A
expressão pode ser traduzida como “a glória do mundo é passageira”. Ao que tudo
indica a origem desta sentença está numa variação de outra frase presente
na obra medieval “Imitação de Cristo”, atribuída ao monge agostiniano Thomas Kempes,
que viveu lá pelo século XV. Na Imitatio estava escrito O quam
cito transit gloria mundi, algo que
podemos precariamente traduzir como “o quão rapidamente passa a glória do
mundo”. Seu significado, embora macabro, é bem simples; seu propósito,
religioso, é ainda mais fácil de ser compreendido. Explicando-o, uma vez
constatada a brevidade da vida, deveria nos voltar às coisas ditas espirituais,
pois estas são consideradas eternas. Desse modo, de nada valeria nos dedicarmos
àquilo que é transitório, terreno, como glórias, conquistas e alegrias
mundanas, mas sim deveríamos nos voltar para o que fosse duradouro, sempiterno,
extramundano, para algo que estivesse no além.
Atualmente,
essa expressão medieval foi transformada num bordão empregado nas mais variadas
situações. Por exemplo, ela é citada três vezes ao longo da magnífica cerimônia
Católica de entronação dos Papas. Ao mesmo tempo, são diversos os rituais maçônicos
onde ela ocorre. Não se sabe exatamente quais foram às razões que levaram os
doutrinadores a colocarem o Sic Transit Gloria Mundi nestas cerimônias tão distintas, mas é bastante
razoável supor que a óbvia reflexão espiritual suscitada pela expressão, acerca
do caráter transitório das glórias e das conquistas mundanas, tenha sido sua
motivação básica. Talvez até mesmo não exista outro motivo, senão a reflexão
deste que é o seu sentido mais aparente.
Contudo,
não é somente nos ilustrados meios eclesiásticos e iniciáticos que a expressão
aparece. De tão grandiosa que ela se tornou, até mesmo a pena dos fantásticos
Albert Uderzo e René Goscinny, criadores das inigualáveis “As Aventuras de
Asterix”, tratou de registrá-la. Se você alguma vez leu qualquer uma dessas
hilárias histórias, haverá de se lembrar que nelas há a recorrente e
invariavelmente cômica figura daqueles desafortunados piratas, cujo barco é
sempre afundado pelos gauleses Asterix e Obelix. Pois bem, na edição do Às 1001
Horas de Asterix (do original Asterix chez Rahazàde, também publicado em inglês sob o título Asterix and the Magical Carpet – edição que ficou totalmente a cargo de Uderzo),
após novo encontro com os gauleses, os piratas tomam mais uma apocalíptica
surra e perdem tudo que tinham. Refletindo sobre o que ocorreu, um dos piratas,
latinista que era, diz conformado: SIC TRANSIT GLORIA MUNDI
Esse
feliz e irreverente uso do Sic Transit Gloria Mundi dá o que pensar. Na verdade, para mim ele é
inspirador. No mínimo, nos lembrará que é perfeitamente possível mudar um pouco
a perspectiva, deixando-a mais interessante e menos macabra.
Assim,
dentro desse novo contexto, pensar na transitoriedade da vida humana pode nos
valer outra reflexão. Se todas nossas glórias, conquistas e alegrias mundanas
são passageiras, por que não tê-las e aproveitá-las ao máximo? Para que
minimizá-las esperando uma gasosa recompensa advinda de um pretenso “outro
mundo”, espiritual e imaterial, se nem sequer uma certeza mínima de que ele
existe, nós temos? Por que aguardar o além se o agora, por mais passageiro e
finito que seja, é tudo o que realmente temos?
Em
suma, Sic Transit Gloria Mundi!
Assim, como os prazeres da vida são passageiros, penso que devamos desfrutá-los
ao máximo enquanto eles existirem, sem qualquer culpa ou temor; como as
alegrias mundanas são efêmeras, devemos nos esforçar para multiplicá-las, sem
medir esforços; e se nossas glórias mundanas são mesmo transitórias, que elas
sejam, além de transitórias, magníficas.
Ao
final, que todos descansemos em paz.
Postado por José Cantos
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