O QUE ENTENDEIS POR VIRTUDE?


INTRODUÇÃO

Na ocasião de minha iniciação, apesar de ter uma noção do assunto, não fui capaz de emitir uma resposta condizente com a importância que a palavra virtude tem para a Maçonaria.

Embora estivesse livre para me expressar, naquela ocasião, como neófito, não seria capaz de expor o que as virtudes representam para a Maçonaria.

 Como os primeiros passos do aprendiz maçom são no sentido da superação da ignorância das verdades da maçonaria, meu terceiro trabalho foi buscar esse entendimento e, em um primeiro momento, busco conhecer as virtudes cardeais e sua importância para a Maçônica.

CONCEITO DE VIRTUDE
O conceito de virtude começou a ser desenhado nos tempos da Grécia de Homero, quando o termo areté (deus marte, deus da guerra) representava a coragem, o valor, a hombridade e a honra do soldado da guerra.

Posteriormente, essa excelência humana foi traduzida na palavra virtude que, etimologicamente, deriva do latim virtus (vir) (Homem), cujo radical vir significa valente, valoroso, varão, viril.

Dessa forma, virtude, em seu sentido original, expressa a virilidade do homem, sua excelência ou perfeição moral. Durante o apogeu da filosofia grega, surgiram considerações importantes sobre a virtude por meio dos filósofos Sócrates, Platão e Aristóteles. Sócrates (470 - 399 a.C.) considerou que a virtude do homem é tudo o que faz a alma boa e, a isso, ele deu o nome de conhecimento.

Então, o homem virtuoso era aquele que possuísse o conhecimento. Já Platão (427-348 a.C.), nesse sentido, remete virtude ao contexto de “o mais justo dos homens”, a “excelência humana”, ou seja, a clara percepção do reconhecidamente melhor.

As virtudes passam a ser entendidas como uma unidade necessária para harmonizar as diferenças, ou seja, com o domínio das virtudes era possível harmonizar razão e paixão.

Assim, virtude é uma consequência da inteligência e por esse motivo o conhecimento delimita todas as virtudes.

Termo grego que vem da palavra Ares (deus Marte, deus da guerra) e tem relação com a coragem, valor, hombridade e honra do soldado nas guerras. Era a força eminentemente masculina, a nobreza do soldado e por isso, nos poemas Homéricos.

Finalmente, Aristóteles (384-322 a.C.) ratifica a ideia de ligação das virtudes com o conhecimento. No entanto, para esse filósofo, a virtude se dava com a repetição de atos virtuosos, ou seja, era através da vontade do homem que se gerava o hábito virtuoso.

Com isso, representava uma disposição para agir deliberadamente, consistindo de um meio-termo relativo a nós, que é racionalmente determinado e determinado pelo homem prudente. Logo, o homem virtuoso é aquele que vive de acordo com o bom desenvolvimento do espírito racional.

VIRTUDES CARDEAIS
Esses conceitos filosóficos são então assumidos pela igreja católica quando Santo Ambrósio2 (340-397), em "De officiis ministrorum", lista as virtudes cardeais:

Prudência, fortaleza (força), temperança e justiça. Logo depois, Santo Agostinho (354-430), em seu livro intitulado "O Livre arbítrio – Livro I” retoma a teoria das quatro virtudes e considera Prudência, Fortaleza, Temperança e Justiça a virtude em suas quatro grandes formas tradicionais.

Santo Agostinho não muda as concepções anteriores, porém, afirma que as virtudes cardinais são reflexos da boa vontade quando representa o hábito do bem, isto é, a disposição estável para agir bem, o que toca a vontade do agente moral.

São Tomás de Aquino (1225-1274), em se tratando de virtudes, seguiu o entendimento de Aristóteles e Agostinho. Para ele, as virtudes cardeais são aquelas nas quais se fundam e reside a vida moral por meio de um habitus (um bom habitus).

Para São Tomás de Aquino, as virtudes cardeais representam a porta para se chegar às outras virtudes. Ele conceitua as principais virtudes: [...] E então se chamam principais como quase gerais, em relação a todas as virtudes.

De modo que toda virtude que faz o bem, levando em conta a consideração da razão, chama-se prudência; toda a que, nos seus atos, observa o bem no atinente ao devido e ao reto, chama-se justiça; toda a que coíbe as paixões e as reprime chama-se temperança; toda a que dá a firmeza de ânimo contra quaisquer paixões se chama fortaleza. — Suma Teológica, Tomás de Aquino.

