Um Maçom é obrigado a obedecer à
Lei Moral; e se compreender corretamente a Arte, nunca será um estúpido ateu
nem um libertino irreligioso. Muito embora em termos antigos os Maçons fossem
obrigados, em cada País, a adotar a religião desse País ou Nação, qualquer que
ela fosse, hoje é mais acertado que adote a religião com a qual todos os homens
concordem, guardando as suas opiniões pessoais para si próprios: Ou seja, devem
ser homens bons e leais, ou homens de honra e probidade, qualquer que seja a
denominação ou convicção que os possam distinguir; Assim a Maçonaria será um
centro da união e um meio de concretizar uma verdadeira amizade entre pessoas
que de outra forma permaneceriam separadas.
A primeira Obrigação dos maçons da Constituição de Anderson de 1723
resume o essencial do que é a Maçonaria e do que são e devem ser os maçons.
Logo a primeira noção que transmite é que o maçom é obrigado a obedecer
à Lei Moral. Moral deriva do latim mores, ou seja, costumes.
O vocábulo mores foi utilizado pelos Romanos para traduzir a
palavra grega êthica, ou seja, ética.
A ética é o suporte da moral e esta a origem da norma, eventualmente
lei, pois da ética individual passa-se aos valores sociais e estes originam as
normas, as leis, com que as sociedades impõem os comportamentos entendidos
adequados, isto é, comportamentos morais, baseados em princípios éticos. Desta
noção - a primeira expressa nas Obrigações dos maçons - resulta inequívoco o
dever do maçom se comportar adequadamente em termos éticos, seguindo os
princípios que elevam o Homem acima da sua pura animalidade, e também de
cumprir os valores sociais em uso na época e lugar em que se encontra. O maçom
é um produto da sociedade onde se insere.
Desejavelmente, inserindo-se entre os melhores produtos dessa sociedade.
Mas não é nunca um estranho, uma exceção. Pode e deve pugnar pela evolução,
pela melhoria dessa sociedade. Deve fazê-lo antes de tudo e acima de tudo dando
ele próprio o exemplo dos comportamentos em que deve assentar essa melhoria e
esperando que outros e outros e cada vez mais assumam os mesmos desejáveis
comportamentos, não procurando impor aos outros as suas teses, os seus
entendimentos. Implícita na noção de obediência à Lei Moral está ainda a
obediência às normas e leis do País, recusando-se a atividade conspirativa e
revolucionária.
A segunda noção transmitida por esta Obrigação é a de que o maçom deve
ser crente, não sendo admissível que seja um "estúpido ateu" ou um
"libertino irreligioso", esta última expressão abarcando também o
agnóstico, pois a palavra "libertino", na época de Anderson não tinha
o significado atual de "devasso", "dissoluto", antes respeitava
àquele que não professava fé religiosa, o incrédulo - ou seja, o ateu e o
agnóstico.
A terceira noção decorrente desta Obrigação é a de que, embora o maçom
deva ser crente, os contornos, a estrutura da crença de cada um só a si diz
respeito ("guardando as suas opiniões pessoais para si próprios"),
não devendo impor o seu entendimento aos demais, de forma a que todos se
encontrem no espaço comum da "religião com a qual todos os homens
concordem".
Daí a utilização comum por todos os maçons da expressão Grande Arquiteto
do Universo, com a qual é possível designar a divindade em que cada um creia
independentemente do nome particular que cada um lhe dê. Na época de Anderson,
a Maçonaria era indubitavelmente cristã. O terreno comum era o espaço de
convergência de católicos, anglicanos, presbiterianos, luteranos, calvinistas,
etc., enfim, o espaço comum cristão. Só em 1732 viria a ser iniciado o primeiro
judeu, Edward Rose. A expansão da Maçonaria pelo Império Britânico
paulatinamente viabiliza a iniciação de muçulmanos, hindus, enfim crentes de
outras crenças não cristãs.
Este alargamento a crenças não cristãs da originalmente cristã Maçonaria
é fruto da clara influência deísta exercida nos primórdios da Maçonaria
Especulativa (há quem defenda que tanto Anderson como Desaguliers, ambos os
pastores, eram deístas). A convicção religiosa fundada na Razão, a não
aceitação de dogmas, logo, a não sujeição a Verdades Reveladas, convivendo com
a convicção religiosa teísta, conjugada com o princípio da Tolerância (guardar
"as suas opiniões pessoais para si próprios"), naturalmente que
viabilizou a expansão da Maçonaria até aos crentes das religiões não cristãs e,
em última análise, aos crentes não integrados em nenhuma confissão religiosa
específica, puros deístas seguindo sua crença pessoal.
A quarta noção é que, mais importante do que a crença de cada um, é que
os maçons sejam "homens bons e leais, ou homens de honra e
probidade", ou seja, mais sinteticamente, e usando expressão hoje
consagrada, homens livres e de bons costumes. Não é qualquer um que é apto a
ser admitido maçom, há um nível ético previamente atingido indispensável para
se for aceite entre os maçons.
Finalmente, esta primeira Obrigação define outra característica
essencial da Maçonaria, a de organização fraternal ("a Maçonaria será um
centro de união e um meio de concretizar uma verdadeira amizade entre pessoas
que de outra forma permaneceriam separadas").
A Maçonaria Regular prossegue e mantém, até aos dias de hoje, estas
cinco características da Maçonaria fixadas na primeira Obrigação da
Constituição de Anderson de 1723: organização baseada na Moral e respeitando a
legalidade vigentes, restrita a crentes, tolerante quanto às crenças
individuais de cada um, agrupando homens livres e de bons costumes, de índole
fraternal.
Como é sabido, em 1877 ocorreu o chamado cisma maçônico, pelo qual o
Grande Oriente de França iniciou um movimento que veio a ser seguido por outras
estruturas em outros locais (em Portugal, presentemente o GOL - Grande Oriente Lusitano),
que desembocou na chamada Maçonaria Irregular, também por alguns apelidada de
Maçonaria Liberal e pelos próprios referida por Maçonaria Universal - por ser
aberta a todo o universo de indivíduos, crentes e não crentes.
Este ramo do movimento especulativo organizado em Inglaterra em 1717
diverge da Maçonaria Regular essencialmente quanto à obrigatoriedade de crença,
admitindo agnósticos e ateus, e à diferente postura em relação à legalidade
vigente (se uma Lei é injusta deve ser combatida; se um regime é iníquo ou
ultrapassado deve ser combatido e, se possível, derrubado, se necessário pela
via revolucionária), neste caso muito por influência da Revolução Francesa,
prosseguida pelas Lutas Liberais e pelas Guerras de Independência, na Europa,
Estados Unidos e América do Sul.
Rui Bandeira
Fontes:
Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, página 131;
Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, página 131;
http://pt.wikipedia.org/wiki/Moral;
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