CRISTIANISMO E FRANCO-MAÇONARIA


Considerado por uns como uma maçonaria elitista – uma super-maçonaria ou uma maçonaria dentro da maçonaria – e visto por outros como um desvio – uma para-maçonaria, uma maçonaria marginal ou até mesmo uma “falsa maçonaria” – o Regime Escocês Retificado, criado por Jean Baptiste Willermoz na segunda metade do século XVIII, coloca aos membros da ordem, assim como aos “maçonólogos” que o observam de fora, um enigma, tanto em razão das suas origens quanto dos seus usos e, dos seus ensinamentos.
Sabemos que, como a Vida, única em suas fontes essenciais, e múltipla em suas manifestações substanciais, a Ordem dos Franco-maçons, UNA em seu projeto fundamental de erigir a Cidade Ideal onde reinariam o Espírito e o Amor Universal, se fragmenta exteriormente num elenco de ritos cuja diversidade, fonte de indiscutível enriquecimento, inscreve-se grosseiramente nas heranças históricas e culturais dos membros que os praticam.
Sem esta diversidade de formas e usos pode-se apostar que a franco-maçonaria não teria atravessado vitoriosamente três séculos de história no curso dos quais não lhe foram poupados golpes e provações tanto internos – conventos tempestuosos, cismas… – quanto externos – anátemas pontificais, hostilidade latente dos meios ditos racionalistas. Irmãos mantenham-se à direita, irmãos, mantenham-se à esquerda…
Cada rito maçônico apóia-se numa corrente iniciática, que ele exprime com maior ou menor sucesso e maior ou menor coerência no tortuoso dédalo dos graus sucessivos, cujos número é variável, e que se repartem em classes (Lojas, capítulos, etc.) distinguidos por cores extraídas da simbólica alquímica: azul, verde, vermelho, branco. Os três primeiros graus, os graus azuis, constituem a passagem inicial comum a todos os ritos.
Quando de sua elevação ao terceiro grau, o novo Mestre Maçom aprende que a “PALAVRA” foi perdida. É, tradicionalmente, a consequência infeliz do assassinato do Arquiteto Hiram Abiff por três maus companheiros. Se, como defendem alguns, como Ragon, o curso maçônico deveria limitar-se aos três graus azuis – aprendiz, companheiro e mestre – constataríamos que os maçons experimentariam um sentimento de frustração em sua fome, sendo a vocação dos graus superiores justamente a de reaver a verdadeira PALAVRA que (de que serviria saturar-se de perífrases evasivas?) foi trazida de volta e revelada pelo Cristo àqueles que têm ouvidos para ouvir.
Em nome de um humanismo mal compreendido e mal digerido, a quase unanimidade dos maçons se empenha em complicar – ocorreu um processo de valorização neste sentido – o que é, no entanto, muito simples: Hiram morreu levando consigo a PALAVRA para o fundo de sua sepultura; Cristo ressuscitou para nos devolver a PALAVRA (os gnósticos em seu tempo não se equivocaram ao associar o Cristo ao Logos) e nos restabelecer em nossa dignidade prístina, a de antes da prevaricação do Anjo. Neste ponto, o Regime Escocês Retificado, fundamentado na corrente iluminista do século XVIII, é o mais esclarecedor.
O quarto grau, o de Mestre Escocês de Santo André, fundamenta-se no pensamento filosófico de Martinez de Pasqually e de Louis-Claude de Saint-Martin. Ele dá ao HOMEM DE DESEJO as chaves da REINTEGRAÇÂO, e depois do parêntese capitular de Escudeiro Noviço e de Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa, este ensinamento fundamental, este núcleo da Tradição será continuado e aprofundado nas classes da Profissão e da Grande Profissão.
Assim, o Regime Escocês Retificado representa o Centro de União de todos aqueles que reivindicam o Cristianismo em pureza filosófica, de todos aqueles que compreenderam que o Cristianismo é o ponto culminante da tradição ocidental, que ele é o “verdadeiro humanismo espiritual” que a Franco-maçonaria “filosofal”, assim como o martinismo, avatares modernos da espiritualidade eterna, veicularam até os nossos dias.

Eques ab Unionis Quaestu
M.E.S.A. – C.B.C.S.

Esta matéria foi publicada originalmente em L’Initiation no Nº 4 de 1985.
Fonte: Revista L’Initiation no Nº 1 – Abril-Junho de 2001


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