Primeiro autor cristão a listar as virtudes cardeais. 3 A palavra cardeal, em se tratando das virtudes cardeais, deriva do latim cardo, que significa gonzo ou dobradiça de uma porta ou janela, por exemplo. Essas virtudes carregam consigo todas as outras e representam os pontos fixos nos quais as outras virtudes estão ancoradas, ou seja, são as principais virtudes.

Hoje esse entendimento está consolidado e ligado à Maçonaria. Prova disso está no teto da sede da Maçonaria em Londres (ceiling of Freemasons Hall), onde são exibidas figuras em forma de anjos com os nomes das quatro virtudes cardeais.

AS QUATRO BORLAS E A RELAÇÃO COM AS VIRTUDES CARDEAIS 
Vários autores ratificam a relação entre as quatro virtudes principais e as quatro borlas existentes no Painel do Aprendiz. DON FALCONER (2003) ensina que o simbolismo das quatro borlas tem origem na maçonaria operativa e estão diretamente relacionadas com os métodos utilizados pelos mestres pedreiros operativos ao definir os quatro cantos do edifício.

Nesse sentido, DYER (2006) ensina que, no período operativo, os maçons desenhavam, no chão, a planta de uma nova construção e marcavam o centro para iniciar os seus trabalhos.

A partir dessa orientação, desenhavam o quadrado ou o retângulo sobre o qual as paredes seriam levantadas.

Para marcar os quadros ângulos, eram esticados cordéis até as extremidades da construção e um pedaço de madeira (guia) era colocado no canto interno.

 Dessa guia, pendia uma linha de prumo de forma a assegurar que a parede estava na perpendicular e o ângulo era o mesmo do alto até a base.

De acordo com HAYHOOD (2008), essas linhas de prumo permaneceram na Maçonaria Especulativa até meados do século XIX, não apenas com borlas tecidas no carpete, mas franjas reais penduradas nos quatro cantos da sala da loja; e no ritual usado nos velhos tempos são essas borlas suspensas às quais as quatro virtudes cardeais estavam ligadas, implicando que estas eram guias para capacitar um homem a manter uma vida correta.

O Irmão PEDRO JUK (2015) também entende que as quatro borlas simbolizam as virtudes cardeais e que elas, tradicionalmente, se apresentam junto aos quatro vértices da orla dentada que Painel do Aprendiz Maçom.

Ele ensina que nos cantos superiores (oriente) estão as borlas da Justiça e da Prudência, enquanto que nos cantos inferiores (ocidente) estão às borlas da Temperança e da Fortaleza. No entanto, essa não é a disposição encontrada no teto da sede da Maçonaria em O Painel já representa simbolicamente o conjugado de símbolos da Loja conforme o Grau e, dentre os tais está à representação da Orla Denteada conjuminada nos seus quatro vértices internos com os símbolos das respectivas borlas. (Pedro Juk - Fonte: JB News – Informativo nr. 1.579 - Florianópolis (SC) – sábado, 24 de janeiro de 2015).

Nesse local, a Justiça e a Temperança estão localizadas no oriente, enquanto que a Prudência e a Fortaleza se encontram no ocidente. Essa disposição das virtudes é explicada por DON FALCONER (2003) quando ele ensina sobre as quatro borlas em lojas operativas que eram orientadas na mesma direção do templo de Salomão em Jerusalém, que é o inverso de lojas especulativas modernas.

A entrada para o alojamento era no oriente e o mestre sentava no ocidente. Embora não tenha sido verificado na pesquisa nada concreto que indique o posicionamento correto das borlas representativas das virtudes, uma vez que não há uniformidade entre os autores pesquisados, o entendimento é no sentido de que a presença das borlas no Painel do Aprendiz nos faz lembrar as virtudes cardeais e seu importante significado para a vida de um Maçom.

CONCLUSÃO
As Virtudes têm valor intrínseco para o maçom e são certamente essenciais para a Maçonaria. A relação com as borlas lembram o Maçom a trabalhar as quatro virtudes cardeais em conjunto:

A Temperança consiste na contenção devida sobre as nossas paixões;

A Fortaleza (Coragem) representa para o Maçom a virtude da força e da capacidade de tomar uma decisão com base em suas próprias convicções morais;

A Prudência permite que o maçom regule as suas ações de acordo com o ditado da razão; e finalmente, considerando que o verdadeiro Maçom é o símbolo de um homem bom que não desvia dos seus princípios, a virtude da Justiça representa a igualdade que deve existir quando o Maçom governar suas próprias ações.

A prática constante das principais virtudes simbolizadas nas borlas do Painel do Aprendiz é fundamental para o domínio de minhas paixões e a combinação harmoniosa com as minhas ferramentas de aprendiz contribuirá para o exercício de outras virtudes como, por exemplo, a humildade, a fraternidade e a tolerância e, assim, contribuirá para o aperfeiçoamento do meu espírito e minha consequente evolução na Maçonaria.

