costuma ouvir e sim uma necessidade de todos os obreiros, pois a troca de experiências com outros irmãos, a observação da forma de atuar de cada Loja, a sua estrutura, os ritos e ritualísticas diferenciados, sempre agregam informações e enriquecem nossa caminhada maçônica.
Por vezes, grandes surpresas ocorrem, em especial quando se reconhece uma pessoa amiga que não imaginávamos pertencer à Ordem e as novas amizades que se iniciam, com a reciprocidade decorrente dos convites trocados, proporcionando, além de uma expansão do círculo de relacionamento maçônico, o fortalecimento do processo de capilaridade que deve também ser uma das características das relações entre os seus membros.
Ensinam os irmãos mais experientes que nunca é exagerado relembrar que, ao visitar Lojas de outros ritos, devem-se respeitar as regras sociais e seguir as orientações regulamentares da mesma. “Não importa se na sua Loja o certo é assim ou assado”, asseveram. Os “bons costumes”, que todo Maçom deve observar, ditam que, “na casa dos outros, você tem que dançar conforme a música”. Como muito bem ensina o ditado: “Quando em Roma, faça como os romanos”.

Por outro lado, é previsto no 15º Landmark que a um visitante já conhecido de algum irmão do Quadro lhe seja concedida a permissão para entrar conjuntamente com os membros, cabendo ao Mestre de Cerimônias indicar o local de assento. Quando se tratar de Venerável Mestre ou Mestre Instalado, serão estes conduzidos ao Oriente onde têm assento de praxe.

Na Prancha nº 217, intitulada “Como visitante e com o Visitante”, o irmão Sérgio Quirino Guimarães recomenda que, “quando for fazer uma visita, procure saber se nos trabalhos da Oficina é permitido o uso de Balandrau (alguns ritos não reconhecem esta vestimenta). Sendo Aprendiz ou Companheiro, antes da sessão pergunte para algum Irmão se a Pal.’. a Bem da Ord.’. é franqueada a manifestação de todos ou somente para M. M.”.

Ainda sobre a visitação, cabe destacar que muitas Lojas têm como projeto de incentivo a concessão da “Medalha Irmão Peregrino” àqueles obreiros que visitam o maior número de Lojas no ano. Tal medida se reveste de significativa importância, pois estabelece uma sadia competição entre os irmãos, notadamente entre aqueles que ainda desbastam a pedra bruta, acelerando o processo de aprendizagem da ritualística, além de despertar o interesse pelo aperfeiçoamento da caminhada, pelos novos desafios representados pelas conquistas dos Graus Filosóficos e outros Ritos.

Como sabemos tal prática não é dominante, pois a tendência ao acomodamento ao se atingir o Grau três é sobejamente decantado. Mesmo naquelas Lojas que incentivam a peregrinação, como fator de desenvolvimento, ainda encontramos à sombra das colunas dos Templos obreiros que não defendem tal prática, chegando, à vezes, a questionar a validade deste ou daquele comprovante de visitação incluído na Bolsa de Propostas e Informações, que funciona como o correio da Loja, sob o argumento de somente são válidas apenas as visitas às Lojas Simbólicas, desconhecendo a grandeza dos Graus Filosóficos, defendendo uma separação de corpos além do administrativo competente, corrompendo o conceito de “Família Maçônica Universal” a que se refere o 14º Landmark supracitado.

