Quando fui
convidado a ingressar na Maçonaria, minha experiência prática com algo que
considerava remotamente similar limitava-se à Ordem Rosacruz, de que sou membro
desde 1977.
Ser membro da Ordem
Rosacruz é buscar crescimento individual na direção de uma união mística com
Deus.
Para tanto se
estudam longos trabalhos e tratados, medita-se individualmente no recôndito do
lar e nos momentos em que há disponibilidade para isso e fazem-se alguns
exercícios voltados a nos lembrar constantemente da existência de um plano de
realidade além deste imediato que condiciona e sustenta este plano de realidade
em que vivemos.
Naturalmente existe
um forte estímulo a que se busque a freqüência a um dos organismos afiliados (Lojas,
Capítulos e Pronaos), devidamente compostos com oficiais, etc.
Sabendo de uma proposta de se fazer o mesmo com a Maçonaria, num primeiro
momento me animei muito e fui assim contribuindo com uma Obediência emergente
através do auxílio, modesto, na elaboração e retificação de textos monográficos
a partir de alguns aportes que me iam sendo transmitidos gradualmente à medida
que isto ia sendo considerado possível.
Sendo a filosofia e
a ciência maçônicas reputadas pelos místicos como perfeita, seria interessantíssimo
trabalhar numa proposta voltada a democratizar este saber, fazer com que chegue
a todas as pessoas que por ele se interessem.
Após minha iniciação e algumas visitas a Lojas Maçônicas percebo que se trata
de algo definitivamente não passível de transmissão através de qualquer
material escrito. Podem-se estudar alguns aspectos como a Cabala, a Astrologia,
ou a Numerologia exaustivamente.
Pode-se ainda
conhecer muito sobre a história natural, do misticismo e do ocultismo
universal. Pode-se, enfim, conhecer muito acerca dos propósitos e
encaminhamentos os mais diversos ou mesmo sobre vários aspectos da Maçonaria
sem que necessariamente se seja maçom. Todos estes são aspectos e estudos que
se recomenda ao maçom – assim como ao profano.
Contudo, para uma boa compreensão, sempre em processo de aperfeiçoamento e
crescimento perene, é fundamental a freqüência a uma Loja Maçônica. Sendo muito
importante ainda a participação, como visitante ou convidado, dos trabalhos de
outras Lojas além da que freqüenta.
Tomo com exemplo do que pretendo trazer à reflexão as Instruções de Aprendiz e
o muito que elas suscitam ao Iniciado.
Antes de examinar brevemente algumas questões que se apresentam ao maçom na
etapa de seu trabalho existencial, abro um parêntese: ao longo dos milênios, na
história do mundo, temos nos deparado com problemas dos mais diversos graus,
principalmente devido à intolerância ou ignorância que já destruiu bibliotecas
e assassinaram sábios iniciados ou profissionais competentes nas mais diversas
áreas.
Tudo isso mais
acidentes e incidentes graves como o dilúvio (referido de maneiras diversas nas
mais diversas culturas e civilizações), terremotos, incêndios, secas e
enchentes ao longo dos tempos.
De que maneira se
preservaria um conhecimento arcano diante de tais e tantos problemas? Numa
sentença, reproduzindo toda a cultura e as informações possíveis em vários
pontos diferentes, sempre sob a guarda de gente disposta a defender estes
valores.
Com um dado
suplementar: nenhum idioma resiste intocado por mais de 500 anos. Leia, por
exemplo, a Carta de Pero Vaz de Caminha no português original de 1500. O idioma
se parecia mais com o holandês do que com o português atual!
É certo que a Maçonaria contemporânea está datada no tempo histórico. O registro
da primeira Loja Maçônica formalmente estabelecida no mundo data de 24 de junho
de 1717. As organizações similares ou que a ela convergem antes daquela data
não devem ser chamadas de “maçônicas”.
Assim, como nos diz
também José Castellani, não é correto supor que a Maçonaria tenha origem
pré-histórica, egípcia, essênia, medieval ou outra qualquer. Contudo a
Maçonaria enquanto filosofia, em seus aportes para a ciência e o conhecimento
tem raízes antiquíssimas.
No Templo maçônico
encontramos, por sobre miríades de referências ao judaísmo, muitos aportes
caldeus, egípcios, persas, gregos, etc.
