Permitam-me, meus Irmãos, apoderar-me de um dos mais belos
trechos da Oração aos Moços, de Rui Barbosa:
“Oração e trabalho são os recursos mais poderosos na criação
moral do homem. A oração é o íntimo subliminar-se da alma pelo contacto com
Deus. O trabalho é o inteirar, o desenvolver, o apurar das energias do corpo e
do espírito, mediante a ação contínua de cada um sobre si mesmo e sobre o mundo
onde labutamos. …O Criador começa e a criatura acaba a criação de si própria.
Quem quer, pois, que trabalhe, está em oração ao Senhor.” (trecho da Obra
de Rui Barbosa extraído do artigo do Ir:. Raimundo Rodrigues – Cartilha do
Companheiro – Ed. A Trolha – 1a. Edição – 1998 – págs. 105 e seguintes)
O Grau de Companheiro, ensina-nos o Rito Escocês Antigo e
Aceito, é o Grau dedicado à exaltação do Trabalho. De pouca relevância o tipo
de trabalho, ministra também lições nesse sentido, o Ritual.
Imprescindível, entretanto, nos dias tumultuados de nossa atualidade,
quando valores invertidos atropelam sem ressentimentos a Ética, que o trabalho
seja prestado com respaldo nos melhores princípios da dignidade, que o ato de
trabalhar seja praticado com a alegria do crescimento espiritual, pois o homem,
na sua capacidade de errar e transgredir, esmera-se em arquitetar formas nada
saudáveis e recomendáveis de “trabalhos” distantes de qualidades sublimes,
exercidos unicamente com o intuito de provocar um enriquecimento rápido e sem
causa, com a meta apenas de acumular a matéria.
O Companheiro exalta o trabalho, impõe ação aos instrumentos
colocados à sua disposição, como o maço e o cinzel, a régua, o compasso e o
esquadro, o prumo e o nível, a alavanca, aprendendo a manejá-los com habilidade
e dedicação, buscando a abundância de espigas de trigo; transformando em Pedra
Cúbica a Pedra Bruta que já desbastara; escalando a escada do aprimoramento
espiritual; lançando-se às profundezas dos mistérios de sua existência;
conhecendo o significado da letra “G”, vendo e sentindo a Estrela Flamejante.
Não encarar o trabalho como um castigo, é um sábio ensinamento e
um grande e bom desafio. O preceito bíblico da transformação do suor e da força
do trabalho em alimento, com uma carga evidente de suplício, teve lá a sua
razão de ser. O G:.A:.D:.U:., em momento de justa fúria, lançou sobre o homem a
pecha que o haveria de seguir pelas suas trilhas terrenas.
E realmente, por séculos, trabalhar era próprio de alguém
inferior, era próprio de escravos condenados a suprir com o seu suor e esforço
o alimento dos seus senhores, na turva visão do trabalho como desonra e estigma
social. O I:. Raimundo Rodrigues, num excelente artigo publicado na Cartilha do
Companheiro – 1ª. Edição da Ed. A Trolha, lembra-nos que – o “ora et labora”
era um incentivo que se dava aos religiosos para que pudessem evitar e, até
mesmo, vencer as tentações e que essa forma de entender o trabalho se modificou
com o advento do humanismo e mais ainda com a chegada do Renascentismo.
Mas a mesma sabedoria do Grande Arquiteto teve o condão de mudar
conceitos, mesmo que tão arraigados; teve a sabedoria de incutir em filósofos a
essência magnífica do trabalho e daí nasceram apologias e exaltações ao ato de
trabalhar, desmistificou-se a supremacia do conhecimento sobre a ação e descobriu-se
que o homem, se podia pensar, conhecer, melhor estaria se colocasse em prática
os seus pensamentos e conhecimentos.
É pela ação do trabalho que obras maravilhosas acontecem. É pelo
trabalho que a inércia desaparece, o Universo se transforma e que tudo está em
constante e perene movimento, ainda nas palavras do I:. Raimundo Rodrigues.
O Maçom é um trabalhador por excelência. Por perfeita e justa
razão, recebe ele o apelido de Obreiro e o seu local de trabalho, Oficina.
Junto dos Companheiros, essa qualidade de trabalhador enaltece-se ainda mais,
passando a ser a essência filosófica do Grau.
Deixando de usar apenas a força mais bruta, arduamente aplicada
na aprendizagem do alto da Coluna do Norte, e utilizando mais a inteligência, o
Companheiro estará mais livre nos seus passos em busca dos seus caminhos.
Nas etapas da sua jornada, trabalhando com afinco e sempre em
conjunto com seus Irmãos, na mais pura essência da fraternidade, certamente
terá confrontos com dificuldades e obstáculos para vencer os degraus da escada
que o levará às portas da Câmara do Meio.
Mas o empenho na construção do Templo, com o uso adequado das
ferramentas do Grau e a aplicação de princípios teóricos e filosóficos que
passará a dominar com mais propriedade, servirá para aprender e compreender os
sentidos dos emblemas, das alegorias e dos símbolos que a Maçonaria lhe
proporciona e para entender o que é realmente necessário para alcançar o Grau
de Mestre.
O Grau de Companheiro possui uma característica bastante forte
de participação, de ação e criação em grupo, possibilitando o exercício da
fraternidade com plenitude e ampliando a visão espiritual sobre a vida
material.