Até este ponto, nenhuma novidade que altere a ordem dos fatos. Porém, cabe-nos refletir como tem sido nossa relação com os irmãos visitantes, no sentido de construir uma boa impressão e não ter o desgosto de ver a imagem da Loja sendo denegrida por falhas nos procedimentos de acolhimento daquele obreiro que está na plenitude do exercício de seus direitos.
Fazer progressos na Maçonaria e estreitar os laços de fraternidade que nos unem como verdadeiros irmãos é mandamento a ser observado por todos os que são escolhidos e acolhidos pela Ordem. Portanto, a postura recomendada é a de receber bem os visitantes nos trabalhos em Loja e em eventos promovidos pela mesma, tratando-os com cordialidade e consideração, para que se sintam bem e reconhecidamente entre irmãos. Assim procedendo, a boa impressão causada será motivo de visitas futuras e recomendação a outros irmãos.
Internamente em nossas Lojas, é forçoso reconhecer que alguns cuidados devem se constituir em hábito, como o de cumprimentar a todos quando se chega e não apenas reservar atenção para uns poucos selecionados. Isso é sempre captado pelos irmãos mais atentos e, às vezes, motivo de comentários negativos.
Quando se chama a atenção de algum mais distraído, soa familiar o argumento da correria do dia-a-dia, da falta de tempo e outros na mesma linha de argumentação. Costuma-se o comportamento repetir-se no encerramento dos trabalhos, e muitos saem apressadamente sem se despedir.
Podemos concluir que os trabalhos não atingiram o objetivo de restabelecer o equilíbrio e a harmonia que sempre se espera. Como a compreensão e a tolerância são virtudes que cultuamos, não ficam arestas e a vida continua, na esperança de dias melhores.
De outra forma, quando chegamos à Oficina e olhamos os irmãos nos olhos, trocando uma palavra amiga e um fraterno abraço, a comunhão é perfeita e os trabalhos se mostram revigorantes, cumprindo a essência do Salmo 133.
Agora, imaginemos essa mesma postura de indiferença em relação a um irmão visitante. Passado o procedimento de reconhecimento, o mesmo é encaminhado a um canto e lá permanece com a indiferença dos demais.
Muitas vezes, na oportunidade em que se poderia valorizar o fato e citar-se o nome do visitante e sua Loja, o Orador cai na armadilha do genérico e sumário agradecimento, ao amparo do argumento do famigerado adiantado da hora. Se o peregrino estiver à procura de uma nova Loja para se filiar, em face de mudança de domicílio, por razões profissionais ou outro motivo, essa visitada, como alternativa, já estará descartada.
Ainda temos a situação de algumas Lojas que promovem uma ágape após as reuniões de trabalho e, alegremente, os irmãos se agrupam conforme as preferências e continuam as discussões interrompidas no encontro anterior.
É objeto de comentários que muitos nem se lembram de dar atenção ou ao menos convidar o visitante para compartilhar daquele momento. Outros até acreditam que o visitante já foi com a intenção de pegar uma “boquinha livre” e se fazem de desentendidos ou simulam outros afazeres. É muito triste essa constatação.

Realmente, falta muita aresta a ser aplainada e muito progresso a ser feito nesse estágio terreno e primitivo da evolução espiritual. Como sempre ouvimos alhures, “é preciso muito amor e persistência para quebrar a ‘casca grossa’ que envolve milhares e milhares de corações”.

Educação e cortesia são valores que trazemos de berço e, por vezes, tornam-se obstáculos a serem enfrentados e grande desafio para a Ordem.

Nunca é demais recorrer ao “Livro da Lei” e refletir sobre a passagem contida em Marcos 6, 10- 11: “Quando entrardes numa casa ficai nela até irdes embora. Se em algum lugar não vos receberem nem vos escutarem, ao sairdes de lá, sacudi a poeira dos pés em protesto contra eles”.

Em princípio, trata-se de uma ordem interessante que Jesus deu a seus discípulos e que podemos agregar aos nossos valores. Mas, antes é preciso entender a mensagem de amor e de perseverança envolvidos, quando o Mestre mostra para os seus discípulos a necessidade de se desvencilharem da carga emocional negativa que tal situação possa ter causado.

A estratégia em questão é deixar para trás todo sentimento de rancor decorrente da experiência. Isto é, deixar pra trás o que nos impede de vencer nossas paixões e fazer progressos, prosseguindo confiantes e leves por novos caminhos, como livres pensadores, formadores de opinião e construtores sociais, como todo bom Maçom.

Obrigado pela visita e seja sempre bem-vindo, meu irmão!
Transmita aos irmãos de sua Loja nosso fraterno abraço!
Brevemente, retribuiremos a visita!
“Na vida, tudo que é raro é surpreendente. Educação, por exemplo.” (Marcio Kühne)
Autor: Márcio dos Santos Gomes
Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras.

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