Supondo, como proposta inicial de trabalho, tratar-se de uma organização
surgida em fins da Idade Média, dentro das Corporações de Ofício de
Construtores que, por motivos diversos fortaleciam-se e auxiliavam-se
mutuamente num mundo que saía do feudalismo e ingressava no capitalismo, que
saía dos reinos e impérios para ingressar na república moderna, incorporou o
conhecimento arcano preservado pelos mais diversos grupos de sábios de todo o
mundo no eixo Europa – África – Ásia Menor.
Fica em aberto, a
aprofundar-se, o estudo de quando, como e por que motivos as Corporações de
Ofício e os místicos, alquimistas, cabalistas e ocultistas se uniram tão
poderosamente. O primeiro traço comum que se percebe está no resguardo e
proteção de um saber que é maior que cada um e traz a herança de antigas
civilizações e culturas. Naturalmente, embora guardando algumas similitudes e
dramáticas diferenças, merecem estudo mais aprofundado o caso do extremo
Oriente (China e Japão), assim como o do Novo Continente (América).
Vejamos como o quadro se apresenta àquele que inicia seus estudos. Percebe-se
que o Ap.’. fica sob a alçada de Instrução do P.’. V.’., na Coluna da
Severidade, cuja coroa é BINAH, a Terceira Sephirah da Cabala. Na Instrução em
si, o V.’. M.’. no topo da Coluna da Suavidade, cuja coroa é KETHER, solicita
auxílio aos demais OOFF.’. da Loja, segundo uma seqüência lógica que se
compreende mais intuitiva que racionalmente, para as etapas sucessivas dos
estudos. Veremos que o encaminhamento criativo, masculino, é dado pelo S.’.
V.’., na Coluna da Misericórdia, cuja coroa é CHOKMAH.
Em linhas gerais: V.’. M.’. – KETHER. S.’. V.’. – CHOKMAH. P.’. V.’. – BINAH.
Estes se colocam na posição do triângulo supremo das Sephiroth da Cabala. O
segundo triângulo das Sephiroth cabalísticas aparentemente se compõe: S.’. – em
CHESED, Or.’. – em GEBURAH e M.’. C.’. – em TIPHARETH. Percebe-se, portanto,
que a primeira motivação das orientações iniciais reside num bom conhecimento
das Sephiroth cabalísticas, que são visitadas uma a uma durante a reunião,
sempre buscando enfatizar as características primordiais de cada Sephirah.
A orientação da construção – Norte – Sul – Leste – Oeste e suas dimensões fazem
pensar ainda mais na preservação de valores universais para toda a espécie
humana. A cobertura deste saber sob o manto de pp.’., tt.’. e ss.’. volta-se,
novamente e sempre, a preservá-lo, a protegê-lo do alcance de quem
potencialmente o profanaria.
O zelo, a forte
ligação à necessidade de proteção de coisas sagradas perpassa todo o
conhecimento maçônico que, repito, não é passível de transmissão meramente
intelectual ou individualizada de forma monográfica como ocorre na Ordem
Rosacruz.
Todos os procedimentos,
por tradição, costume e em nome da eficácia devem transcorrer-se na Loja! As PP.’.
emitidas por cada um dos MM.’. são importantíssimas e fundamentais, mas
incompreensíveis fora do contexto em que se apresentam.
O aspecto físico do
T.’., sem que a L.’. esteja formada, ou seja, sem que os Of.’. estejam em seus
postos, também é incompreensível de forma isolada. O que se protege com os SS.’.,
TT.’. e PP.’. é precisamente o todo, o conjunto.
Este saber é
transmitido em Loja e é de se presumir, pelo que lemos e deduzimos a partir
desta primeira abordagem, que se vá tornar cada vez mais sofisticado, cada vez
mais profundo, girando em torno de um triângulo composto pelos objetos físicos
existentes e expostos, pelas pessoas que
participam e finalmente pela dinâmica de
todo o processo.
O conhecimento
monográfico pode enriquecer o saber transmitido de maneira tradicional, mas
jamais pode precedê-lo ou mesmo prescindir dele.
A descoberta deste fato, possível apenas após a iniciação, naturalmente, fez-me
entrar em contradição com a Obediência que me iniciou, uma vez que ela propõe a
transmissão do conhecimento maçônico através de monografias, a exemplo do que
faz a Ordem Rosacruz. Hoje percebo ser isto impraticável. Como reproduzir as
condições do triângulo “objetos – pessoas – dinâmica” em monografias
individualizadas?
Há um motivo para que o conhecimento seja preservado e transmitido da maneira
que vem sendo há tanto tempo. Cabe respeitar e buscar compreender a partir de
dentro. Não há como se efetivar uma modificação qualquer que seja de fora para
dentro.
Lázaro Curvêlo Chaves