Usando a trolha, símbolo da indulgência, o Companheiro unirá as
pedras cúbicas pela argamassa da irmandade, lançando o reboco e corrigindo as
arestas, reconhecendo, acima de tudo, na lição de Assis Carvalho, “as
qualidades de cada Irmão, perdoando-lhe os defeitos reparáveis“. (Cartilha do
Companheiro – 1a. Edição – Editora A Trolha – páginas 145 e seguintes).
O trabalho, nas anotações feitas pelo I:. Raimundo Rodrigues na
sua obra já mencionada, evoca a essência da Maçonaria e faz parte da sua
filosofia e da sua história e alguns aspectos servem sobremaneira como
evidências a esse respeito, tais como:
Na Maçonaria operativa, o trabalho dos construtores tinha uma
alta qualidade e era bastante criativo, como provam as estupendas construções,
muitas ainda de pé e deslumbrando a quem as visita;
Passando a ser especulativa em 1717, a Maçonaria adquire um caráter
filosófico, espiritual e social;
Os locais dos Maçons, como Obreiros, passam a ser conhecidos
como Templos ou Oficinas;
A vestimenta do Maçom é o avental, símbolo grandioso do
trabalho;
As atividades em Loja passam a denominar-se Trabalho, tendo este
a qualidade de Justo e Perfeito, quando transcorre em obediência aos ditames da
lei maçônica; quando é praticado em ambiente de harmonia; com respeito aos
princípios da liberdade, igualdade e fraternidade e quando recebe as bençãos do
Grande Arquiteto do Universo.
E se o trabalho é uma característica primordial da Maçonaria,
mais ainda o é no Grau de Companheiro, que a ele se dedica, como se dedica às
ciências, à filosofia e às artes, ouvindo sempre, falando quando necessário e
trabalhando bem e muito, dentro dos melhores princípios maçônicos.
Trabalhar, principalmente para o Companheiro, é dedicar-se à
construção do seu Templo Interior, num processo contínuo, no qual o sentido de
“vencer as paixões e submeter as nossas vontades” mais se acentua e se faz
presente.
Pouco a pouco, com a pertinácia do trabalho e o uso adequado das
ferramentas, e, sobretudo irmanado, o Companheiro entrega-se à construção do
edifício, dentro de si, mas com o objetivo de se projetar para fora, para a
sociedade, num processo sociológico que pretende exteriorizar e transmitir para
outros indivíduos as conquistas espirituais que constituem a argamassa e os
demais materiais utilizados na ação de construir.
E seu templo social será erguido, sempre na vertical, como quem
tem o pé no chão e a cabeça, o espírito, perto do Grande Arquiteto. E nessa
obra, serão observados os ensinamentos da Maçonaria, com o edifício amparado em
pedras cúbicas cinzeladas para suportar uma sólida estrutura; com cálculos
feitos no projeto com o melhor uso da geometria e das demais ciências; apoiados
no melhor manuseio do compasso, do esquadro e da régua.
E na construção, parede por parede, que a trolha tenha bom uso
no aparo das arestas e com o poder de indulgência que lhe caracteriza; que o
nível seja usado de bom grado para assegurar a horizontalidade e a igualdade
das superfícies, onde os Irmãos estarão no mesmo patamar; que o prumo tenha a
manipulação adequada, demonstrando a retidão da construção, visível na perfeita
verticalidade das paredes.
E, quando os obstáculos se impuserem, ou mesmo quando um esforço
maior for exigido para a execução da tarefa de construção, que a alavanca seja
usada na melhor acepção de Arquimedes, para facilitar a transposição de
dificuldades e contribuir para a consecução dos trabalhos.
A alegria e o pensamento positivo devem acompanhar o Companheiro
na construção do Templo e, maior será essa alegria, quando houver a descoberta
que a construção é, na verdade, um processo de transformação, no qual, a cada
pedra assentada, as virtudes vão substituindo os vícios; o espírito vai tomando
o lugar da matéria; a fraternidade, pois o trabalho não deve ser apenas
solitário, vai se sobrepondo ao individualismo e à vaidade.
E assim é o trabalho maçônico, o trabalho exaltado no Grau de
Companheiro. De tal sorte que, se praticado com perseverança e entusiasmo,
sepultará intolerâncias, ressentimentos, mágoas e medos, bem como outros
sentimentos que não são e não devem ser próprios das virtudes perseguidas pelo Maçom
e, em contraponto, ressaltará virtudes fortemente necessárias ao aprimoramento
da humanidade, papel fundamental do verdadeiro Maçom.
Bibliografia consultada:
Ritual do 2º Grau – Companheiro – Rito Escocês Antigo e Aceito
Bíblia Sagrada
Cadernos de Bolso A Trolha – Instruções para Loja de Companheiro
Cadernos de Pesquisas Maçônicas – nº 14 – Ed. A Trolha
Cadernos de Estudos Maçônicos – nº 17 – Ed. A Trolha
Cartilha do Companheiro – Ed. A Trolha
Grau dos Companheiros e seus Mistérios – Jorge Adoum – Ed.
Pensamento
Jornal A Gazeta Maçônica – Julho/Agosto de 2003 pág. 3
Texto de Autor Desconhecido, fornecido pelo nosso Irmão Nuno
Raimundo.