Portanto, acredito que a virtude é fruto de nosso livre-arbítrio quando temos a oportunidade de praticar o bem e representam a base para a construção do templo interior.

Sem a prática perene das principais virtudes, estamos fadados ao desmoronamento moral e com isso, a quebra de harmonia existente entre os irmãos.

Compreendo, finalmente, que em loja estamos vestidos com os respectivos aventais de forma a identificar a responsabilidade de cada irmão dentro do grau no qual nos encontramos.

Na vida profana, estamos vestidos com nossas virtudes de forma a identificar o verdadeiro Maçom e sua responsabilidade perante a sociedade na qual está inserido. À Glória do Grande Arquiteto do Universo e que Ele ilumine a todos.

Aprendiz Maçom CARLOS HENRIQUE SOARES Loja Maçônica Terceiro Milênio/ nº 07 – GOAL– COMAB 

REFERÊNCIAS
AGOSTINHO, Santo, Bispo de Hipona. O Livre-Arbitrio. São Paulo: Paulus, 1995. Disponível em    https://sumateologica.files.wordpress.com/2009/07/santo_agostinho_-_o_livre-arbitrio.pdf. Acesso em: 17 de dezembro de 2018.
AQUINO, Tomás. Suma Teológica. I-II. Coordenador geral da tradução brasileira Carlos-Josaphat Pinto de Oliveira, OP. São Paulo: Editora Loyola, 2005. Disponível em https://sumateologica.files.wordpress.com/2017/04/suma-teolc3b3gica.pdf. Acesso em: 20 de dezembro de 2018.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução e notas Edson Bini. 2 ed. São Paulo: Edipro, 2007. Disponível em https://abdet.com.br/site/wp-content/uploads/2014/12/%C3%89tica-aNic%C3%B4maco.pdf. Acesso em: 18 de dezembro de 2018.
BLOG DO PEDRO JUK. Estudos "achar menos - procurar mais". Fonte: JB News – Informativo nr. 1.785 – Florianópolis (SC) quinta-feira, 20 de agosto de 2015 Disponível em: http://iblanchier3.blogspot.com/. Acesso em: 18 de março de 2019.
DA SILVA, Cláudio Henrique. Virtudes e Vícios em Aristóteles e Tomás de Aquino: Oposição e Prudência. Boletim do CPA, Campinas, nº 5/6. Jan./Dez. 1998.
DON FALCONER, W.M. The four tassels. Revista di Massoneria. Abr. 2003. Disponível em: http://www.freemasons-freemasonry.com/don13.html. Acesso em: 30 de janeiro de 2019.
DYER, Colin F. W. O Simbolismo na Maçonaria. São Paulo: Madras, 2006.
GOAL, Grande Oriente de Alagoas, Ritual do Aprendiz Maçom. 2017. Grande Oriente do Paraná (GOP/COMAB). Ritual do Aprendiz do Trabalho de Emulação, Edição 2010
HAYWOOD, Martin PS. The Queensland Freemason, edição de fevereiro de 2008. Disponível em: http://www.masoniclibrary.org.au/research/list-lectures/158-the-origin-of-the-four-tassels.html. Acesso em: 30 de janeiro de 2019. JUK, Pedro. Exegese Simbólica para o Aprendiz Maçom. Ed. Maçônica “A Trolha”. 2007
MURRAY, Roy. The Four Cardinal Virtues And Tassels. Disponível em: http://www.masoniclibrary.org.au. Acesso em: 28 de fevereiro de 2019.
PLATÃO. A República. Tradução e Organização J. Guinsburg. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006. Disponível em http://www.eniopadilha.com.br/documentos/Platao_A_Republica.pdf. Acesso em: 9 de janeiro de 2019.
TEMPLE LODGE, Nº.33, DUNCAN, BC. Photos of Freemasons Hall, London, UK – from Paul Philcox. Disponível em: http://www.templelodge33.ca/masonic-education/photos-of-freemasons-halllondon-uk-from-paul-philcox/. Acesso em: 28 de fevereiro de 2019.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

É livre a postagem de comentários, os mesmos estarão sujeitos a moderação.
Procurem sempre se identificarem.

Postagem em destaque

AS ORIGENS DAS SOCIEDADES SECRETAS: MAÇONARIA E INFLUÊNCIAS ANTIGAS

O documento “As Origens das Ordens Secretas” explora o surgimento e a evolução das sociedades secretas, com foco especial na Maçonaria e na ...