Uma Loja maçônica não se dedica
apenas ao estudo do simbolismo, ao compartilhamento de saberes, experiências,
opiniões, reflexões, nem à execução e aperfeiçoamento rituais, nem ainda às cerimônias
próprias da Arte Real. Uma Loja maçônica tem também que assegurar a parte burocrática
do seu funcionamento.
Muitas Lojas têm, por natureza, esse fardo aligeirado, porquanto constituíram associações de direito civil que lhes conferem personalidade jurídica e é no âmbito dessas associações e dos seus Corpos Gerentes que as tarefas burocráticas inerentes às obrigações do coletivo perante o Estado são realizadas. Mas, ainda assim, muitas tarefas de caráter burocrático respeitam apenas à Loja e é responsabilidade dela própria.
A forma de lidar com estes assuntos são diversificados. Temos desde a forma de funcionamento de muitas (talvez a maior parte) das Lojas americanas, que dedicam grande e enfadonha parte de muitas das suas reuniões a aprovar, uma por uma, as despesas da Loja e do Templo, por mais corriqueiras (eletricidade, água) que sejam - porque só se paga o que for autorizado em Loja que seja pago - às Lojas que delegam numa Comissão de Oficiais o tratamento dessas questões, limitando-se a, em regra anualmente, tomar conhecimento dos relatórios das atuações tidas e a preconizar as diretrizes a serem seguidas no ano subsequente.
A Loja Mestre Affonso Domingues está entre estes dois extremos. Muitas matérias são decididas pelo Venerável Mestre ou pelas Luzes (o Venerável Mestre e os dois Vigilantes), ou por uma das Comissões de Oficiais (Administrativa, de Beneficência, de Justiça).
Mas um número não negligenciável de assuntos são,
quer por razões e prática rituais, quer por tradição, quer pela prática da
Loja, decididos em sessão de Loja: assuntos disciplinares (felizmente, poucos e
raros), de fixação de quotas ou com participações para despesas, admissão de
novos elementos, alterações regulamentares, opções de gestão ou de organização,
etc..
Consoante às solicitações do gênero, o Venerável Mestre pode optar por diluir o tratamento das questões burocráticas no trabalho geral, reservando um espaço de tempo, geralmente curto, para resolver uma ou duas questões dessa natureza por sessão, ou, se o volume ou complexidade das matérias que há que tratar é grande, dedicar uma ou duas sessões (de preferência sem serem seguidas) para arrumar os assuntos burocráticos todos de uma vez e por um tempo razoável.
As questões administrativas são
cansativas e nada apelativas – todos o sabemos. Mas é indispensável delas
tratar. Uma orquestra executa música e é isso que os músicos gostam de fazer.
Mas uma orquestra não conseguirá produzir música de qualidade se os músicos não
se dedicarem às menos interessantes tarefas de cuidar dos seus instrumentos, de
bem os guardar, de organizar a sua colocação na sala de concertos, de preparar
as pautas, enfim, todas as “questões administrativas” menores, mas
indispensáveis para que a orquestra execute música.
Também uma Loja maçônica não pode abstrair das questões de organização e de gestão administrativa. Consideramo-las menores e aborrecidas. Mas são essenciais para nos podermos dedicar ao que gostamos de fazer, ao que queremos fazer, ao que necessitamos de fazer: aprender em conjunto a ser cada um de nós um pouco melhor a cada momento.
Gostamos de aparelhar, polir e pousar nossas pedras no Templo que ensaiamos de construir. Mas só o podemos fazer devidamente se mantivermos as nossas ferramentas em ordem, o nosso local de trabalho ordenado e agradável, os nossos materiais preparados e ordenados.
Costuma-se dizer que tão necessários são os solistas como os carregadores de piano. Nós, maçons, procuramos levar mais longe essa ideia: carregamos o piano e os outros instrumentos, ensaiamos e tocamos em conjunto e, quando podemos, ainda nos atrevemos, aqui e acolá, a uns solos...
Numa Loja, como em quase tudo na vida, todos gostamos de brilhar. Mas, para conseguir, também é preciso puxar do pano e da solarina...
Rui Bandeira
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